19 setembro 2014, Jornal
de Angola (Angola)
Roger Godwin
O Zimbabwe e a Rússia acabam de assinar uma série de novos acordos de cooperação bilateral, sobretudo no sector económico, que representam fidedignamente uma ocasional comunhão de interesses que a história se encarregará de apagar quando o bom senso imperar entre aqueles que ainda se julgam com direito a decidir sobre o destino dos outros.
Roger Godwin
O Zimbabwe e a Rússia acabam de assinar uma série de novos acordos de cooperação bilateral, sobretudo no sector económico, que representam fidedignamente uma ocasional comunhão de interesses que a história se encarregará de apagar quando o bom senso imperar entre aqueles que ainda se julgam com direito a decidir sobre o destino dos outros.
Assolados por sanções unilateralmente impostas pela União Europeia e os Estados Unidos, por razões diferentes ente os países visados, o Zimbabwe e a Rússia resolveram dar as mãos para juntos darem uma “bofetada de luva branca” a quem se julga no pleno direito de passar por cima das mais elementares regras que gerem as relações bilaterais entre Estados.
De comum, entre o Zimbabwe e a Rússia, em relação a
O anúncio desta nova parceria foi feito conjuntamente em Harare pelo presidente Robert Mugabe e pelo ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, numa cerimónia a que a imprensa zimbabweana deu, naturalmente, um especial destaque.
No caso do Zimbabwe
sabe-se que essas sanções visam, principalmente, a figura do presidente
Robert Mugabe e são uma forma de pressão para que ele aceite abandonar o poder, não importando a quem
impôs essas medidas que ele tenha vencido
as eleições de há um ano com mais de 60 por
cento dos votos nem de a sua popularidade, internamente, estar acima de qualquer suspeita.
Muito menos importa à União Europeia e aos Estados Unidos que Robert Mugabe seja o actual presidente da SADC e de, a partir de Janeiro, assumir também a presidência da União Africana.
A custa dessas sanções a
economia zimbabweana está despedaçada, o país vive em
sobressaltos para poder honrar os seus compromissos com o funcionalismo público. Tudo porque a indústria parou,
uma vez que o país está impedido de
importar matéria-prima e proibido de exportar o pouco que ainda consegue produzir.
Como consequência dessas medidas o povo vive uma situação de crescente degradação, com o desemprego, a fome e a miséria a aumentarem, não entendendo bem as razoes pelas quais as suas escolhas políticas, em termos de liderança efectiva, não são devidamente respeitadas por uma série de países que não entendem aquilo que é a sua realidade intrínseca.
Mesmo os diamantes que
agora começam a ser explorados pelo Zimbabwe, e que
representam a sua grande esperança para minorar a actual situação de carência, são internacionalmente tratados de forma
humilhante como se fossem garimpados por
quadrilhas organizadas de malfeitores e, por isso mesmo, depreciados na altura da sua comercialização.
No caso da Rússia é sabido
que as sanções impostas pela União Europeia e pelos
Estados Unidos estão completamente condenadas ao fracasso e só foram timidamente impostas para dar uma “satisfação”
ao aliado ucraniano, que trata grande
parte da sua população como se ela fosse, apenas,
“carne para canhão”.
Sendo um pais economicamente poderoso e militarmente temido, a Rússia tem muito mais a ganhar do que a perder se optar por uma estratégia de maior aproximação e cooperação com o continente africano.
No caso concreto do
Zimbabwe, a Federação Russa tem a ganhar por encontrar
um mercado ávido de tudo, sem opções de importação através dos países que historicamente abasteciam o seu mercado
interno.
Do ponto de vista
político, o Zimbabwe poderá tornar-se um aliado valioso
numa estratégia russa de maior penetração no mercado africano.
O prestígio continental de
Robert Mugabe está intocável e os cargos de presidente
da SADC e da União Africana revelam-se um precioso capital que, se bem aproveitado, pode render muitos e valiosos
dividendos. Em contrapartida, a Rússia
pode importar do Zimbabwe uma parte significativa
do seu minério, não exclusivamente diamantes, com o qual pode abastecer o seu já de si robusto sector
industrial.
Esta ocasional comunhão de
interesses, impensável há dez anos atrás, não
obstante muitos dos actuais quadros nacionais terem estudado e formado na Rússia, funcionará de acordo com a forma
como a União Europeia e os Estados Unidos
encararem a realidade dos dois países de modo
a poderem adaptar a essa análise uma estratégia que respeite aquilo que são as opções políticas dos países visados.
Na actual conjuntura mundial, tanto em África como na Europa, a imposição pela força de sanções do género de pressões políticas começa a não fazer sentido, pois a globalização se encarrega de encontrar alternativas – muitas das vezes melhores do que as opções iniciais – para buscar uma saída.
No caso do Zimbabwe as alternativas, sucessivamente afloradas por Robert Mugabe, prendiam-se com um reforço da cooperação entre outros países africanos como forma de ultrapassar a queda no relacionamento, sobretudo, com a Europa.
No caso da Rússia, a primeira opção foi o reforço da cooperação com a China (já concretizado) e a abertura de novos mercados no continente africano, uma estratégia que visa não só o Zimbabwe como, também, outros países da África Austral, como Angola e a África do Sul.
Trata-se, ao fim e ao cabo, de uma legítima tentativa de acautelar os interesses bilaterais dos países envolvidos mostrando que nem a União Europeia nem os Estados Unidos possuem o exclusivo da regulação das relações entre Estados independentes.
Mas, para que uma ocasional comunhão de interesses se transforme num relacionamento estável, duradouro e profícuo para todos os envolvidos é preciso mais, sobretudo que haja visão para que sejam respeitadas as diferenças que existem entre os países envolvidos sem que um tente impor ao outro aquilo que mais lhe interessa. Seja do ponto de vistam político ou económico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário