quarta-feira, 10 de setembro de 2014

БРИКС, BRICS/É A INDEPENDÊNCIA DE PUTIN, NÃO ALGUMA “UCRÂNIA”, QUE PERTURBA OS EUA

7 setembro 2014, Redecastorphoto http://redecastorphoto.blogspot.com (Brasil)
5/9/2014, *Finian Cunningham, Strategic Culture, Putin, not Ukraine, is Vexing America

Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Esqueçam a alegada “agressão” da Rússia, com ocupação na Ucrânia. O verdadeiro problema para os EUA é Vladimir Putin. Mais precisamente: o verdadeiro problema é uma Rússia forte e independente sob a presidência de Putin, uma Rússia que defende os próprios direitos nacionais, respeito à lei internacional e que não dá sinais de disposição para ceder aos interesses hegemonistas autistas dos EUA, como, por exemplo, defender o decadente-fracassante dólar norte-americano.

Com a aliança OTAN/EUA reunida esta semana em Gales, é óbvio que Washington e seus vassalos europeus
dão tratos à bola para encontrar novo objetivo para uma organização criada há 65 anos, durante a Guerra Fria. A reunião de cúpula na cidade galesa de Newport está sendo vendida como “a mais importante reunião da OTAN desde o fim da Guerra Fria” – e por que tudo isso?! – há mais de vinte anos.

O presidente Barack Obama dos EUA lá está, além de 60 líderes mundiais , aí contados os dos 28 estados-membros da OTAN. Escândalo dos escândalos e vergonha para o “ocidente”, a coisa ali fervilha com uma retórica super inflada de “defender a Europa contra agressão russa”. O secretário-geral da OTAN, Anders Fogh Rasmussen teve a petulância de “declarar”, na abertura da conferência, que “a Rússia está atacando a Ucrânia”.

Assim sendo, continuamos a conclamar a Rússia para que recolha suas tropas de volta para dentro das fronteiras russas e ponha fim ao fluxo de armas e soldados para dentro da Ucrânia – disse deslavadamente Rasmussen, sem nem um fragmento de prova a oferecer.

Um dia antes da abertura da reunião da OTAN, falando ainda da Estônia, o presidente Barack Obama usou a mesma retórica de provocação, acusando a Rússia de agredir a Ucrânia e de violar a lei internacional. O presidente dos EUA não economizou retórica e calúnias, sem qualquer prova, sobre

(...) separatistas na Ucrânia, pagos pela Rússia, armados pela Rússia, treinados pela Rússia, apoiados pela Rússia e com frequência comandados pela Rússia.

Como disse o enviado da Rússia à OTAN, Alexandr Grushko, dessas acusações que vários líderes ocidentais vêm vociferando, “não são fatos, são invenções”. Grushko disse que a OTAN estava escalando as tensões com a Rússia sem qualquer prova de conduta indevida.

(FOTO:Não houve aumento de tropas nem movimento de armamento militar – disse ele.)

É quase inacreditável que todo o furor militarista insuflado em torno da conferência da OTAN, e as declarações bombásticas de segurança coletiva com votos e brados de proteger “nossos membros no Leste da Europa” esteja sendo invocado absolutamente sem qualquer tipo de prova confiável, como imagens de satélite, por exemplo, de tropas russas e movimento de tanques, lançamento de mísseis ou incursões aéreas em território da Ucrânia. É fazer política à base de fantasias e preconceitos.

Isso não implica dizer que não haja aí, em jogo, preocupações muito reais. Com certeza, há. Mas as potências ocidentais e seu aparelho de imprensa-empresa estão tomados de total furor de propaganda, decididos a esconder aquelas preocupações, elas, sim, bem reais.

O que Obama e outras altas figuras dos EUA têm repetido enfaticamente ao longo dos últimos seis meses é a necessidade de os países membros da OTAN “comparecerem no que lhes cabe”, em termos de financiar a OTAN.

Durante quase todos os 65 anos da OTAN, os EUA foram os principais mantenedores e, de longe, o membro mais importante. Há boas razões para essa prodigalidade histórica dos EUA. A OTAN sempre foi veículo mediante o qual os EUA exerceram presença militar, política e econômica dominante sobre a Europa. Sem a OTAN, Washington veria consideravelmente reduzida a sua influência sobre seus “aliados” europeus. De modo especial, Washington veria aumentar uma tendência histórica óbvia de aproximação política e econômica entre a Europa e a Rússia, se não houvesse as garras da “aliança” cravadas no continente.

