terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

OTAN: A PONTE ATLÂNTICA ESTÁ CAINDO, ESTÁ CAINDO…

16 fevereiro 2015, Redecastorphoto http://redecastorphoto.blogspot.com (Brasil)
11/2/2015, F. William Engdahl*, New Eastern Outlook, NEO
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Em 1949, Washington criou uma coisa chamada OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte, para fundir firmemente a Europa Ocidental na própria massa das políticas futuras de Washington, por mais destrutivas que se viessem e venham a comprovar-se contra os interesses genuínos de Alemanha, França, Itália e outras nações europeias. Em 1986, as 12 nações da então Comunidade Econômica Europeia modificaram o Tratado de Roma de 1957  e assinaram o AEU−Ato Europeu Único [orig. SEA−Single European Act]. Esse AEU ordenava que se criasse um único mercado da Comunidade Econômica Europeia ao final de 1992 e definia as regras para a Cooperação Política Europeia, antecessora da Política de Segurança Externa Comum da União Europeia [orig. European Union’s Common Foreign and Security Policy].

Então, dia 9/11/1989, um evento de dimensão histórica interveio para atrapalhar a estratégia da Comunidade Econômica Europeia para criar um mercado único. A URSS de Gorbachev
entregou, rendida ao ocidente, a República Democrática Alemã [no Brasil conhecida como “Alemanha Oriental”]. A Guerra Fria estava acabada de facto. A Alemanha seria unificada. Aparentemente, o ocidente vencera a guerra. Muitos europeus festejavam. Muitos acreditaram que estariam acabadas para sempre aquelas décadas de viver sempre a um passo de uma guerra nuclear. A Europa emergente parecia orgulhosa, confiante no futuro.

A OTAN foi a entidade criada por Washington, nas palavras do primeiro Secretário-Geral, Lord Ismay, para “manter os russos fora, os norte-americanos dentro, e a Alemanha por baixo”.

Pilar de Defesa Europeia ou a OTAN dos EUA?
O Tratado de Maastricht, documento com falhas e brechas fatais, foi apresentado numa reunião da Comunidade Econômica Europeia, em dezembro de 1991. Um Helmut Kohl chocado foi informado por Mitterand da França e Tatcher da Grã-Bretanha de que tinha de concordar com a criação de uma única moeda para controlar o Bundesbank. Daí nasceria o Euro e um Banco Central Europeu supranacional e independente. Foi chantagem, a precondição para que eles aceitassem a unificação da Alemanha. Os alemães engoliram em seco e assinaram.

O que foi pouco discutido naquele momento foi que o Tratado de Maastricht também incluía uma sessão que obrigava que se constituísse, pela primeira vez, uma Política de Segurança Externa Comum. As 12 nações assinaram o tratado e estavam em andamento intensas discussões para estabelecer um pilar de defesa europeia independente da OTAN. Com o colapso da União Soviética, desaparecera a raison d’être da OTAN. O Pacto de Varsóvia acabara. Washington garantira a Gorbachev que a OTAN jamais seria estendida na direção leste.

Bush destrói o Pilar de Defesa da União Europeia
George H. Bush é homem que deixou, de sua passagem pelo poder dos EUA, um legado que pinga sangue, desde seus primeiros anos em Washington – e o qual provavelmente incluiu a participação chave de um agente da CIA em Dallas Texas, dia 22/11/1963, no assassinato de JFK. Bush-pai foi diretor da CIA nos anos 1970s, o que incluiu empurrar Saddam Hussein para que ocupasse o Kuwait em 1990, para gerar um pretexto para a sangrenta “Operação Tempestade no Deserto” contra o Iraque.

Na presidência, Bush-pai também pôs em movimento eventos que resultariam na destruição da Iugoslávia, iniciada nos anos 1990 – em processo muito parecido ao que se vê hoje, com Washington destruindo a Ucrânia.

O objetivo central da guerra induzida pelos EUA que varreu os Bálcãs durante uma década era deixar perfeitamente claro para as nações da União Europeia que a OTAN, sob controle do Pentágono−EUA, permaneceria onde estava e, além disso, avançaria na direção leste. Bush-pai usou a guerra na Iugoslávia para destruir a nascente ameaça de qualquer capacidade de defesa independente dentro da União Europeia – o chamado Pilar de Defesa da União Europeia.

