segunda-feira, 7 de setembro de 2015

A LIÇÃO DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

4 setembro 2015, ODiario.info http://www.odiario.info (Portugal)



Cumprem-se 76 anos da invasão da Polónia pela Alemanha nazi, a 1 de Setembro de 1939 e 70 anos da rendição do Japão a 2 de Setembro de 1945. Com a publicação deste artigo de Laura Lopes, membro da presidência do CPPC, odiario.info presta também homenagem a esta grande figura de lutadora pela paz.

Na noite do dia 31 de Agosto de 1939, Alfred Helmut Naujocks, membro das SS nazis e do serviço de segurança SD, à frente de um grupo de criminosos de direito comum vestidos com uniformes polacos, simulava um ataque ao emissor de Gleiwitz na fronteira da Alemanha com a Polónia, às ordens do conde Heydrich, comandante da polícia de segurança SD.

No dia 1 de Setembro de 1939, o jornal “Volkischer Beobachter” comentava este episódio da seguinte forma: “Os Polacos irromperam na sala … O ataque contra a estação tinha todo o aspecto de sinal para um ataque geral dos franco-atiradores polacos contra o território alemão. Como se constatou entretanto, os rebeldes polacos romperam ao mesmo tempo a fronteira alemã em dois lugares. Em ambos os locais tratava-se de destacamentos armados até aos dentes, que segundo todas as aparências tinham o apoio do exército polaco regular. As secções da polícia de segurança estacionadas na fronteira ficaram à mercê dos assaltantes. Os combates de uma grande violência continuam.”

Esta operação detalhadamente montada por Hitler, como foi verificado no processo dos criminosos de guerra em Nuremberga, foi o sinal de desencadeamento da II Guerra Mundial, que vinha a ser preparada desde há muito. Após ter ordenado o golpe de mão de Gleiwitz, Hitler deu ordem para iniciar a guerra. Os exércitos hitlerianos invadiram a Polónia que se encontrava isolada e privada da ajuda prometida pelos aliados ocidentais, França e Grã-Bretanha, que há longos meses agiam em negociações de gabinete receosos de uma aliança com a U.R.SS, deixando complacentemente Hitler avançar com os seus planos de conquista de “espaço vital a Leste”. Foi a Polónia o primeiro país que opôs uma resistência armada às tropas da Wermacht. Durante cinco semanas lutou sozinha contra o exército nazi numa desproporção de forças que inevitavelmente levaria ao seu esmagamento imediato. As primeiras conquistas nazis, no seu expansionismo para Leste, tinham-se efectuado sem efusão de sangue: a Áustria, os Sudetas e Praga entregaram-se ao domínio hitleriano.

Hitler tinha dito 10 dias antes, em 22 de Agosto: “… a destruição da Polónia deve ser a nossa primeira tarefa … Não tenham piedade … Sejam brutais … é preciso
agir com a máxima severidade … A guerra deve ser uma guerra de destruição.”

Mas o objectivo principal não era apenas a Polónia, era toda a Europa de Leste. Tratava-se, para a Alemanha, primordialmente, de se apoderar de novas regiões agrícolas, de mercados para a venda dos seus produtos e de fontes de matérias-primas para a sua indústria, de destruir o sistema socialista da União Soviética.

Tinha começado a II Guerra Mundial, a mais atroz e devastadora guerra que a Europa conheceu.

Porém, há que recordar que Hitler experimentou a sua força militar e a disposição dos governantes dos países ocidentais – França, Grã-Bretanha e Estados Unidos – durante a Guerra Civil de Espanha.

Em Espanha fora deposto o Rei e instituída uma República Democrática. Mas no dia 18 de Julho de 1936 o General Franco toma a chefia de uma insurreição armada fascista contra a nova República e invade o país. Desde o início da eclosão deste movimento o governo francês revogou o tratado de comércio que dava à Espanha o direito de comprar armas em França. Em Agosto Londres seguiu o exemplo de Paris e proibiu também a venda de armas à Espanha. No entanto, o fornecimento de armas aos franquistas continuava a fazer-se através de Portugal. Por iniciativa de Léon Blum, chefe do governo francês, a política chamada de “não intervenção”, aceite por todas as potências estrangeiras, só viria a actuar em relação ao governo republicano, dado que a Itália e a Alemanha ajudavam Franco. Os Estados Unidos ao aplicarem o Acto de Neutralidade à Espanha declararam as duas partes – republicanos e franquistas – iguais em direitos. O receio por parte dos governos ocidentais de um conflito armado generalizado fá-los considerar tais posições legítimas face à opinião pública. Mas a emoção internacional e expectativa são enormes. Hitler aumenta para dois anos o serviço militar obrigatório. O Japão desrespeita as convenções internacionais e lança-se no rearmamento naval. Está em gestação uma entente germano-nipónica. No princípio de Setembro um comité de não intervenção constitui-se em Londres, o qual liberta a Sociedade das Nações das suas responsabilidades no caso espanhol.

Mas aviões Junker e Caproni levavam as tropas marroquinas de Franco para a Espanha e aparelhos hitlerianos transportavam bombas e munições para as tropas fascistas de Franco.
Em Outubro, o pedido do governo soviético (que estava representado no comité de não intervenção) de um controlo internacional sobre os portos portugueses e espanhóis foi rejeitado. Em face desta atitude, o governo soviético deixou de se considerar obrigado a respeitar o acordo de não intervenção. Ciano e Ribbentrop – ministros dos Negócios Estrangeiros da Itália e da Alemanha – reconhecem o governo de Franco em Burgos. Nos primeiros dias de Novembro as tropas de Franco estão às portas de Madrid. Nessa altura, na frente dos exércitos republicanos aparecem os primeiros canhões e carros soviéticos, 25 aviões Ilyuchine chegaram no fim de Outubro com as suas tripulações. Entretanto, Maiski, delegado soviético em Londres, diz: “a não intervenção é uma ficção que esconde o auxílio prestado aos rebeldes franquistas, e é por isso que o governo soviético só vê uma saída para a situação que se criou: dar ao governo de Espanha os direitos e as possibilidades de comprar armas fora de Espanha, direitos e possibilidades de que gozam todos os governos na hora que passa.”

Os povos emocionados compreendiam o significado desta prova de força em que se defrontavam pela primeira vez o fascismo e a democracia.(1) Não era apenas a Espanha que estava em causa. Em Madrid jogava-se a sorte de Paris e Varsóvia, de Viena e Copenhaga.
Para o abastecimento do povo espanhol, os barcos soviéticos eram forçados a percorrer um longo caminho desde os portos do Mar Negro aos de Espanha, pelo Mediterrâneo, sem qualquer escolta de protecção. A fim de tal evitar, o auxílio à Espanha deveria fazer-se em barcos franceses ou pela fronteira francesa, o que raramente acontecia devido ao não consentimento do governo francês. A falta de material de guerra vai lentamente destruindo o equilíbrio das forças em Espanha em proveito dos franquistas. A U.R.S.S para tentar mantê-lo dá os seus barcos e os seus homens: no dia 14 de Dezembro um submarino italiano afunda um transporte soviético, o Konsomol, ao largo da costa africana, facto que não ficará isolado. No entanto, desde o início da guerra de Espanha que tropas alemãs e italianas operam lado a lado com os franquistas. Em Maio de 1937 o couraçado Deutschland faz fogo sobre aviões da República Espanhola. A esquadra alemã bombardeia a cidade aberta de Almeria. Guernica é totalmente destruída. No princípio de Outubro dois barcos soviéticos transportando auxílio aos republicanos espanhóis são afundados por submarinos italianos.

O comité de não intervenção, em nome do pacifismo, mostra-se partidário de todas as concessões à Alemanha nazi. No dia 11 de Março de 1938 o exército alemão entra em território austríaco. Nem a Inglaterra nem a França protestarão. Nem Mussolini, pois entretanto já se formara o eixo Roma-Berlim-Tóquio. Começa a época das perseguições nazis anti-semitas em Viena e da agitação patronal dos Sudetas a favor do partido nazi. Ingleses e franceses esforçam-se por conseguir um compromisso em Praga. No dia 12 de Setembro Hitler em Nuremberga exclama: “O Todo-Poderoso não criou sete milhões de checos para que oprimam três milhões e meio de alemães dos Sudetas!”. E faz marchar tropas para o Reno, concentrando-as na Áustria e nas fronteiras da Checoslováquia. O governo checoslovaco capitula.

A França e a Grã-Bretanha continuam a praticar uma diplomacia duvidosa e, sem se afastarem completamente da União Soviética, vão fazendo acordos com Hitler. Em 6 de Dezembro é assinada uma declaração franco-alemã, que reconhece “solenemente como definitiva” a fronteira entre a França e a Alemanha. E vão caindo de concessão em concessão, convencidas que abandonando a URSS desviarão delas próprias a ameaça de uma agressão nazi.

No princípio de 1939 combates encarniçados prosseguem em Espanha. Tropas italianas entram na Catalunha e Barcelona cai nos primeiros dias de Fevereiro. Juntamente com as tropas franquistas aproximam-se da fronteira francesa e o governo de Daladier (socialista) abre campos de concentração para os republicanos espanhóis que fogem para França. Este país envia a Burgos um representante do governo para iniciar conversações com Franco. A pressa e interesse da França em reconhecer legalmente o governo de Franco põem fim à política de não intervenção.

Na sua intenção de refrear as ambições dos agressores em potência – a Alemanha hitleriana e a Itália fascista de Mussolini – a URSS desenvolvia uma grande actividade política e diplomática, da qual se destaca: em 1933, a proposta, na Conferência sobre o Desarmamento em Genebra, de um projecto de desarmamento internacional no qual fosse definido o conceito de agressão; em 1934, a proposta de um acordo regional relativo à defesa mútua contra uma agressão alemã, com a participação da Bélgica, França, Checoslováquia, Polónia, Lituânia, Letónia, Estónia e Finlândia; em 1935, a conclusão de um tratado com a França e a Checoslováquia sobre ajuda mútua, que, entretanto, perdera toda a sua razão de ser com os acordos de Munique assinados em 30 de Setembro de 1938 pela Alemanha, Itália, Grã-Bretanha e França, através dos quais foi entregue à Alemanha uma parte da Checoslováquia – a região dos Sudetas. Em seguida esforçou-se igualmente por concluir a tempo, em especial com a França e a Grã-Bretanha, um acordo militar e político contra a Alemanha nazi, contra os seus preparativos de guerra e de agressão que cada vez mais evidentes se tornavam. Mas nessa época os meios governamentais destes países não estavam nisso interessados. Foi pois em vão que nos anos 30 o governo soviético submeteu com insistência às potências ocidentais propostas concretas para a constituição de um sistema de segurança colectiva na Europa e para uma acção comum contra os agressores fascistas (F.L. Shumam: Soviet Politics. At Home and Abroad, Nova Iorque 1947, pag. 282). É, assim, irrefutável que a coligação anti-hitleriana poderia e deveria ter nascido muito antes de 1941. Porém, as potências ocidentais agarravam-se ainda, numa altura em que o perigo era já eminente, à sua política de “apaziguamento” face à Alemanha de Hitler, mantendo a convicção de que poderiam desviar o seu desejo de agressão, que englobava igualmente o ocidente, unicamente na direcção de Leste, contra a União Soviética. E isso prova-o claramente a imprensa da época. Foi sem disfarces, inúteis aliás, que a revista britânica “New Statesman and Nation” descreveu na época o motivo principal desta atitude: “Se pudéssemos persuadir a Alemanha de dirigir a sua expansão não para o ocidente mas para o leste, nada teríamos a temer nem do bolchevismo nem da guerra” – citado em “Neue Zeit”, nº. 36/80, pag. 28. O governo dos Estados Unidos, que estava sem dúvida ao corrente dos planos agressivos da Alemanha fascista, aprovava a “política de “não intervenção” conduzida por Londres e Paris na esperança que “a França, a Inglaterra e a América possam manter-se neutras até que o fascismo e o comunismo se destruam um ao outro” – (F.L. Shumam: Soviet Politics. At Home and Abroad, Nova Iorque 1947, pag. 282).

Tudo se passa como se Hitler tivesse esperado pela queda da República Espanhola para se lançar na sua política de conquista, que arrastará os governantes ocidentais para o abismo, aceitando tudo, recuando sempre perante a agressividade das hordas hitlerianas, com o intuito, nem sempre disfarçado, de que a Alemanha atacasse e destruísse o poder soviético. É Churchill que o dirá mais tarde: “(…), a Rússia soviética tornara-se um perigo mortal para o mundo livre”. E em 1954, perante os seus eleitores de Woodford, referindo-se ao tempo de guerra, diz que dera ordem “quando os alemães se rendiam às centenas de milhares ao marechal de campo Montgomery, para que reunisse com cuidado as armas alemãs e as armazenasse a fim de que pudessem facilmente ser distribuídas aos soldados alemães que teríamos de utilizar se o avanço soviético continuasse”. Por isso “era preciso deter a sua marcha para ocidente” afirmou ainda, referindo-se à marcha dos exércitos soviéticos quando, após expulsar os nazis do seu território, continuaram descendo para o Ocidente, libertando os povos que sofriam a repressão feroz da servidão hitleriana.

Tirocinado o seu poder militar em Espanha e conhecedor da tolerância dos governantes ocidentais, Hitler, pondo em prática o “plano Weiss” (como já exposto no início), ataca a Polónia no dia 1 de Setembro de 1939. No dia 3 de Setembro os Estados Unidos proclamaram-se independentes no conflito. A França e a Inglaterra declararam guerra à Alemanha. Apesar disso a sua passividade manteve-se. Atitude que consentiu que em Abril de 1940 os exércitos hitlerianos ocupassem a Dinamarca e a Noruega; em Maio entrassem na Bélgica, Holanda e Luxemburgo e invadissem a França, descendo até Bordéus. Enquanto a Alemanha estava toda entregue à conclusão da derrocada francesa, o Exército Vermelho chega á foz do Danúbio para protecção das suas fronteiras nesta região. Então Hitler manda avançar os seus exércitos para a Finlândia, Bulgária, Jugoslávia, Roménia, Turquia. Estava-se no mês de Julho de 1940. Jodl, chefe do Estado Maior do alto comando das forças armadas do Reich, escreve que “os territórios do Leste terão efectivos mais poderosos nas próximas semanas … Estes agrupamentos não devem dar a impressão à Rússia de que nos preparamos para uma ofensiva no Leste …”. E no entanto em 23 de Agosto do ano anterior (1939) a Alemanha tinha assinado um tratado de não-agressão com a União Soviética, válido por dez anos.

Setembro foi o mês da “batalha de Inglaterra”. Os ataques aéreos constantes, os grandes bombardeamentos de Londres, coincidem com concentrações de barcos nos portos alemães, na Holanda e na Bélgica, com exercícios espectaculares de embarques e desembarques, observados passo a passo pela aviação britânica. Tudo isto mantinha a Grã-Bretanha sob uma enorme tensão. Mas a invasão nunca será tentada. Churchill escreveu a este respeito: “De facto, nesta data, Hitler tinha já voltado os seus olhares para o lado Leste”. Nos primeiros dias de Outubro, as tropas alemãs na Roménia fixaram-se em Bucareste e ao largo do Danúbio, sob o pretexto de defenderem esta região contra uma eventual invasão britânica. Hitler, desejoso de manter, ainda, a aparência de boas relações germano-soviéticas, nem se opõe a uma ratificação da fronteira do Danúbio em conversações com o representante da URSS. Porém, a 5 de Dezembro (1940), o general Halder, num relatório apresentado a Hitler, declarava que “o objectivo mais importante é impedir que os Russos possam retirar-se mantendo uma frente contínua. O avanço em direcção a Leste será combinado de tal maneira que a aviação russa não possa atacar o território do Reich alemão e, por outro lado, a aviação alemã tenha possibilidades de empreender ataques aéreos de destruição sobre as regiões da indústria de guerra russas. Desta maneira, seremos capazes de aniquilar por completo o exército russo e impediremos que ele possa renascer”.

Em 3 de Fevereiro de 1941, numa conferência de imprensa de chefes militares alemães para se verificar o estado de preparação dos planos “Tournesol” (expedição de Rommel em África) e “Barba Roxa” cujo objectivo principal era a conquista dos Estados bálticos e de Leninegrado, Hitler declarou: “Quando ‘Barba Roxa’ começar, o mundo ficará sem respiração e calar-se-á”. Neste mês a concentração alemã na Roménia elevava-se a 4 milhões de soldados. Em Março é ocupado pelos nazis o território continental da Grécia. Os italianos atacam a Albânia. Em Maio, um memorando redigido por um comandante da Wermacht nazi começa por estas palavras: “A guerra pode continuar se todas as nossas forças armadas forem alimentadas pela Rússia durante o terceiro ano. Não há nenhuma dúvida de que, se tomarmos neste país as coisas que nos são necessárias, daí resultará a fome e a morte de um milhão de pessoas”.

Às 4 h do dia 22 de Junho de 1941, Ribbentrop, MNE da Alemanha, entregava ao embaixador soviético em Berlim uma declaração de guerra.

O carácter repentino e devastador do ataque da Alemanha é o resultado da longa preparação da invasão da URSS pelos exércitos nazis, enquanto a diplomacia hitleriana mentia, dissimulava, intrigava, atraiçoava, com a colaboração dos governos ocidentais. Hitler tinha enviado para a frente leste 152 divisões, 19 de tanques e 14 motorizadas, 70% do exército de terra, ao todo mais de 5.600.000 homens. Juntamente com finlandeses, búlgaros e romenos são 190 divisões. Mais de 3.100 aviões alemães atacam no primeiro dia 70 aeródromos fronteiriços, destruindo 1.200 aparelhos soviéticos. Senhor do ar, o inimigo nazi penetra profundamente no território soviético. A máquina de propaganda nazi repetia: “Mata todos os russos, soviéticos, não te detenhas ante um velho, uma mulher ou uma criança… mata”, “Os russos devem morrer para que nós possamos viver”.

Entretanto, os ingleses esforçavam-se por convencer os americanos que “era preciso enviar a maior quantidade possível de material ao abrigo do Acordo Empréstimo e Arrendamento para a Grã-Bretanha e a menor possível para a União Soviética”.

No dia 12 de Julho, os blindados alemães fazem a sua aparição nas ruas de Leninegrado. Em pouco tempo as comunicações terrestres com esta cidade ficam cortadas, só se conseguindo lá chegar por ar ou através do lago. No dia 8 de Setembro mais de 600 bombas incendiárias são atiradas sobre Leninegrado provocando 178 incêndios e, durante a noite, 40 bombas de 250 a 500 quilos martelam a cidade. O predomínio esmagador do assaltante faz que a resistência até à morte, os combates de retardamento, os sacrifícios individuais, sejam o dia-a-dia dos heróicos habitantes de Leninegrado. O frio, que no inverno de 1941/42 chegou a uma temperatura de 30 graus negativos, e a fome mataram milhares de habitantes.

Mas, em Janeiro de 1942, as forças soviéticas são pouco mais ou menos iguais às 183 divisões do adversário fascista, com a vantagem numérica dos tanques e da aviação. Esta viragem tem uma causa: a planificação socialista. “Durante o mês de Março de 1942 a produção da indústria de guerra atingiu, somente nas regiões de leste, o nível que era o de todo o território soviético no princípio da guerra nacional”, escreveu o presidente do Gosplan, N.A. Voznessienski. Contudo e por isso mesmo, a abertura de uma segunda frente na Europa Ocidental que teria apressado a derrota dos exércitos hitlerianos e poupado milhões de vítimas e destruições materiais monstruosas, é retardada. No dia 8 de Junho de 1942, Churchill numa carta ao general Ismay (2) põe este princípio: “Nada de desembarques importantes em França, a não ser que os Alemães estejam desmoralizados com um novo fracasso na Rússia”, o que queria dizer que não haveria segunda frente europeia enquanto a situação no Leste não se clarificasse. É Churchill ainda que diz a Roosevelt em Washington neste mesmo mês: “não deve haver desembarque em França este ano”.

Todavia, decorrido menos de um mês sobre o traiçoeiro ataque militar dos exércitos nazis à URSS, Estaline, numa mensagem pessoal a Churchill, datada de 18 de Julho de 1941, escrevia: “Parece-me (…) que tanto a posição militar da União Soviética como a da Grã-Bretanha melhorariam substancialmente se fosse estabelecida uma frente contra Hitler a ocidente (Norte da França) e a norte (no Árctico)”. Desenvolvendo em seguida com objectividade a sua opinião.

Numa outra mensagem pessoal enviada em 3 de Setembro de 1941, também a Churchill, Estaline dizia: “Os alemães consideram a ameaça a oeste apenas um bluff e assim, deslocam impunemente todas as suas forças do ocidente para o leste, sabendo que não existe segunda frente no ocidente nem é provável que se forme uma”.

Em Julho de 1942 dá-se o primeiro bombardeamento massivo de Estalinegrado. Várias centenas de aviões nazis, executando mais de 2.000 voos, lançam aos milhares bombas incendiárias e explosivas. A cidade está em chamas. Os bombardeamentos visam directamente escolas, museus, hospitais, teatros, casas. No Volga, com os reservatórios incendiados, o petróleo corre em chamas pelo rio, os desembarcadouros e os barcos são também destruídos pelo fogo. Mas a aviação soviética e a defesa antiaérea destruíram mais de 90 aparelhos inimigos. Em 3 dias há mais de 2000 mortos e feridos, vários milhares de edifícios são queimados ou destruídos directamente; ficam inutilizadas as canalizações de água, as linhas fortificadas, as estações telefónicas e ferroviárias e os embarcadouros; o parque de carruagens e de locomotivas é aniquilado. Até ao Outono, na direcção de Estalinegrado estiveram concentrados mais de um milhão de soldados nazis. Na batalha do Volga, os exércitos de Hitler perderam cerca de 1 milhão e meio de soldados, 500 mil tanques e canhões de assalto e 3 mil aviões. Mais tarde, na batalha de Kursk, os hitlerianos perderam mais de 500 mil homens, 1500 tanques, 3500 aviões, 3000 canhões.

Entretanto Churchill, numa carta dirigida a Estaline, recebida a 18 de Julho de 1942, após desenrolar largas dificuldades na continuação do auxílio militar à URSS, concluía em certo momento: “(…) tornar-se-ia impossível a constituição de uma segunda frente em 1943”. Porém, um mês antes (10.6.1942), num memorando entregue a Molotov, ministro dos Negócios Estrangeiros da União Soviética, declarava: “Por fim, e mais importante do que tudo o mais, estamos a concentrar o nosso máximo esforço na organização e preparação de uma invasão em grande escala do continente europeu pelas forças anglo-americanas em 1943. Não estamos a pôr limites às tarefas e objectivos desta campanha, que será efectuada, a princípio, com mais de um milhão de homens, ingleses e americanos e com forças aéreas adequadas.”

À longa missiva do 1º Ministro Britânico, de 18.7.1942, atrás referida, Estaline respondeu com uma breve enérgica mensagem, expedida em 23 de Julho de 1942, da qual transcrevo alguns passos: “… Verifiquei, em primeiro lugar, que o governo britânico recusa continuar a enviar fornecimentos de material bélico à União Soviética pela zona setentrional; em segundo, que, a despeito do comunicado anglo-soviético sobre a adopção de medidas urgentes para a abertura de uma segunda frente em 1942, o governo britânico pretende retardar a operação para 1943”. Em relação ao primeiro assunto, acrescentava mais adiante Estaline: “(…) nunca teria imaginado que o governo britânico nos negasse o envio de material bélico, precisamente no momento em que a União Soviética dele tem maior necessidade devido à grave situação na frente russo-alemã”. Quase a finalizar a sua mensagem a Churchill, Estaline declarava: “No que diz respeito ao segundo ponto, o da abertura de uma segunda frente na Europa temo que a questão esteja a tomar um aspecto desagradável. Desejo sublinhar energicamente que, devido á situação na frente russo germânica o governo soviético não pode tolerar que a abertura de uma segunda frente na Europa seja retardada para 1943”.

Em 17 de Janeiro de 1943, meio ano passado sobre a citada carta de Churchill, este e Roosevelt, dirigindo-se a Estaline, escreviam, após sintetizarem a sua intenção no respeitante à guerra no Pacífico: “Não podemos, porém, permitir que as nossas ofensivas contra o Japão ponham em perigo a nossa capacidade de aproveitar qualquer ocasião que possa apresentar-se para uma completa derrota da Alemanha em 1943”.

Gozando da política premeditada dos Estados ocidentais de não abrirem uma segunda frente na Europa, os nazis concentraram um quinto da sua infantaria e cerca de um terço dos exércitos blindados contra Estalinegrado. Mas, em Fevereiro de 1943, o Exército Vermelho cercou e destruiu 22 divisões hitlerianas, ou seja, 330.000 soldados e oficiais, incluindo alguns generais. Só em Dezembro/Janeiro de 42/43 destruiu mais de mil aviões nazis.
Esta vitória marcou o princípio da derrota do domínio hitleriano na Europa.

O Exército Soviético, constituído em várias frentes, inicia o seu vertiginoso caminho para a Europa ocidental, varrendo o criminoso domínio hitleriano do seu território e libertando os povos subjugados ao nazi-fascismo. Em Julho de 1943 os Aliados entram em Roma. A ofensiva soviética tornara difícil qualquer iniciativa imediata dos alemães na Itália. A 13 de Outubro a Itália declara guerra à Alemanha.

A segunda frente europeia, formada pelos exércitos dos países do ocidente, só será aberta no princípio de Junho de 1944 quando Churchill se convenceu que o seu grande desejo se gorara: “que os nazis e os comunistas se destruíssem uns aos outros.”

Em Julho de 1944 o Exército Soviético entra na Polónia. No dia 23 constitui-se o Comité Nacional Polaco de Libertação. No dia 1 de Agosto toda a Bielorrússia está libertada, bem como uma grande parte da Letónia. O Exército Vermelho avança na Polónia e, numa frente de 500 a 1300 quilómetros, progride 500 quilómetros em toda a sua extensão. Vence 80 divisões nazis incluindo o aniquilamento de mais de 30, 160.000 prisioneiros entre os quais 22 generais, 3.000 carros e mais de 600 aviões destruídos, 381.000 mortos. No dia 6 de Agosto atinge as fronteiras da Checoslováquia e da Hungria, sendo libertada no fim deste mês toda a Ucrânia ocidental. Ao entrar na Roménia, o Exército Soviético encontra na sua frente 800.000 soldados romenos e alemães e fortificações poderosas, mas vai destruindo toda a capacidade de resistência do inimigo fascista e caminhando no interior deste país. Entretanto um levantamento popular rebenta em Bucareste no dia 23, derrubando o governo fantoche ao serviço de Hitler. No dia 26 a Roménia pede o armistício e rompe com a Alemanha cuja força aérea bombardeia a capital, mas o exército romeno juntou-se ao Exército Soviético, que no dia 31 é recebido em festa pelo povo em Bucareste. No dia 2 de Setembro o Exército Vermelho atravessa a fronteira romeno-búlgara. O governo Búlgaro hesita. Porém, sob forte pressão popular, corta relações com a Alemanha e declara-lhe guerra. No dia 16 o exército libertador da URSS entrará em Sófia, alcançando em seguida a fronteira da Jugoslávia. Rechaçados em toda a parte, com os povos lutando e festejando heroicamente a sua libertação do jugo nazi-fascista, os alemães concentram forças no que lhes resta da Estónia, nas regiões costeiras da Letónia e da Lituânia, para as utilizar como posição estratégica a fim de tentarem impedir a invasão da Prússia Oriental. Esforços inúteis pois, no princípio de Outubro, toda a Estónia será libertada e da Letónia só lhes restará a região costeira ocidental e Riga que fica cercada com 40 divisões dentro. Riga será conquistada no dia 13.

Entretanto, em Agosto de 1944 dera-se a insurreição de Varsóvia, que durou 63 dias. Potentes forças hitlerianas aniquilam, durante esses dias, 250.000 insurgentes e perdem 26 mil homens.

Uma das frentes do Exército Soviético dirige-se para a Checoslováquia e entra na Hungria Oriental; outra, vinda da Bulgária e da Roménia, chega às fronteiras orientais da Hungria e da Jugoslávia, ameaçando os centros industriais de guerra na região de Budapeste e no sul da Alemanha, bem como as bauxites da Hungria e da Jugoslávia e as regiões petrolíferas búlgaras. Para defender estas fontes de matérias-primas exploradas pelos nazis desde a ocupação daqueles países, Hitler dá ordem para que todas as tropas vencidas na Ucrânia Ocidental, na Roménia e na Bulgária, “que puderem fugir”, se venham concentrar naquela região, e ainda tropas da Grécia, 20 divisões transferidas da França, da Itália e da própria Alemanha – para deterem a marcha meridional do Exército Vermelho. Em vão. No dia 20 de Setembro, e em colaboração com o exército de libertação jugoslavo, o Exército Vermelho entra em Belgrado. A libertação desta cidade provocou a retirada dos alemães da Albânia, onde eram flagelados pelos guerrilheiros.

No Outono de 1944 só a Hungria ainda em guerra continua aliada da Alemanha. O Japão, a partir de Abril, tenta arrastar a URSS para uma paz separada com a Alemanha. Fazendo paralelamente idênticas propostas a Washington e Londres, oferece-se como barreira a leste contra o bolchevismo. Nenhuma destas traiçoeiras propostas é aceite.

Desde há longos meses que a Hungria estava inteiramente ocupada pelos Alemães, a sua capital tornara-se um centro das S.S. . Mas Outubro de 1944 termina com o desencadeamento da ofensiva que irá libertar Budapeste. A resistência nazi dura quase todo o mês de Novembro, ficando aquela cidade, a 26 de Dezembro, completamente sitiada com 180.000 alemães lá dentro. Em 22, a Frente Nacional Húngara da Independência tinha formado um governo provisório constituído por todos os partidos que integravam a Frente que lutara contra o regime hitleriano durante a ocupação. O cerco de Budapeste dura mais de 10 semanas.

Estaline, no 27º. Aniversário da Revolução de Outubro disse: “É certo que sem a segunda frente criada na Europa, e que só por si fixou cerca de 75 divisões alemãs, as nossas tropas não teriam podido destruir, num período de tempo tão curto, a resistência das tropas alemãs e expulsá-las das fronteiras soviéticas. Mas não é menos certo que, sem as vigorosas operações do Exército Vermelho durante este Verão (1944), operações que obrigaram a concentrar na nossa frente perto de 200 divisões alemãs, as tropas dos nossos aliados não poderiam em tão pouco tempo vencer as tropas alemãs e expulsá-las da Itália, da França e da Bélgica”.

Foram os soviéticos que suportaram os combates mais encarniçados pois aos exércitos ocidentais os alemães entregavam-se facilmente. E foram igualmente as grandes vitórias do Exército Vermelho e o seu rápido avanço, que mais uma vez provocaram situações ambíguas e traiçoeiras da parte dos aliados ocidentais. Assim, o avanço soviético nas regiões do Danúbio e dos Balcãs apressou o desejo do governo britânico de limitar o que considerava uma expansão soviética, ordenando às tropas britânicas que entravam pelo sul da Grécia, que atacassem o Exército de Libertação Nacional Grego, quando este perseguia as tropas alemãs que caminhavam para a Hungria. Esta atitude levou Roosevelt a dizer indignado: “As tropas britânicas lutam agora contra as guerrilhas que combateram os Alemães durante 4 anos … Como é que os Ingleses se atrevem a fazer uma coisa destas?”

No entanto, apesar de o grosso das divisões alemães estar na frente leste, o avanço alemão nas Ardenas em meados de Dezembro pôs em perigo os aliados na frente ocidental e Churchill pede com insistência uma ofensiva russa durante esse mês. O tempo não era favorável pois o inverno russo não facilitava tal ofensiva. “Contudo” escrevia então Estaline no dia 7 “considerando a situação dos nossos aliados … o grande quartel-general … decidiu terminar aceleradamente a sua preparação e sem ter em conta o tempo, começar na segunda metade de Janeiro largas operações … ao largo da frente central.” Assim, de 12 a 16 de Janeiro de 1945, 150 divisões soviéticas passaram à ofensiva em toda a extensão da frente, desde o Báltico aos Cárpatos. No dia 21 o Exército Vermelho entra na Silésia e atingindo o rio Oder atravessou em seguida toda a Prússia Oriental. No dia 27 quase todas as forças desta região ficam cortadas da Alemanha, cercadas e fragmentadas. Em Fevereiro, o Exército Vermelho encontra-se a 60 quilómetros de Berlim.

Prosseguindo a sua marcha em todas as frentes, o Exército Soviético liberta a Áustria em Março. Na primeira metade de Abril, o avanço aliado na Alemanha, fortemente ajudado pelas retiradas massivas dos alemães a fim de defenderem Berlim e Viena, faz-se a ritmo acelerado e em meados de Abril o exército americano alcançava e atravessava o rio Elba, chegando a 90 quilómetros de Berlim.

Muito diferente do avanço soviético que esbarrava com uma resistência encarniçada, o avanço a oeste tinha aspectos de passeio militar pois as tropas nazis rendiam-se aos ingleses e americanos às centenas de milhar. O inimigo fascista concentra 1 milhão de homens diante de Berlim. Apesar disso, o Exército Soviético, no dia 20 de Abril, encontra-se na cintura interior das defesas alemãs, abrindo fogo sobre Berlim. No dia 24 a junção de dois exércitos soviéticos torna total o cerco de todas as divisões a sudeste da capital.
Entretanto os nazis tentam uma capitulação separada com os aliados ocidentais, manobra que fracassa.

No dia 25, Berlim fica completamente cercada e as tropas hitlerianas que enfrentavam os americanos no Elba “viram-lhes as costas”, segundo um comunicado da Wermacht, a fim de se dirigirem para a capital, com a intenção de deixarem o caminho livre ao exército americano para que fosse este a chegar primeiro a Berlim. Cartada sem tais consequências pois o exército soviético repele o contra ataque nazi e chega ao Elba, encontrando-se com o exército americano. Este encontro pode considerar-se o apogeu militar da aliança contra o fascismo.

No dia 30, treze divisões alemãs cercadas, perante a enormidade das suas perdas e a impossibilidade de fugirem, rendem-se aos soviéticos. Em Berlim estão ainda mais de 200.000 soldados, 3 mil canhões e 250 tanques. As ordens de Hitler são de “travar a luta com fanatismo, imaginação, por todos os meios de astúcia, de manha, na terra, no ar e no subsolo”. Mas as ordens de Hitler não se resumem ao combate militar. Ele manda também que os túneis do metro, cheios de mulheres, crianças e feridos, sejam inundados.

No dia 29, os soviéticos entram em Berlim. No dia seguinte Hitler suicida-se. Na madrugada de 1 de Maio, Goebbels e Bormann pedem tréguas em Berlim ao comando soviético para negociar um armistício. Respondem-lhes com a exigência de uma capitulação sem condições, o que estes chefes nazis não aceitam. Às 18,30 horas o Exército Vermelho dá o assalto final e as tropas hitlerianas capitulam no dia 2. Goebbels e a mulher suicidam-se depois de terem mandado executar os seus filhos.

As forças americanas atingem o vale do Danúbio e atravessam a fronteira da Checoslováquia. As tropas britânicas atingem e juntam-se às soviéticas. No dia 3 de Maio tomam Hamburgo. Mas todas as tropas da Holanda, do Noroeste da Alemanha, da Dinamarca, rendem-se pura e simplesmente aos Britânicos. Ao sul, os americanos entram na Áustria. As tropas que chegam da Itália juntam-se às que vêm do norte. Franceses e Americanos cercaram e venceram o grupo de exércitos alemães que se estendiam de Linz até à fronteira suíça. No dia 7 de Maio, Doenitz ordena a capitulação sem condições em todas as frentes e no dia seguinte é assinado em Berlim o acto definitivo de capitulação pelos representantes do comando alemão.
No dia 9, às 15 horas em Londres, às 16 em Moscovo e às 9 em Washington, é anunciado simultaneamente pela rádio o “Dia da Vitória na Europa”.

NOTAS.
1) Recordo a minha emoção quando, com 13 ou 14 anos, ouvia os meus familiares ler e comentar as notícias nos jornais ou na Rádio
2) Representante pessoal de Churchill na Comissão dos Chefes do Estado Maior
3) Todos os textos citados da correspondência entre Churchill e Estaline encontram-se em “Correspondência de Guerra I – Churchill/Estaline”, Editorial Arcádia, Lisboa, 1969


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