É significativo que ao longo das duas últimas décadas, desde o fim da Guerra Fria – e, claro, desde que a OTAN deixou de ter objetivo e razão de ser – o financiamento europeu para a organização tenha caído, de mais de 30%, para quase 20%. Em outras palavras, isso sugere que os estados europeus estão perdendo o interesse que a OTAN lhes inspirava no pós-Guerra-Fria, quando ainda acreditavam que pudesse ter alguma serventia.

Tudo sugere também, hoje, correspondentemente, que Washington está decidida a fazer reviver a “importância” da OTAN falando sem parar sobre alguma “ameaça” que a Rússia representaria à segurança europeia. OTAN ressuscitada significa presença ressuscitada dos EUA na Europa, o que é essencial para manter a hegemonia dos EUA sobre o planeta.

Só assim se vê algum sentido real na ação, visivelmente comandada pelos EUA, de fazer aumentar sempre as tensões com a Rússia – usando como pretexto, a Ucrânia. A ação dos EUA gerou um cisma sempre crescente entre Moscou e a Europa, onde até bem pouco tempo havia relações diplomáticas cordiais baseadas em substanciais parcerias econômicas e comerciais.

Claro que o trabalho político de Washington encontrou cúmplices europeus para empurrar o mundo em direção à guerra e fazer aumentar as tensões. O governo britânico obrou como lacaio dedicado a serviço da agenda de guerra dos EUA, como a Junta de Kiev liderada por Arseniy Yatseniuk e, também, os governos pró EUA na Polônia e nos estados bálticos.

É essa agenda oculta, da hegemonia geopolítica dos EUA – não alguma inexistente agressão russa – que se viu bem clara essa semana, na fala de Barack Obama ao lado do presidente Toomas Hendrik Ilves. Quando os dois foram perguntados sobre o que pensam sobre o que dispõe o Ato de Criação da OTAN, de 1997, assinado entre OTAN e Rússia, disseram que o compromisso assumido naquele momento, de que a “aliança” não avançaria na direção das fronteiras russas, já não se aplica(ria) hoje, porque “a paisagem mudou”.

O presidente da Estônia, que estudou nos EUA, disse:

Aquele era o ambiente de segurança de 1997, quando Boris Ieltsin era presidente da Rússia e não havia violações, nem da Carta da ONU nem Acordo de Helsinki de 1975 ou da Carta de Paris de 1990.

Deve-se observar que Ilves só faz repetir assertivas sem nenhuma prova ou reconhecimento legal de que a Rússia tivesse algum dia violado a Carta da ONU ou qualquer tratado. O que o homem faz é repor em cena o personagem Boris Ieltsin. Ieltsin “interessava” a norte-americanos e europeus porque era presidente fraco, servil, que deu rédea solta ao capital ocidental para que avançasse como bem entendesse sobre o território da Rússia, imediatamente depois do colapso da URSS. O tempo de Ielstin também foi tempo de corrupção rampante pelos oligarcas russos, todos intimamente associados ao capital ocidental. Essa cultura corrosiva teve fim com a eleição de Vladimir Putin duas vezes como presidente, entre 2000-2008, e novamente em 2012.

Na sua fala, Obama repetiu que “muita coisa mudou” desde o Tratado OTAN-Rússia de Fundação da OTAN de 1997, que o teria tornado inaplicável. Mas – mentiroso que muito fala sempre acaba dizendo o que não lhe interessava dizer – Obama revelou também parte importante de suas preocupações “de base”:

Já disse várias vezes que preferiríamos sempre uma Rússia forte, produtiva e cooperativa. Mas o caminho para tudo isso é respeitar normas internacionais, melhorar a economia, focar em como eles podem produzir bens e serviços de que outros carecem, e dar oportunidades ao próprio povo e educar a própria população. Infelizmente, não é a via que eles [os russos]vêm seguindo nos últimos vários anos. Não é, com certeza, se se considera a estratégia deles [dos russos] na Ucrânia.

