21 agosto 2014, Pátria
Latina http://www.patrialatina.com.br (Brasil)
Andre Vltchek, Counterpunch
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Há crescente perigo de que os BRICS – o clube das nações que se
organizam na vanguarda, nas trincheiras, para encarar o imperialismo ocidental
global – possam ser diluídos e enfraquecidos, caso alguns dos aliados
ocidentais de direita, como Indonésia e Turquia, venham a ser admitidos ao
grupo.
BRICS são o Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e o grupo
foi pensado originalmente como simples bloco econômico, mas, em anos recentes,
os ataques do ocidente contra países com sistemas político e econômico
independentes, empurraram a maioria das nações BRICS para uma poderosa aliança
política, talvez, mesmo, um abraço.
Exceto o notório aliado dos EUA e capitalista fundamentalista – a
Índia – todos os demais países membros estão-se posicionando desafiadoramente e
orgulhosamente contra a mais recente onda de massacre neocolonialista
ocidental. Podem até ter sistemas políticos e econômicos diversos, mas o
anti-imperialismo é o denominador comum essencial entre eles.
Eles todos, mais uma vez com exceção da Índia, estão sob severo
ataque de propaganda pela imprensa-empresa de massas ocidental.
Nos últimos poucos anos, China e Rússia estão sendo militarmente
cercadas, e sempre sob ataques de declarada provocação. A África do Sul é
demonizada e ridicularizada, enquanto a América Latina é alvo de incontáveis
ataques e furiosa interferência em seus assuntos internos: governos
progressistas em Honduras e no Paraguai foram derrubados, e inúmeros
“movimentos de oposição” têm sido persistentemente fabricados e financiados
pelo norte.
Mas o bloco, que abraça quase 40% da população do planeta continua
a andar à frente,
criando a tão necessária diversidade e, vale sempre repetir,
um mundo bipolar.
Dia 15/7/2014, Pepe Escobar escreveu do Brasil, para Asia Times. Os presidentes dos
países BRICS lá estavam reunidos, incorporando na reunião outros países
latino-americanos. Definiram-se grandes planos e mais uma vez ficou bem claro o
quão importantes são China e Rússia para as nações progressistas da América
Latina; o quanto todos eles estão andando depressa uns em direção aos outros,
politicamente, estrategicamente e economicamente:
A notícia do dia é que a partir de hoje, 3ª-feira (15/7/2014), em
Fortaleza, nordeste do Brasil, o grupo dos BRICS, das potências emergentes
(Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) começa a combater a (Des)Ordem
(neoliberal) Mundial, com um novo banco de desenvolvimento e um fundo de
reserva criado para contrabalançar crises financeiras.
Foi estrada longa e sinuosa desde Yekaterinburg em 2009, na
primeira reunião de cúpula do mesmo grupo, até o contragolpe longamente
aguardado, dos BRICS contra o Consenso de Bretton Woods – do FMI e do Banco
Mundial – e do Banco Asiático de Desenvolvimento [orig. Asian
Development Bank (ADB)] dominado pelo Japão, mas sempre respondendo às
prioridades dos EUA.
São grandes tempos, sem dúvida alguma.
******
Onde fica a Índia ainda não está claro. Visitei recentemente o
país, o segundo mais populoso do mundo, e depois de muito viajar por lá,
intensivamente, cheguei à conclusão de que aquelas elites, os quadros militares
e religiosos que governam o que o ocidente chama cinicamente de “a maior
democracia do mundo”, vivem, com certeza absoluta, muito mais perto de
Washington e dos “boys da Escola de Economia de Chicago” do que de Moscou,
Brasília, Pretoria ou Pequim.
Aprendi também, sem dúvida possível, que a imensa maioria do povo
indiano é ensinada a nada saber dos desenvolvimentos na América Latina, China e
Rússia, e que absolutamente eles não têm influência alguma nos rumos do
desenvolvimento do próprio país.
Em breve distribuirei meu trabalho sobre a Índia no contexto dos
BRICS, mas posso dizer desde já que é óbvio que esse complexo país não é, não,
de modo algum, força motriz daquela aliança.
É também claro que esse novo, poderoso e importante (para a
sobrevivência da humanidade) bloco não precisa incluir em suas fileiras mais
países “clientes”, dos que o ocidente manobra à vontade. Por essa razão, o que mais
deseja o mundo corporativo e neocolonial, que muito trabalho para obtê-la, é a
“diluição” dos países BRICS e da determinação do grupo.
