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sexta-feira, 21 de maio de 2010
Moçambique/35 ANOS DO BM - O QUE FICOU POR DIZER DA CRISE FINANCEIRA
Um simpósio internacional sobre a Crise Financeira mundial marcou o ponto mais alto da celebração dos 35 anos da criação do Banco de Moçambique celebrados terça-feira. Diversas personalidades nacionais e estrangeira passaram o seu testemunho fazendo a caracterização e apresentando lições e caminhos a seguir face à crise despoletada em Setembro de 2008 com o colapso de algumas instituições financeiras nos Estados Unidos da América e que se propagou pela Europa, Ásia e mais tarde para África.
21 maio de 2010/Notícias
Estudos realizados por instituições vocacionadas, incluindo universidades em todo o mundo convergem em considerar que o desrespeito pela regulação e pelas instruções emanadas das instituições encarregues pela supervisão do sistema financeiro é, em grande parte, a causa principal deste descalabro sem precedentes.
A Região Austral de África ainda que tenha saído ileso da crise contraiu algumas mazelas. Dados disponíveis apontam que o Produto Interno Bruto (PIB) da zona registou um crescimento insignificante de 2,7 porcento em 2009, contra uma taxa de 4,8 porcento de 2008.
A queda na procura dos produtos de exportação e a deterioração dos preços dos produtos de base, conjugada com o adiamento na execução do investimento directo estrangeiro são alguns dos factores que contribuíram para o desempenho não satisfatório da economia da região da SADC.
Roger Nord, Assessor sénior do Departamento Africano do Fundo Monetário Internacional defende que a estabilidade económica global requer uma cooperação também global. Sublinhou que o FMI está a trabalhar num sistema de vigilância que permita identificar os riscos numa fase embrionária.
Fazendo um enquadramento da Crise Financeira Internacional, Desafios, Perspectivas e Impactos nas Economias africanas, Roger Nord concentrou a sua dissertação sobre Moçambique e disse que este país mostrou resistência à crise e pode agora contar com o apoio do FMI.
Por seu turno Tamaz Salomão, Secretário Executivo da SADC defendeu que o futuro de África está nas mãos dos africanos, e o da África Austral, nas mãos dos seus habitantes.
Enquanto isso, a Governadora do Banco Central da África do Sul, Gill Marcus entende que a eficiência bancária dos países da SADC é melhor que a média dos países do resto do continente africano.
Muitas outras experiências foram passadas na por Pedro Neves que falou do impacto da crise no sector financeiro europeu, com desta para Portugal. Anselmo Teng dissertou sobre as implicações da crise nos mercados Asiáticos, com destaque para Macau enquanto que da América Latina falou o brasileiro, António Matos Vale.
FUTURO DE ÁFRICA ESTÁ NAS MÃOS DO AFRICANO
“O futuro de África está nas mãos dos africanos, e o da África Austral, nas nossas mãos”, defendeu Tomaz Salomão, Secretário Executivo da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC). Salomão entende que, não há ninguém, por melhores intenções que tenha, fará da região ou dos países da zona, o melhor lugar para viver, se não “nós próprios, com a boa vontade e cooperação dos outros”.
Intervindo durante o simpósio organizado no quadro das celebrações dos 35 anos da criação do Banco de Moçambique, Tomaz Salomão apontou que a Região foi bastante afectada pelos efeitos secundários da crise económica e financeira mundial, que se tornou mais profunda em 2009. O crescimento económico retraiu-se, mas se manteve positivo na maioria dos Estados membros da SADC, onde os sectores mais afectados foram os de minas, têxteis, automobilístico e turismo, repercutindo-se na balança de transações.
Recorrendo às estatísticas, a fonte indicou que o PIB real da região registou um crescimento insignificante de 2,7 porcento em 2009, o que representa uma queda em relação à já baixa taxa de 4,8 porcento em 2008.
Disse que a curto prazo, para aliviar o impacto da crise sobre as suas economias, os Estados membros tomaram diversas medidas, das quais salientam-se a implementação de políticas fiscais de expansão e flexibilização das políticas monetárias restritivas para acomodar a expansão da despesa pública, e do crédito à economia, o que assumiu a forma de pacotes de estímulo destinados a proteger os trabalhadores afectados pelas medidas de redimensionamento e a prestação de apoio a empresas seleccionadas afectadas pela crise.
A maioria dos Estados membros implementou políticas destinadas a racionalizar os orçamentos nacionais mediante o corte de despesas não essenciais tais como viagens enquanto outros continuam a fazer reformas destinadas a melhorar o ambiente de negócios.
Concluindo, a fonte sublinhou que análises e estudos já realizados por instituições vocacionadas em todo o mundo convergem em afirmar que o desrespeito pela regulação e pelas instruções emanadas das instituições encarregues pela supervisão do sistema financeiro é, em grande parte, a causa principal deste descalabro sem precedentes.
