1 de Novembro, 2013 (Angola) Jornal de Angola
http://jornaldeangola.sapo.ao
Paulo Morais e
Silva*
A Fundação Pró-Justitiae, com sede no Porto e uma já longa e
consolidada história de relações culturais, formativas e institucionais com entidades
dos chamados países lusófonos, tem assistido com apreensão e estupefacção ao
agravamento das relações formais entre Portugal e Angola, baseado em clamorosas
ineficácias públicas com repercussões em orgulhos estremados, dos quais o nosso
país surge como o protagonista.
Se se disser que o problema tem origem na incomodidade de Angola por
altas figuras públicas daquele país estarem a ser alvo de inquéritos judiciais
em Portugal está-se a dizer apenas uma parte da verdade.
Porque falta dizer que os referidos inquéritos têm permanecido em “fogo
lento” ou mesmo esquecidos algures nos meandros da Procuradoria-Geral da
República portuguesa, donde só se sabe notícia quando, periodicamente, lá sai
uma das costumadas fugas de informação para lembrar que Portugal investiga
criminalmente dirigentes angolanos.
E também se se disser apenas isto não se está a dizer toda a verdade.
Falta acrescentar que
os referidos inquéritos judiciais ultrapassaram todos os
prazos admissíveis legais (obrigando a sucessivos despachos de prolongamento) e
que os processos englobam uma proporção de cerca de 2/3 de individualidades
portuguesas contra apenas 1/3 de angolanas, mas só os nomes das angolanas
surgem na Comunicação Social de Portugal.
Porquê? Pergunte-se ao político, ao juiz de instrução, ao procurador do
Ministério Público, ao inspector da Polícia Judiciária, ao funcionário judicial
ou a quem quer que seja que, a coberto, promove, com eficácia científica, as
incontroláveis fugas de informação.
Porque de eficácia só as incontroláveis fugas de informação. Toda a gente
se habituou já em Portugal a que a pedra basilar da administração da Justiça, a
presunção de inocência, não passe de uma figura de retórica. Toda a gente já se
habituou em Portugal à ineficácia do Ministério Público português, aos
arrastados anos de processos de inquéritos que acabam na sua esmagadora maioria
em arquivamento, à impunidade com que se escarrapacham nomes nos jornais de
quem nada se vem a provar, como assim se promovem injustíssimos julgamentos
públicos, como se maltratam moralmente pessoas, como se prejudicam interesses e
se liquidam empresas, tudo isto com a leveza de “donos da Justiça”. A toda esta
aberrante, clamorosa e inimputável injustiça já os portugueses se habituaram.
A questão está, porém: devem os nossos “irmãos” angolanos, só porque são
um povo próximo de nós, sofrer as mesmas agruras?
Pois é, Angola é um país soberano e os angolanos formalmente cidadãos
estrangeiros.
Poderão ter os seus problemas mas são deles, na casa deles. Não têm que levar
com os nossos cá em casa. Com toda a franqueza pergunta-se: se nos referidos
inquéritos judiciais estivessem cidadãos norte-americanos, franceses, alemães
ou até espanhóis ou brasileiros os nossos magistrados actuavam com a mesma
displicência?
Sabe-se, ódio de irmãos é forma freudiana de amor. Mas isso é para,
eventualmente, pessoas, não para instituições. As instituições só podem ser
formais e cumprirem escrupulosamente as regras. Portugal tem de se descomplexar
em relação a Angola.
*Presidente do Conselho de Fundadores da Fundação Pró-Justitiae
*Presidente do Conselho de Fundadores da Fundação Pró-Justitiae
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