Como conselheiro do Presidente dos EUA e fundador da Comissão Trilateral, Zbigniew Brzezinski descreveu sem meias palavras o modo como Washington via a Alemanha: não passava de estado “vassalo” do poder imperial dos EUA; não era nação soberana.

Em 1999, Hungria, Polônia e República Tcheca foram oficialmente convidadas em Washington a unir-se à OTAN, enquanto o desmembramento da Iugoslávia estava sendo coroado pelo Presidente Bill Clinton, que desavergonhadamente e ilegalmente bombardeava a Sérvia, na chamada “Guerra do Kosovo”, aquele ano, com a ainda mais desavergonhada participação do Ministro de Relações Exteriores da Alemanha, filho do carniceiro da Hungria, Joschka Fischer.

Em 2004, Washington já estava chegando festivamente com a OTAN à Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia, Eslovênia. Também estava secretamente preparando as, hoje, já infames “Guerras Coloridas”, de fato, golpes de estado na Georgia e na Ucrânia, que poriam no poder os candidatos que EUA escolheram a dedo: o corrupto Viktor Yushchenko em Kiev, na chamada “Revolução Cor-de-Laranja”; e Mikhail Saakashvili, na chamada “Revolução Cor-de-Rosa” na Geórgia. Os dois presidentes prometeram unir-se à OTAN, como parte da campanha eleitoral.

Quase ninguém se surpreendeu quando, em 2007, como Secretário da Defesa dos EUA, Don Rumsfeld anunciou que o Pentágono instalaria equipamentos para lançamento de mísseis balísticos na Polônia e na República Checa, voltados contra a Rússia. Moscou já dava sinais de grave incômodo com a presença da OTAN em seu perímetro estratégico – a tal aliança militar que, na prática, só fizera levar a única potência mundial até as portas de Moscou.

Uma intervenção germano-franco-ucraniana
Quando os Ministros de Relações Exteriores de Alemanha e França intervieram, num esforço de último minuto para construir algum acordo em Kiev, dia 21/2/2014, para evitar uma guerra civil, eles explicitada e claramente deixaram de fora uma das partes interessadas nas conversações: o governo dos EUA. E obtiveram um compromisso, que durou menos de 48 horas, até que atiradores apoiados pela CIA, em Kiev, mataram a sangue frio manifestantes desarmados na Praça Maidan, geraram pânico e desencadearam tumultos que obrigaram o presidente eleito (ponto que a versão em alemão da imprensa-empresa insistentemente omite do “noticiário”) Viktor Yanukovich, a fugir e esconder-se para não ser assassinado.

Dia seguinte, o governo Obama, liderado por Victoria “Foda-se a UE” Nuland; pelo Embaixador dos EUA, Geoffrey Pyatt e com legiões de agentes da CIA dentro dos protestos da Praça Maidan, instalaram no poder o seu próprio fantoche, servindo-se, como tropas de assalto, dos neonazistas dos partidos Setor Direita e Svoboda. George Friedman, diretor de Stratfor, think-tank de consultoria estratégica que presta serviços ao Pentágono e à CIA, e também a agências israelenses, disse em entrevista a Russian Kommersant, em dezembro, que o golpe de estado montado pelos EUA na Ucrânia foi “o mais descarado golpe de estado de toda a história”.

Quando Washington cuspiu na cara não só da Alemanha e França e União Europeia, mas também na cara da Rússia e da própria Ucrânia, ao determinar quem governaria o novo regime do golpe em Kiev, a ser chefiado pelo inefável, alto-comendador da Cientologia, Arseniy Yatsenyuk, a Alemanha e França engoliram em seco. Mas se agacharam e obedeceram aos falcões que governam o governo Obama em Washington. A UE aprovou unanimemente sanções ordenadas pelos EUA, repetidamente, contra a Rússia, depois do referendo de março-2014, sobre a Crimeia. A indústria alemã protestou abertamente. Mas o governo de Merkel agachou-se à frente da OTAN e de Washington, e a economia alemã começou a afundar-se em recessão, assim como o resto da União Europeia.

No momento, está acontecendo algo absolutamente raro. França e Alemanha estão outra vez desafiando abertamente a Washington de Obama. Na noite de 4/2/2015, Merkel e o Presidente francês Hollande rapidamente decidiram voar até Moscou para reunir-se com o Presidente Putin. O objetivo, como disse o porta-voz de Putin era que:

(...) líderes dos três estados discutirão o que especificamente os países podem fazer para contribuir para acelerar o fim da guerra no sudeste da Ucrânia, que escalou nos últimos dias e resultou em muitas mortes. 

