5 fevereiro 2015, CIMI--Conselho Indigenista Missionário http://www.cimi.org.br (Brasil)
Fonte da notícia: Egon Heck/Cimi. Texto
e Fotos
“Quando estão desarquivando a PEC 215* estão declarando guerra aos
povos indígenas do Brasil. Vamos mostrar que estamos prontos para a guerra”.
Essa declaração feita por um dos caciques Kayapó na audiência com o presidente
da Câmara, Eduardo Cunha, calou fundo no coração e sentimentos de todos os que
estavam sentados na sala da Presidência. Tudo que acontecer daqui pra frente,
não o será por falta de aviso.
Acabar com a PEC 215
“Acabar com a PEC 215, é isso que estamos pedindo. Cada vez mais o
governo está sendo inimigo dos povos indígenas”. Disse em alto e bom tom, na
língua Kayapó, um dos cinco caciques participantes da audiência. E arrematou:
“Estão querendo acabar com a gente. Mas isso não vamos deixar”. O recado foi
claro e contundente: em 2015 nada de PEC 215.
Um batalhão de representantes da imprensa apenas
pôde registrar o
cenário por breves segundos. Eduardo Cunha, que depois tentou
explicar sua posição, não poderá dizer que não foi avisado. Caso houver
insistência na aprovação do projeto de emenda constitucional, “semanalmente
estarão delegações dos índios de todo o país para impedir que isso aconteça”,
afirmou outro cacique. Esta afirmação foi endossada por parlamentares
presentes, como Sarney Filho que afirmou que “a correlação de forças é injusta.
Caso houver insistência na aprovação dessa PEC, que não deveria existir,
semanalmente teremos delegações indígenas aqui para chamar atenção para essa
fratura exposta”.
O cacique Mekren, verberou com gestos incisivos: “Peço, por favor,
acabar com esse projeto que vocês estão desengavetando. Peço para acabar com
isso”. Outro cacique complementou: “Não é nós que estamos caçando briga com
vocês. É vocês que estão caçando briga com nós. Deveria ter o mínimo respeito
com nós, porque você fez acordo com os ruralistas...”.
O deputado Chico Alencar lembrou que os índios estão fazendo a
leitura de que a Constituição foi como um contrato histórico que querem quebrar
com essa PEC. “Eles não aceitam esse ataque. Aliás, essa PEC não deveria
existir. Nós estamos declarando guerra a eles. Vamos evitar o genocídio”.
Disse que não fez
Em pouco mais de 20 minutos os Kayapó não deixaram dúvidas quanto à
sua disposição de continuar lutando contra a referida PEC. No terceiro dia de
trabalho da nova legislatura, os índios deram seu recado. O novo presidente da
Câmara, que no último dia de janeiro se filiou à frente ruralista, tentou
explicar sua posição enquanto presidente da Câmara. “Não tenho condições de
barrar essa PEC e a formação de uma nova Comissão. É uma questão regimental. É
só algum deputado pedir o desarquivamento e ela passará a tramitar conforme
determina o regimento interno da Casa”. Em tom de desabafo: “Não fui eu que fiz
essa PEC, que criou a Comissão. Só cumpro o regimento. Não tenho poder de
acabar com essa PEC, não tenho competência para não desarquivá-la”. Afirmou
ainda que não fez acordo com os ruralistas.
Dessa forma disfarçou o fato de que o desarquivamento já havia sido
solicitado dia 3 deste mês. Os parlamentares solidários com a causa e direitos
indígenas insistiram com o presidente da Câmara para que o tema seja melhor
discutido com a sociedade e que não haja açodamento nos encaminhamentos dessa
PEC, que se façam encontros com os ruralistas no sentido de encontrar
alternativas , como a indenização dos títulos de propriedades de boa fé. Outro
parlamentar ressaltou que está se fazendo uma espécie de terrorismo entre os
ruralistas afirmando estar se criando terras indígenas aleatoriamente. O que
não é verdade. Esse risco não existe.
No final, Eduardo Cunha concluiu dizendo se empenhar para a
construção de diálogos e consensos. E deixou seu recado: “Vocês devem fazer
isso civilizadamente”.
Lutas heroicas dos Kayapó pelos direitos indígenas
Lembro do momento histórico em que os Kayapó pediram que o Cimi os
ajudasse apenas com hospedagem, que eles viriam a Brasilia para se unir aos
demais povos indígenas na luta pelos direitos na Constituinte. Foram momentos
inesquecíveis em que não houve guardas que os barrassem para exigir os direitos
em qualquer espaço do Congresso. Isso nos idos tempos de 1987 e 1988. Passados
mais de 25 anos e aqui estão eles novamente. Desta vez, quando se imaginava que
os direitos estivessem sendo respeitados e colocados em prática, eles retornam
ao cenário da luta, para evitar que haja retrocesso ou mesmo perda de direitos
constitucionais.
É lamentável que o Brasil, após aprovar uma das constituições mais
avançadas à época, com relação aos direitos indígenas, em especial, se encontre
na deplorável situação de querer excluir ao invés de cumprir esses direitos.
Como no início do século XIX, na interpretação dos povos indígenas,
está em curso nova declaração de guerra aos povos indígenas do Brasil.
*PEC: Proposta de Emenda Constitucional
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DF
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