Há um grupo de candidatos letais, prontos a se unirem aos BRICS a
qualquer momento, com o único objetivo de torpedear o movimento. E há vários
pacotes de ampliação sob análise, desde uma “pequena ampliação”, com acréscimo
de Indonésia e Turquia, até pacote muito maior, com acréscimo de todo um grupo
chamado abreviadamente MINT –México, Indonésia, Nigéria e Turquia.
Se essa expansão acontecer, com certeza destruirá toda a direção
política na qual os BRICS estão andando. É expansão a ser evitada a qualquer
custo.
******
Esses países MINT vão, de países simplesmente à direita, até países
abertamente fascistas. Todos são declaradamente pró-ocidente; todos são
governados pelas elites e as populações têm mínima influência no destino de
seus países. O México é, desses, o mais razoável e mais benigno.
A Indonésia é o “mais mortal” deles, e não é simples país, mas todo
um conceito. Em 1965, o ocidente associou-se às muito corruptas elites
indonésias, quadros militares ("comandados" por Hadji Mohamed Suharto) e religiosos, e derrubaram o presidente Sukarno,
progressista, criador do Movimento dos Não Alinhados.
Pelo menos um milhão de indonésios, comunistas, intelectuais,
líderes sindicais, professores e membros da minoria chinesa, foram assassinados,
mas o total de mortos pode ser muito maior, pode chegar a 3 milhões. Estupros
“punitivos” em massa, e a destruição da cultura indonésia aconteceram
simultaneamente. Queimaram-se livros. Praticamente tudo foi privatizado e
entregue para ser explorado por estrangeiros.
Seguiram-se dois brutais genocídios: um contra o povo de Timor
Leste e outro, ainda em andamento, contra Papua, que é tribal e vive na
miséria, mas é riquíssima em recursos naturais. No primeiro, um terço da
população local foi dizimada; no outro, em números calculados por grupos
ocidentais de direitos humanos, morreram, pelo menos, 120 mil pessoas. Muitos
mais continuam a ser mortos, no momento em que escrevo. Nada se discute, não há
“conversações” nem protestos contra o massacre.
Esse “conceito Indonésia” (mate indiscriminadamente, espalhe o
medo, paralise a nação inteira e, na sequência, deixe que o “setor privado”
passe a mão em tudo) tem sido, na sequência, implementado noutros países, com
diferentes graus de sucesso, inclusive no Chile (o pessoal de Allende ouviu
“avisos” repetidas vezes, antes do golpe de 1973: “Tomem cuidado,
camaradas, Jacarta vem aí!”); na Rússia de Ieltsin; na República
Democrática do Congo, só para citar alguns casos.
A “mudança de regime” que derrubou Sukarno, e o “retorno à
democracia”, não passaram de manobra cosmética. O capitalismo mais selvagem já
metera as garras ali, e sobreviveu. Na Indonésia, virtualmente não resta
absolutamente nenhuma instituição pública. Não há praças públicas, não há
instituições culturais públicas nem serviço público de limpeza e esgotos. Se as
estatísticas internacionais prestam, sabe-se que mais da metade da população
vive na miséria. Criatividade, praticamente apagada: a quarta mais populosa
nação da Terra não tem nada a mostrar ao mundo, nenhum cientista, nenhum
artista, praticamente nenhum pesquisador ou pesquisa. A economia cresce, porque
a exploração é severa e ainda há restos de recursos naturais que ainda alcançam
bons preços no mercado global de commodities.
Dois candidatos disputaram o cargo voto a voto, nas recentes
eleições presidenciais: um general aposentado, acusado de ser criminoso de
guerra, com um bando de asseclas; e um populista, também com seu bando de
asseclas militares a apoiá-lo.
Com toda da imprensa-empresa local controlada por interesses
empresariais, e com virtualmente todos os partidos políticos a serviço de
oligarcas locais, “democracia”, por ali, é apenas uma palavra com a qual o
ocidente tenta encobrir todos os horrores passados e presentes de um de seus
mais brutais, mais grotescos, estados-clientes.
Deve-se mencionar também que nessa “democrática” Indonésia há leis
que proíbem o comunismo e o ateísmo; que reuniões organizadas para discutir a
reintrodução de um mínimo de serviços “públicos” são brutalmente interrompidas
por fanáticos religiosos e por gangues que servem aos interesses de grandes
empresas.
Fácil imaginar o impacto que todo o grupo sofreria, se a Indonésia
viesse a ser “convidada” para participar dos BRICS!
******
Nenhum comentário:
Postar um comentário