6 junho 2013, Global Research http://www.globalresearch.ca (Canada)
Cuba elaborou um programa que permitiu que mais de 5 milhões de pessoas aprendessem a ler, escrever e somar
Global Research, June 06, 2013
Segundo a Unesco, há no mundo 796
milhões de adultos analfabetos, ou seja, 17% da população mundial. Mais de 98%
se encontram nos países do Terceiro Mundo. Dois terços são mulheres. Os países
da África subsaariana e do sul e o este da Ásia contam com “73% do déficit
mundial de alfabetização de adultos”. Em cifras absolutas, o número de
analfabetos nessas regiões continua crescendo. Quanto às crianças, apenas 44%
estão matriculadas na pré-escola (148 milhões), ou seja, 66% não têm acesso a
esse tipo de ensino (222 milhões). Em nível primário, 67 milhões de crianças
não estão na escola. A Unesco lançou então um chamado para reduzir em 50% o
número de analfabetos até 2015. O organismo da ONU aponta que os progressos
realizados nesse campo “foram, no melhor dos casos, decepcionantes e, no pior,
esporádicos”. Segundo a Unesco, “para reverter essa tendência, é necessário que
os governos do mundo atuem com determinação”.
No entanto, a Unesco revela uma
exceção: a América Latina e o Caribe. Essa exceção se deve, em parte, ao
programa Yo, sí puedo:
O programa Yo, sí puedo, criado em
2003 pelo governo cubano, teve amplos resultados […]. Aplicado em 12 dos 19
países da América Latina em 2008, faz parte de estratégias mais amplas a favor
da realização da alfabetização universal no Estado Plurinacional da Bolívia, no
Equador, na Nicarágua, no Panamá e na República Bolivariana na Venezuela.
Baseado na filosofia de José Martí,
resumida na seguinte frase: “Todo homem tem direito a se educar e, como
recompensa, contribuir com a educação dos demais”, o Instituto Pedagógico
Latino-americano e Caribenho de Cuba lançou o programa “Yo, sí puedo”, em 2003,
destinado a alfabetizar os adultos iletrados. A aquisição das capacidades de
leitura, escrita e aritmética é indispensável para desfrutar de uma plena
cidadania. Constitui o primeiro baluarte contra a exclusão e a pobreza, e leva
à realização do que Martí chamou de “a plena dignidade do homem”. A Unesco
ressalta que “a educação salva vidas: quanto mais se eleva o nível escolar da
mãe, a taxa de mortalidade infantil diminui”. Assim, se todas as mulheres
cursassem os estudos secundários, 1,8 milhão de crianças seriam salvas por ano.
Da mesma forma, a saúde das crianças estaria mais protegida. “É menos provável
que as crianças cujas mães cursaram esses estudos manifestem um atraso de
crescimento ou se mostrem abaixo do peso.
Partindo da problemática da
dispersão territorial da população analfabeta, o programa “Yo, sí puedo” é
elaborado mediante o rádio e a televisão. Assim, a educação a distância por
meio das tecnologias de comunicação demonstraram sua eficiência. Com efeito,
esse método, criado pelos melhores especialistas cubanos sob a direção da
pedagoga Leonela Inés Relys Díaz, pode chegar a um grande número de pessoas, é
econômico em capital humano, material e financeiro e não requer instituições
escolares para ser posto em prática. Baseado no estímulo constante e em um
procedimento simples (passar das cifras para as letras), com sequências
audição/leitura e audição/escrita, e dividido em três etapas (aprendizado de
base, ensino da leitura e da escrita, consolidação), permite o crescimento do trabalho
individual, assim como o aprimoramento da autoestima do analfabeto. Permite
também a cooperação familiar e cria vínculos estreitos entre as pessoas
letradas e iletradas. A possibilidade de usar o método em casa permite também
evitar os efeitos psicológicos devido ao olhar dos outros sobre o aprendizado
pessoal. Por outro lado, a curta duração dos programas facilita a motivação das
pessoas. Por fim, baseia-se no princípio fundamental do voluntariado, o que
aumenta a eficácia.
É elaborado um diagnóstico integral
destinado a avaliar as características socioeconômicas, geográficas, políticas,
culturais e religiosas da região a ser alfabetizada, e também é avaliado o
número de postos de rádio e televisão presentes no local. Um estudo analisa
também os resultados obtidos nos processos anteriores de alfabetização. Com
efeito, o conhecimento profundo das peculiaridades da população analfabeta
permite a elaboração dos cursos radiofônicos e televisivos.
São estabelecidas várias estruturas
para permitir o controle do processo de alfabetização e conseguir os melhores
resultados. O trabalho é, de uma só vez, individual e coletivo, com uma visita
regular do professor para seus alunos. Em cada aula, são abordados temas de
interesse, como saúde, família, idosos, meio ambiente, história e cultura. As
pessoas em processo de aprendizagem recebem de quatro a cinco aulas de 30
minutos semanais, pela televisão, durante três meses (32,5 horas letivas ou 65
aulas), e uma série de sete fichas. Para o rádio, o material é composto por 25
fitas K7 de 60 minutos com 50 aulas, 32 fichas e um roteiro.
O programa “Yo, sí puedo” foi
aplicado com êxito na Venezuela, onde mais de 1,5 milhão de pessoas foi
alfabetizado, além da Bolívia, do Equador e da Nicarágua, que são as únicas
nações latino-americanas que se livraram do analfabetismo na última década,
segundo a Unesco. Ele também é utilizado em outros países do continente e do
mundo, como Nova Zelândia, e é aplicado em vários idiomas – entre eles, o
francês e os idiomas indígenas (guarani, maori).
O programa “Yo, sí puedo” também é
aplicado na Espanha. Com efeito, a cidade de Sevilla solicitou os serviços dos
professores cubanos, sob a coordenação do Professor Carlos M. Molina Soto, para
ensinar seus cidadãos a ler e a escrever. Depois de um estudo realizado pela
prefeitura, descobriu-se que mais de 34.000 dos 700.000 habitantes da capital
andaluz eram totalmente analfabetos. Em dois anos, 1.100 adultos foram
alfabetizados nos trinta centros de alfabetização que foram abertos na cidade.
Outros municípios da Espanha, país que conta com 2 milhões de analfabetos,
estudam as possibilidades de aplicar o método cubano em seu território.
Na Austrália, o método de
alfabetização é utilizado com as populações aborígenes – 60% são analfabetos
funcionais –, que aprendem a ler e a escrever em três meses. Além da leitura,
da escrita e da álgebra básica, Cuba oferece a eles a possibilidade de aprender
a usar as novas tecnologias. O programa cubano se beneficia do apoio do governo
australiano, da Universidade de New England e do Conselho de Terras Aborígenes.
No entanto, a Austrália ocupa o segundo lugar mundial em termos de
desenvolvimento humano, atrás apenas da Noruega, segundo as Nações Unidas.
O programa “Yo, sí puedo” recebeu o
prêmio de alfabetização Rey Sejohn da Unesco, em 2006, por sua contribuição à
educação da humanidade. Irina Bokova, diretora geral da organização da ONU,
saudou o método ressaltando seu caráter exemplar de cooperação Sul-Sul. Com
efeito, desde 2003, mais de sete milhões de pessoas de 28 países diferentes
aprenderam a ler e a escrever graças ao programa cubano. Miguel Livina,
representante do Escritório regional de cultura para a América Latina e o
Caribe da Unesco, declarou que os governos e as instituições internacionais deveriam
levar mais em consideração o método cubano. Também saudou o método publicamente
durante a XX Cúpula Iberoamericana, em 2010.
Um novo programa, chamado “Yo, sí
puedo seguir”, destinado a aperfeiçoar os conhecimentos das pessoas
alfabetizadas, também foi implementado nas nações em que o programa “Yo, sí
puedo” foi aplicado com êxito.
Em termos de política social e de
cooperação internacional, Cuba é o modelo a ser seguido. Essa pequena nação
demonstra que é possível contribuir para a melhoria do bem-estar dos mais
desfavorecidos do planeta, apesar de seus recursos limitados. Os países mais
desenvolvidos deveriam se inspirar nela.
*Salim Lamrani
Doutor em Estudos Ibéricos e
Latino-americanos da Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim
Lamrani é professor titular da Universidade de la Reunión e
jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último
livro é intitulado The economic war against Cuba. A historical and legal
perspective on the U.S. Blockade (A guerra econômica contra Cuba. Uma
perspectiva histórica e legal sobre o bloqueio norte-americano), Nova York,
Monthly Review Press, 2013, com um prólogo de Wayne S. Smith e prefácio de Paul
Estrade.
Contato: lamranisalim@yahoo.fr ;
Salim.Lamrani@univ-reunion.fr
Página Facebook: https://www.facebook.com/SalimLamraniOfficie
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Leia também parte I e II da série
de reportagens sobre Cuba:
Cuba ou a globalização da solidariedade: a Operação Milagre
Cuba ou a globalização da solidariedade: o internacionalismo humanitário
Cuba ou a globalização da solidariedade: a Operação Milagre
Cuba ou a globalização da solidariedade: o internacionalismo humanitário
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