17
agosto 2013, Jornal de
Notícias http://www.jn.pt (Portugal)
O Portugal Democrático, mesmo com
uma democracia esfarrapada e empobrecida, sobreviverá às políticas neoliberais
e retrógradas que estão a ser impostas, como e por quanto tempo? Nos últimos
dias, a partir de uma estimativa rápida (a ser revista) do Instituto Nacional
de Estatística (INE) sobre a evolução do Produto Interno Bruto (PIB),
desencadeou-se, pela enésima vez desde 2008, a ideia de que a recessão
económica está a ser ultrapassada e que agora é que é: "estamos a sair da
crise".
Até hoje todos os anúncios deste
tipo, feitos a partir de indicadores conjunturais lidos parcelarmente e
distanciados de uma abordagem sólida de tudo o que marca a situação da economia
e das pessoas, apenas serviram para limitar os protestos populares, para
secundarizar reflexões e propostas estruturadas, para o prosseguimento de
políticas desastrosas que têm conduzido o país a uma situação cada vez pior.
Desta vez, a ladainha de que vale a pena os sacrifícios e de que é preciso
continuá-los e aprofundá-los foi de imediato retomada e está a servir a
ofensiva contra os direitos dos trabalhadores e dos reformados, desde logo na
Administração Pública, os ataques ao ensino público, ao sistema de segurança
social e ao setor da saúde.
As previsões do INE mostram-nos que
a ocasional interrupção da recessão, no último trimestre, foi talvez resultado
de três causas: estarmos a ter um bom ano de turismo provocado por fatores
externos e instabilidades em destinos alternativos; aumento pontual das
exportações, designadamente, em resultado da entrada em funcionamento de uma
unidade da Galp em Sines; impacto positivo das decisões do Tribunal
Constitucional que evitaram algumas medidas de austeridade.
Quando olhamos com rigor o que vai
marcar os tempos próximos constatamos que não se prevê um aumento sustentado
das exportações. Por outro lado, as doses de maior austeridade, de mais
desemprego no setor público central e local, os cortes nas pensões e nas
funções sociais do Estado e o surgimento de emprego pouco qualificado e
miseravelmente remunerado agravarão os problemas.
Entretanto, vai sendo colocado
atentismo sobre "mudanças positivas" nas políticas da União Europeia
que carece de fundamento. O que continua a imperar são políticas neoliberais e
os interesses financeiros de alguns. Por causa das eleições alemãs há muito
lixo a ser empurrado para debaixo do tapete. Os problemas da Grécia, como os de
Portugal e de outros países em dificuldades, assim como a grave situação do
sistema financeiro europeu no seu conjunto, mantêm-se e acentuam-se. As grandes
mudanças de que a União Europeia carece nem por sombras se perspetivam.
Algum dia se encontrará saída para
os problemas e passaremos a ter crescimento económico. Mas, quando se conseguir
construir esse momento, como estará em Portugal a distribuição da riqueza? O
que terá sido feito do nosso sistema nacional de saúde, do sistema da segurança
social, da escola pública, do sistema de transportes, de milhares e milhares de
pequenas e médias empresas privadas que estabilizam o funcionamento da
sociedade? O que terá sido feito do papel do Estado e ao serviço de quem ele
terá sido colocado?
É urgente travar o plafonamento e
outras loucuras na segurança social, travar o "cheque-ensino" que
significa destruição do direito universal ao ensino, travar as manipulações
estatísticas no setor da saúde que visam esconder o seu debilitamento e o
favorecimento à privatização. A discussão em torno do próximo Orçamento do
Estado é primordial. A ela se tem de associar um forte debate sobre estas
políticas que estão a ser impostas a toda a velocidade.
Temos um presidente da República
que só por milagre, ou fortíssima pressão da sociedade, não dará cobertura ao
subversivo programa do Governo/troika até 2016, o que torna o processo ainda
mais complexo. É preciso aumentar a sua responsabilização.
Portugal Democrático pode não
resistir por muito mais tempo. A sociedade portuguesa tem recursos e
capacidades para o defender, mas o tempo escasseia para as forças de Esquerda e
os democratas encetarem caminhos alternativos e propostas de governação.
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