3 junho 2013,
Fonte da notícia:
Cimi - Conselho Indigenista Missionário
O
Governo Federal dá mostras cada vez mais evidentes que não entende e que não
está disposto a entender os povos indígenas brasileiros. As medidas anunciadas
pelo governo com o intuito de superar os conflitos em torno das questões
indígenas no Brasil parte do pressuposto equivocado segundo o qual os povos
indígenas estariam causando os conflitos e agindo sob o comando de organizações
não indígenas, de modo especial o Cimi. Além de preconceituosa e racista, uma
vez que considera os povos seres inferiores e incapazes de decisões próprias, o
pressuposto é sociologicamente falho. Julgamos que algumas informações acerca
da realidade que envolve a temática são importantes e suficientes para
entendermos a situação. Vejamos.
O
governo Dilma aprofundou o processo de retração de demarcações das terras
indígenas. É o governo que menos demarca terras indígenas desde a ditadura
militar. O governo também tomou medidas administrativas lesivas aos direitos
dos povos, tais como a Portaria 419/11, a Portaria 303/12 e o Decreto 7957/13.
A presidente Dilma ainda não recebeu os povos indígenas para qualquer conversa
ao longo destes mais de dois anos de mandato. No entanto, somente no mês de
maio, a presidenta reservou tempo em sua agenda para ao menos cinco encontros
com representantes dos ruralistas, inimigos históricos dos povos indígenas.
Somente em maio, Dilma esteve, oficialmente, duas vezes reunida com a senadora
Kátia Abreu (PSD/TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA).
Os povos indígenas sabem que a CNA representa o ruralismo anti-indígena,
responsável pelo ataque à legislação ambiental, que resultou na aprovação do
novo Código Florestal em 2012, e pelo atual ataque aos seus direitos no
Congresso Nacional.
A
bancada ruralista ataca os direitos dos povos por meio de diferentes
instrumentos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Há mais de uma
centena de proposições legislativas contrárias aos direitos dos povos em
tramitação nas duas casas do Congresso. Dentre elas destacam-se as Propostas de
Emendas Constitucionais 215/2000, 038/1999 e 237/2013. Os povos indígenas sabem
que os ruralistas querem fazer com a PEC 215/2000, hoje, o mesmo que fizeram
com o Código Florestal em 2012. Flexibilizar os direitos dos povos e ter nas
próprias mãos o poder para não demarcar as terras indígenas no país.
Os
povos indígenas, acampados em beiras de estradas ou confinados em reservas
diminutas, tem demonstrado uma resistência e uma paciência históricas diante
das violências do agronegócio e da parcimônia do Governo Federal. No entanto,
certamente não estão dispostos a continuar sobrevivendo em condições
sub-humanas, morrendo vítimas de desassistência, de assassinatos, de suicídios
e de atropelamentos, exilados de suas terras até o fim de sua existência enquanto
pessoas e povos.
Demarcações
paralisadas pelo Governo Federal e ruralistas no ataque para impedir novas
demarcações, rever as demarcações já realizadas e explorar as terras
demarcadas. É isso que os povos indígenas enxergam na conjuntura político
indigenista do Brasil. É contra este ataque sincronizado do Governo Federal e
do agronegócio que os povos reagem na perspectiva de que seus direitos sejam
preservados e efetivados. Uma reação, portanto, em legítima defesa de suas
existências enquanto indivíduos e povos.
Será
tão difícil para Dilma e seu governo entender isso? Sem falar com os povos e
falando a todo o momento com o agronegócio, Dilma e seu governo continuarão sem
entender os 305 povos indígenas existentes em nosso país.
Assim,
partindo de um pressuposto equivocado, o governo adota e anuncia medidas
equivocadas para tentar resolver os conflitos por ele criados.
Protelar
reintegrações de posse não irá resolver o conflito. Os povos já foram expulsos
pelos fazendeiros de suas terras e nem por isso deixaram de lutar pelo retorno
às mesmas. Não será a expulsão pelas forças do Estado, com dois ou três dias de
protelação, que mudará a relação dos povos com suas terras tradicionais.
Mudar
o processo de demarcação das terras indígenas não irá resolver o conflito. Essa
medida irá aprofundar ainda mais a retração nas demarcações, uma das causas
centrais destes conflitos. Os povos indígenas sabem que a protelação das
demarcações é parte da estratégia dos ruralistas, que querem “ganhar tempo” enquanto
eles atuam para ter o poder acerca das não demarcações das terras, que se daria
com a aprovação da PEC 215/2000.
Por
fim, amordaçar o Cimi não irá resolver o conflito. Primeiro porque os povos são
autônomos, cientes e senhores de suas decisões e do que é necessário para
defender seus direitos. Segundo porque o Cimi não deixará de denunciar os
ataques desferidos pelo governo e pelos ruralistas contra os povos indígenas no
Brasil. O Cimi faz isso desde 1972 quando foi criado, em plena ditadura militar,
e o fará até o último suspiro de sua existência. O compromisso do Cimi é com a
vida dos povos indígenas.
Para
resolver efetivamente os conflitos que envolvem o tema, o Cimi entende que o
governo deve organizar uma força tarefa para, dentre outras medidas urgentes e
estruturantes: a) destravar os processos de demarcação, tanto no campo
administrativo, quanto no campo judicial; b) ouvir os povos indígenas; c)
revogar os próprios instrumentos de ataque aos povos, tais como, as portarias
419/2011 e 303/2012 e o Decreto 7957/2013; d) mobilizar sua ampla base de apoio
no Congresso a fim de que se evite os retrocessos almejados pelos ruralistas
quanto aos direitos dos povos.
Brasília,
DF, 03 de junho de 2013.
Conselho
Indigenista Missionário – Cimi
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