quarta-feira, 1 de abril de 2015

Angola/DEMOCRACIA E BRANQUEAMENTO POLÍTICO

29 março 2015, Jornal de Angola http://jornaldeangola.sapo.ao (Angola)

Filomeno Manaças

Não há país sem história e os angolanos orgulham-se de terem uma das mais ricas e brilhantes, apesar do pouco tempo de independência que têm. A proclamação da independência deu-se em meio a batalhas ferozes contra forças invasoras apoiadas por mercenários e aliados internos que pretendiam impedir a consagração desse momento histórico.

Esse feito está devidamente registado e os heróis dessa nova madrugada para Angola são conhecidos e merecem todo o nosso reconhecimento.

Agostinho Neto foi o timoneiro dessa grande epopeia e como político visionário cedo percebeu e conclamou que “Na Namíbia e na África do Sul estavam a continuação da nossa luta”.

Angola tem uma das histórias mais ricas e brilhantes porque além da luta pela sua libertação do jugo colonial fascista português, uma vez conquistada a independência nacional mergulhou no combate pela emancipação de outros povos. E isso foi alcançado com bravura.

A batalha do Cuito Cuanavale, que
este ano completou mais um aniversário desde que ela teve lugar há 27 anos, em que as FAPLA enfrentaram e impuseram de modo decisivo uma derrota histórica às forças invasoras sul-africanas, apoiadas por tropas da UNITA e por soldados do batalhão Búfalo, é um marco incontornável que abriu caminho à independência da Namíbia, primeiro, e depois à libertação de Nelson Mandela e ao fim do apartheid na África do Sul, com a consequente realização das primeiras eleições multirraciais no país.
Revisitar a história, mergulhar nos factos do passado recente que tiveram o condão de alterar todo o curso da história política, social e económica da África Austral, reveste-se de importância excepcional num momento em que, à pala da democracia, vamos assistindo a investidas incessantes no sentido do escamoteamento da verdade, numa estratégia meticulosamente desenhada destinada ao branqueamento das situações históricas.
Aos jovens que hoje têm 20 anos de idade, alguns dos quais só começaram a ganhar consciência política há pouco mais de quatro anos, temos a obrigação de contar o que na verdade se passou e eles o dever de saber que a marcha para a liberdade que hoje saboreamos vem de longe e envolveu sacrifícios incontáveis que não podem, num ápice, ser atirados para debaixo do tapete porque, em nome da democracia, há quem entenda que assim deve ser feito.

Nada mais errado!

Não vá amanhã um iluminado qualquer vir dizer que o hediondo regime de apartheid não existiu na África do Sul. Do mesmo modo que agora vemos políticos da UNITA a endeusarem Jonas Savimbi e o seu cortejo de mortes e destruições que deixaram o país à beira do colapso. Um colapso que foi possível evitar porque os angolanos, defensores acérrimos da paz e comandados pelo Presidente José Eduardo dos Santos, levaram a comunidade internacional a acordar a tempo da letargia e reconhecer e declarar que o líder rebelde, na sua caminhada tresloucada para a conquista do poder a todo o custo, mandando às urtigas o veredicto das urnas, se constituiu num sério entrave a qualquer tipo de solução política e ameaça grave até mesmo aos interesses de antigos aliados.

A direcção política da UNITA revela-se órfã de Jonas Savimbi, apesar de saber que é, em democracia, contra natura defender os valores que o líder da rebelião armada abraçou e fez questão de os levar avante até ao fim da sua vida: o do recurso à violência para a conquista do poder.

Sabemos todos que milhares e milhares de cidadãos perderam a vida por esta Angola fora devido à extrema irracionalidade de Jonas Savimbi, que não poupava nem mesmo os seus mais próximos, muitos dos quais mortos de forma bárbara.

E temos todos de colocar a nossa consciência em alerta quando a direcção da UNITA pretende passar a ideia de um Jonas Savimbi comprometido com os valores democráticos, pois além de nos remeter ao passado tenebroso recente que fazia da morte de angolanos uma coisa banal, traduz a ideia de que a direcção de Isaías Samakuva é incapaz de refundar o partido e ajustá-lo aos verdadeiros princípios da democracia.

Não podemos permitir que se falseie a história e muito menos aceitar que nos queiram apresentar como normal que a democracia nasça e se desenvolva em Angola sob o estigma da cultura da violência, que subverte os seus mais nobres propósitos, de respeito pela diferença de opinião, dos resultados eleitorais, do reconhecimento da legitimidade do vencedor das eleições e observância de fair play.


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