A parte mais interessante da viagem às pressas é que chefes vassalos de estados vassalos, Angela Merkel e François Hollande, não pediram permissão a Washington, a acreditar-se no que informam fontes francesas. Ao anunciar a viagem espontânea a Moscou, Hollande disse à imprensa que:

(...) com Angela Merkel, decidimos tomar uma nova iniciativa.

Ainda mais interessante, a “nova iniciativa” deles acontecia bem quando o Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, estava em Kiev, reunido com o Presidente Poroschenko, discutindo possíveis entregas de armamento dos EUA a Kiev – o tipo de “diplomacia” que Washington tem preferido a todos os demais, nos últimos tempos. As conversas em Moscou entre Putin, Merkel e Hollande, como se sabe, aconteceram na sequência de conversações “secretas” entre Paris, Berlin e Moscou.

No início de dezembro, Hollande fez uma visita surpresa a Moscou para falar com Putin sobre a Ucrânia. Naquele momento, o presidente francês declarou:

Creio que temos de evitar mais e mais “muros” a nos separar. Nesse momento, temos de ser capazes de superar os obstáculos e encontrar soluções.

Washington absolutamente não gostou. Há fortes suspeitas em alguns círculos de que o ataque de falsa bandeira (orig.false flag attack), dia 7/1/2015, contra o semanário francês Charlie Hebdo tenha sido a resposta do bloco-da-guerra Washington-Telavive, contra a diplomacia de Hollande.

O recente movimento diplomático franco-alemão coincide com a estadia de John Kerry, em Kiev, para discutir armamento norte-americano a ser entregue na Ucrânia.

O jornalista Vincent Jauvert, do Nouvel Observateur, diz que:

(...) a repentina decisão de Hollande e Merkel, de falar com Putin em Moscou, aparece como tentativa para sair à frente dos norte-americanos, que tentam impor a solução deles aos demais países ocidentais: transferir mais armas para os neonazistas na Ucrânia.

Lembra que:  

(...) os dois líderes foram a Kiev imediatamente depois de Kerry, como se “não confiassem no governo dos EUA”, para “apresentarem a solução diplomática de Alemanha e França, antes que o vice-presidente dos EUA Joe Biden apresentasse o plano dos EUA de enviar armamento letal a Kiev, na Conferência de Segurança de Munique no sábado”.

As próximas semanas serão claramente decisivas para a paz mundial. Para parodiar uma velha canção que eu cantava na minha infância, a Ponte Atlântica está caindo, está caindo, está caindo... Cantar com a melodia de London Bridge is falling down; vídeo a seguir:

É tempo de construir-se ponte nova, estável, no lugar da velha, mas não é solução que virá da mensagem de Joe Biden à Conferência de Segurança de Munique.

*Frederick William Engdahl é jornalista, conferencista e consultor para riscos estratégicos. É graduado em política pela Princeton University; autor consagrado e especialista em questões energéticas e geopolítica da revistaonline New Eastern Outlook.

Nascido em Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos, é filho de F. William Engdahl e Ruth Aalund (nascida Rishoff). F.W. Engdahl cresceu no Texas, e depois de se formar em engenharia e jurisprudência na Princeton University em 1966 (bacharelado), e pós-graduação em economia comparativa da University of Stockholm 1969-1970. Trabalhou como economista e jornalista free-lance em Nova York e na Europa. Começou a escrever sobre política do petróleo, com o primeiro choque do petróleo na década de 1970. Tem sido colaborador de longa data do movimento LaRouche.

Seu primeiro livro foi A Century of War: Anglo-American Oil Politics and the New World Order, onde discute os papéis de Zbigniew Brzezinski, de George Ball e dos EUA na derrubada do xá do Irã em 1979, que se destinava a manipular os preços do petróleo e impedir a expansão soviética. Engdahl afirma que Brzezinski e Ball usaram o modelo de balcanização do mundo islâmico proposto por Bernard Lewis.Em 2007, completou seu livro Seeds of Destruction: The Hidden Agenda of Genetic Manipulation. Seu último livro foi: Gods of Money: Wall Street and the Death of the American Century (2010).
Engdahl é autor frequente do sítio do Centre for Research on Globalization. É casado desde 1987 e vive há mais de duas décadas perto de Frankfurt am Main, na Alemanha.

  

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