“Nós, os países em vias de desenvolvimento, que somos compelidos a todo o custo, a implementar e cumprir com as receitas decorrentes dos programas de ajustamento estrutural, muitas vezes com penosos custos sociais e pouco impacto no nosso desenvolvimento socioeconómico, podemos tranquilamente afirmar que o slogan faz o que eu te digo e não que eu faço, ficou demonstrado”, sublinhou Tomaz Salomão.
INFRA-ESTRUTURAS EM CARTEIRA
O ministro das Finanças, Manuel Chang, afirmou que o país vai manter atenção especial na construção de infra-estruturas que permitam um melhor aproveitamento do potencial existente e assim poder recuperar-se rapidamente dos efeitos da crise financeira internacional. Segundo o governante, apesar do optimismo quanto à recuperação da economia mundial, vai ainda levar algum tempo até que a capacidade produtiva esteja reposta na totalidade.
Falando no encerramento do Simpósio Internacional sobre Crise Financeira Internacional, Manuel Chang disse que outra estratégia passa pelo reforço das parcerias público-privadas para o desenvolvimento de projectos estruturantes e a melhoria do ambiente de negócios.
Para o ministro das finanças as parcerias público-privadas podem contribuir para a criação das condições necessárias para o alargamento do sector privado e aumento dos investimentos, pressuposto básico para o incremento da produção e emprego no país.
“As crises financeiras mostram que não obstante as suas origens possam ser os desequilíbrios ou desajustamento criados em outros quadrantes da economia, em última instância elas acabam por sobrecarregar os governos”, referiu Manuel Chang.
Justificou que a sobrecarga dos governos surge do facto de as crises desacelerarem o crescimento económico, concorrendo, igualmente, devido à redução da fonte de receitas para o orçamento do estado, agravando a já difícil situação orçamental da África Subsaariana que se vê na obrigação de desviar os parcos recursos de que dispõe para mitigar os efeitos da crise sobre as camadas vulneráveis.
“Do nosso lado, perante o compromisso que temos de manter os bons fundamentos económicos e considerando as medidas tomadas nos últimos anos e os sinais de recuperação da economia mundial, embora que tímidos, podemos prever uma aceleração da taxa de crescimento da nossa economia em 2010”, referiu.
Disse que as lições tiradas do Simpósio só terão verdadeiro valor se houver capacidade de fazer uso das mesmas para o fortalecimento dos sistemas financeiros e aprimoramento do quadro das políticas macroeconómicas, assegurando crescimento sustentando, essencial para a redução da pobreza e alcance dos objectivos do milénio.
BANCOS DA SADC SÃO MAIS EFICIENTES
A governadora do Reserve Bank da África do Sul, Gill Marcus, disse que a eficiência bancária dos países da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) é melhor que a média dos países do resto do continente africano. Gill Marcus, que falava sobre o Impacto da Crise Financeira Internacional no Sector Financeiro dos Países da SADC, disse também que os países desta região, por serem, na sua maioria, menos desenvolvidos, não estão muito integrados com o mercado financeiro global.
“Contudo, os países da SADC estão directa ou indirectamente expostos aos desenvolvimentos que ocorrem no mercado financeiro internacional. A intermediação financeira aumentou desde 2009 e a alocação do crédito é dominado pela África do Sul e Maurícias”, disse.
Relativamente ao impacto da crise, a governadora do banco central sul-africano, explicou que antes do ano 2008, o crescimento económico de muitos países da SADC estava em consonância com o bom ambiente que caracterizava a economia mundial.
“Os preços dos bens de exportações da SADC estavam num nível razoável, mas em meados de 2008, começou a assistir-se a um declínio significativo dos preços daqueles bens até meados de 2009, tendo posteriormente havido uma recuperação das exportações”, disse.
Assim, o crescimento nos países da África Subsahariana decresceu em 5 por cento em 2008 para 2.8 em 2009, enquanto que e o crescimento médio da região da SADC também decresceu em 2009. O Botswana, Namíbia, África do Sul e Madagáscar conheceram uma contracção forte nos respectivos PIB em 2009, o que teve repercussões negativas no nível das reservas bancárias.
“Contudo, uma recuperação parece estar em progresso nesses países e está em consonância com o melhoramento global que é manifestado por estímulos fiscais fortalecidoa pelas economias da Índia e da China”, disse.
Fazendo uma analogia da SADC com a China, Gill Marcus afirmou que aquele país asiático acumulou biliões de dólares norte-americanos que foram úteis no combate aos efeitos da crise.
“Muitos países da SADC e da África em geral têm uma depressão do câmbio muito grande. Também foram afectados pela queda dos preços dos seus produtos de exportação. Por exemplo, a Zâmbia testemunhou o declínio de quase metade das suas receitas em dólares em 2009, por causa da queda do preço do cobre”, afirmou.
A governadora explicou também que os dados de 2009, apontam que muitos países da SADC têm um défice na conta corrente muito significativo.