Quer dizer... Obama, melhor dizendo, Washington, não está preocupada com a Ucrânia ou alguma suposta “agressão russa”, mas com questões de “produção econômica e cooperação” – e quem diz “cooperação” está falando, aí, de cooperação com o capital ocidental. Além de não estar ‘cooperando”, o governo russo já não “coopera” nos “últimos vários anos”! É o mesmo que dizer que o problema é que o governo do presidente Putin não “coopera” com o capital ocidental... Tudo isso começou antes da atual crise na Ucrânia.

Essas são as preocupações reais que subjazem ao que os EUA estão fazendo, e já transpareciam claramente em coluna publicada em março no New York Times assinada por Michael McFaul, ex-embaixador dos EUA em Moscou.

Depois de protestos contra a “anexação” [na verdade, tratou-se de reintegração à Federação Russa, decidida por referendo] da Crimeia, McFaul escreve:

A decisão do presidente Vladimir Putin da Rússia de anexar a Crimeia pôs fim à era do pós-Guerra Fria na Europa. Desde o final dos anos Gorbachev-Reagan, a era definida por ziguezagues de cooperação e disputas entre Rússia e o ocidente, mas sempre preservando a ideia subjacente de que a Rússia ia-se integrando aos poucos à ordem internacional. Agora, isso acabou.

O ex-embaixador prossegue e lamenta que

(...) o colapso da ordem soviética não tenha levado a uma transição suave para a democracia e aos mercados, dentro da Rússia, nem à integração da Rússia ao ocidente.

Em outras palavras: é uma pena que a Rússia não tenha saído do mundo soviético e cuidado de fazer uma transição suave em alguma direção que satisfizesse os interesses do capital norte-americano...

McFaul atribui a culpa por essa falta de “integração da Rússia ao ocidente” ao presidente Putin, acusado de ser “um autocrata” e de querer voltar aos dias da velha União Soviética. O ataque de McFaul contra Putin é tolice, um amontoado de bobagens. Mas útil, porque deixa ver com clareza que o que atormenta mais agudamente Washington é que os EUA veem que a Rússia de Putin não age como estado-vassalo, como a Rússia dos tempos de Ieltsin, de quando foi assinado o Ato de Fundação entre OTAN e Rússia.

Por isso, exatamente, é que Washington quer agora rasgar o documento assinado em 1997, e empurrar a OTAN para bem junto das fronteiras russas.

McFaul conclui sua coluna no NY Times exigindo que Putin seja “isolado” e que se apliquem sanções punitivas contra a Rússia – política que Obama aplicaria com violenta determinação nos meses seguintes.

Há aí mais que simples coincidência: o governo dos EUA escalou na agressão contra a Rússia a partir do momento em que o presidente Putin passou a expor ao mundo as muitas alianças de comércio e desenvolvimento regional que está construindo com países eurasianos, o Irã, a China, outros países BRICS e nações da América Latina. O movimento declarado de Putin, de substituir o dólar norte-americano por moedas bilaterais para as transações do comércio de energia, também o marcaram como ameaça viva contra os interesses hegemonistas dos EUA. E a Rússia de Putin também se posicionou ao lado de seu aliado árabe sírio ao longo de até agora três anos de guerra – resultado da agenda criminosa de EUA-OTAN que tentam “mudar o regime” naquele país.

Esse é o contexto dos motivos pelos quais tenta envolver a OTAN na “crise na Ucrânia”. Não é questão de alguma “agressão” russa. É questão de Putin ser líder mundial independente que não se curva ao diktat imperial dos EUA. 


 *Finian Cunningham nasceu em Belfast, Irlanda do Norte, em 1963. Especialista em política internacional. Autor de artigos para várias publicações e comentarista de mídia. Recentemente foi expulso do Bahrain (em 6/2011) por seu jornalismo crítico no qual destacou as violações dos direitos humanos por parte do regime barahini apoiado pelo Ocidente. É pós-graduado com mestrado em Química Agrícola e trabalhou como editor científico da Royal Society of Chemistry, Cambridge, Inglaterra, antes de seguir carreira no jornalismo. Também é músico e compositor. Por muitos anos, trabalhou como editor e articulista nos meios de comunicação tradicionais, incluindo os jornais Irish Times e The Independent. Atualmente está baseado na África Oriental, onde escreve um livro sobre o Bahrain e a Primavera Árabe.

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