terça-feira, 25 de setembro de 2007

Chávez, Virgílio e o império

Gilson Caroni Filho/Carta Maior/25 setembro 2007

Quando o líder venezuelano lamenta a demora na concretização de projetos vitais para o região como o Gasoduto do Sul e o Banco do Sul- sabe perfeitamente o que move as protelações.

Os tucanos costumam dizer que o Mercosul está estagnado pelas diferenças político-culturais entre seus parceiros, pela assimetria entre as economias do subcontinente sul-americano, e por medidas protecionistas, tomadas em momentos de crise. Se as dificuldades existem, tomá-las como impossibilidade de uma integração soberana faz parte da estratégia do liberalismo-conservador derrotado nas urnas em 2006.


Costumam invocar o Protocolo de Ushuaia, assinado em 1998, pelo Mercosul e seus países associados, que define o regime democrático como condição indispensável para a existência e desenvolvimento dos processos de integração. A isso supostamente se aferram para protelar a aprovação da Venezuela como membro pleno do bloco. Não foi casual que, há cerca de dois meses, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tenha declarado que “Hugo Chávez tem que ver que está se colocando em uma posição de muita intransigência, de muitas questões, e que algumas delas ferem a consciência democrática da região e do Mercosul". Na verdade, conhecemos o que norteia a “consciência democrática" dos neoliberais: os interesses do “grande sócio” na região.


Quando o líder venezuelano lamenta a demora na concretização de projetos vitais para o região como o Gasoduto do Sul e o Banco do Sul- sabe perfeitamente o que move as protelações. Ao dizer que por trás de atrasos e desencontros está a mão do império estadunidense, toca em questão cara a uma classe dominante que sempre pensou inserção subalterna como projeto ideal. O lamento de colônia costuma vir sob o argumento de que "fracasso das negociações para a criação da Área de Livre-Comércio das Américas (Alca) também não foi bom para o Mercosul, porque abriu aos Estados Unidos espaço para promover acordos comerciais bilaterais"

É dentro desse contexto que algumas reações devem ser avaliadas. A nota divulgada à imprensa, sexta-feira, 21/09, pelo líder do PSDB, Arthur Virgílio, é um primor pelo que não diz: "Não adianta ele pressionar com esse discurso atrasado e com esse cacoete de insultar parlamentares para forçar a aprovação do ingresso do seu país no Mercosul", concluindo que " em marcha batida rumo a um regime ditatorial, o governo de Chávez não preenche o requisito da cláusula democrática do Tratado do Mercosul".


O que o senador amazonense não tolera é o que dá mais sustentação a um projeto estratégico regional , aquilo que setores conservadores, dentro de um viés funcionalista, têm chamado de crise política. Ou ''retórica nacionalista imprecisa''. É a reafirmação soberana de uma região que não constrange nenhuma instituição democrática, pelo contrário a confirma como instância de poder.


É preciso que o Estado, e não as forças cegas do mercado, continue sendo o principal fator de estruturação da economia e da sociedade, assim como base institucional para articulação dos processos de integração regional. Compreender a importância da Venezuela na integração das economias regionais e de suas matrizes energéticas está longe de, como quer fazer crer o discurso recorrente do conservadorismo, submeter o Congresso aos humores de Chávez.


Em 07/10/2006, escrevemos aqui mesmo, na Carta Maior: "o governo Lula tem uma política externa que fortalece o Itamaraty e aposta no Mercosul como futuro espaço de integração. Sabe que toda movimentação regional está sob a espada de Dâmocles do Império e suas 22 bases militares na região. A oposição, ao contrário, defende uma integração subalterna, controlada por megacorporações". Infelizmente o texto não perdeu a atualidade. Virgílio e seus correligionários continuam a atualizá-lo. A inclusão da Venezuela como membro pleno é questão de soberania regional. O resto é tergiversação de candidatos a Vice-Rei.


Quem assistiu ao documentário de Kim Bartley e Donnacha O’Briain sabe que, a depender das oligarquias latino-americanas, assim como a revolução, integrações que interessem aos povos latino-americanos também “ não serão televisionadas”.


http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=3728&boletim_id=356&componente_id=6777

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