“Se olharmos para o desenvolvimento fiscal, podemos ver que a crise global afectou a maior parte dos países da SADC. As baixas receitas dos governos e também as elevadas dívidas, os aumentos das taxas de juros têm criados desequilíbrios nesses países, situações que, obviamente, se reflectem, entre outros aspectos, também no nível de reservas bancárias”.
SECTOR FINANCEIRO DE BOA SAÚDE
“O sector financeiro mantém-se estável e com rácios acima dos padrões prudenciais”, assegurou o governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove. Falando no Simpósio Internacional por ocasião do 35º aniversário da criação do Banco de Moçambique, Gove detalhou que o rácio de solvabilidade se posicionou em cerca de 15.1 porcento em Dezembro de 2009, após 13.9 no fecho de 2008.
Segundo o governador do Banco Central, o rácio de crédito malparado do sistema reduziu 1.8 porcento, após dois porcento bem Dezembro de 2008.
Esta estabilidade é o resultado de uma série de medidas tomadas quer pelo Banco Central como pelo Governo com vista a mitigar os efeitos da crise na economia.
Do lado do Banco Central entre as medidas tomadas destaca-se a diversificação da carteira de activos externos com o objectivo de reduzir ao máximo a exposição aos riscos derivados de uma forte concentração no mesmo tipo de activos.
Outra estratégia adoptada pelo Banco de Moçambique para mitigar os efeitos da crise foi alterar as normas prudenciais atinentes à classificação do risco de crédito, reforçando os requisitos de provisões que as instituições devem observar para minimizar as perdas decorrentes do incumprimento dos prazos de pagamento de créditos.
Em 2009, o Banco Central injectou liquidez em divisas no valor total de 798 milhões de dólares norte-americanos (cerca de oito porcento do PIB), ou seja, mais 130 milhões em relação ao ano anterior.
Esta injecção, explicou Ernesto Gove, tinha como objectivo fazer face à pressão cambial que estava a ser exercida sobre o mercado em parte devida à redução acentuada das exportações, conjugada com maiores dificuldades de acesso ao crédito externo pelas empresas nacionais.
Explicou que contrariamente ao sucedido noutras economias, em Moçambique a crise financeira não teve reflexos directos sobre o sector financeiro, situação justificada, por um lado pelo facto de as instituições que operam no país apresentarem um baixo nível de exposição aos activos corroídos pela crise.
Por outro lado, o governador disse que os operadores financeiros do mercado moçambicano apresentam-se com nível de capitalização adequado, conjugado com as medidas de reforço prudencial, rigor e profissionalismo na gestão das instituições, na sequência do cumprimento das recomendações emitidas pelo Banco Central.
O simpósio que contou com representantes dos bancos centrais da região, de Portugal e Brasil foi uma oportunidade para a sistematização das contribuições para a melhoria da actividade das entidades reguladoras do sistema financeiro.
Foi acima de tudo um fórum para a captação e cruzamento das diferentes manifestações e visões com vista a munir os bancos centrais de soluções alternativas para os diversos problemas de ordem económica que ainda desafiam o crescimento das economias.
MACAU EMERGIU ILESO DO TSUNAMI FINANCEIRO
Logo após a ocorrência da crise financeira, o Governo de Macau tomou, de forma rápida e resoluta, medidas para reduzir o seu impacto, tais como estabelecer o regime de garantia de 100 por cento para os depósitos nos bancos “onshore”. Tais medidas fizeram que Macau saísse “ileso” da crise financeira internacional.
Anselmo Teng, presidente da Autoridade Monetária de Macau, falando sobre o impacto da crise financeira nos mercados asiáticos, com destaque para a experiência do seu país, explicou que para que Macau não sofresse os impactos da crise foram tomadas várias medidas, tais como a aceleração do investimento público, a concessão de subsídios, o levantamento de restrições à concessão de empréstimos às pequenas e médias empresas para estimular a procura interna e promover o emprego, entre outras.
Outras medidas tomadas pelo Macau, incluem a concessão da liquidez aos bancos sempre que necessário, o reforço da supervisão ao funcionamento prudente dos mesmos, bem como o reforço da comunicação e da coordenação com outras entidades de supervisão das regiões vizinhas, com o objectivo de assegurar o funcionamento regular e a estabilidade do sistema financeiro.
Anselmo Teng, explicou que a recuperação da economia de Macau deveu-se, principalmente, ao ‘efeito de locomotiva’ da economia da República Popular da China. Disse que logo após a eclosão da crise, a China tomou medidas para salvar a economia. Foi anunciado um pacote de medidas de estímulo no valor de 4 triliões de renmibis (um dólar americano equivale a cerca de 6.8 renmibis), destinado principalmente ao aumento do consumo interno, ao reforço da segurança social, ao aperfeiçoamento sistema de cuidados de saúde e ao desenvolvimento rural.
A Índia, outra economia emergente da Ásia, também registou um crescimento superior a 7 por cento em 2009.
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