28 outubro 2014, Pátria
Latina http://www.patrialatina.com.br (Brasil)
BRICS Business Magazine
Diretor-geral da Corporação de Pesquisa e
Produção Uralvagonzavod, Oleg Sienko fala sobre como a Rússia pode trabalhar
com os seus parceiros do Brics para resolver problemas estruturais e até que
ponto as sanções ocidentais colocaram a economia russa em uma situação difícil.
Brics Business Magazine: No
final de setembro, o Banco Mundial publicou três cenários de médio prazo para o
desenvolvimento econômico da Rússia. O melhor deles prevê baixo crescimento do
PIB nos próximos anos. Entre outras coisas, os especialistas do banco apontam
que não será possível obter uma maior aceleração do crescimento econômico simplesmente
a mantendo a atual política de estímulo fiscal. Você concorda com essas
conclusões? Como você avalia a situação atual da economia russa?
Oleg Sienko: Está longe de ser uma questão simples. Já
ficou claro que
as sanções têm causado sérios problemas. É difícil contrapor os
cenários expostos pelos especialistas do Banco Mundial -- não haverá grande
crescimento, especialmente nos pilares da economia.
No entanto, também é certo que o país deve
tomar medidas para estimular a economia, independentemente das limitações
orçamentais. Outros países têm conseguido encontrar seu caminho para sair de
crises semelhantes, injetando dinheiro na economia.
Na minha opinião, há um outro aspecto que é
muito importante neste caso. Se quisermos sair da crise rapidamente, o governo
tem que ser muito mais proativo do que têm sido. Decisões lentas significam que
os esforços para combater a crise deverão ser dobrados.
BBM: Como essa lentidão do governo se manifesta?
OS: Há setores-chave da economia que precisam
de apoio imediato. Nós mesmos criamos alguns desses problemas adotamos leis a
torto e a direita, e agora estamos correndo atrás para superá-las. Por alguma
razão, ninguém parece se preocupar com esse tipo de incoerência política, mesmo
que seja um ponto muito importante. Mas não para por aí. A ajuda do governo não
deve se limitar à injeção de dinheiro na economia; também deve se concentrar em
proteger e preservar o mercado interno. Até agora, tem sido justamente o
oposto. Quando a Rússia aderiu à OMC, quase todo mundo ganhou acesso ao mercado
russo.
Vamos pegar o exemplo da indústria automotiva.
A meta de 50% de localização, que é construída em acordo com as empresas
automotivas no exterior e governa a montagem industrial, ainda é tão
inatingível como sempre foi. Empresas metalúrgicas russas fabricam chapas de
carro, mas elas não são usadas, ou pelo menos não na medida em que poderiam
ser. Por não produzir as peças no mercado interno, deixamos de estimular outros
setores da nossa economia, como a indústria de mineração, metalurgia, o setor
da construção, e a lista continua.
BBM: Você defende uma aproximação entre os países do
Brics, incluindo a criação de uma moeda comum. Por que isso é tão importante? E
qual viável é essa iniciativa?
OS: É totalmente viável. Os países do Brics,
juntos, correspondem a metade da população do planeta, e já deram um importante
passo para a criação de um mecanismo financeiro independente. Refiro-me ao
recente acordo para criar um Banco de Desenvolvimento do Brics e um pool de
divisas de reserva para contrabalançar instituições como o FMI. O próximo passo
lógico seria a criação de uma moeda comum para os países do Brics. Na minha
opinião, essa medida permitiria que os países se afastassem da dependência dos
centros financeiros ocidentais e do dólar americano como principal moeda de
reservas e transações. Este é o passo mais realista, que poderia anunciar a
melhoria econômica em todos os países do grupo, incluindo a Rússia.
BBM: Na sua opinião, qual mecanismo seria necessário para
criar essa moeda?
OS: Os países teriam que escolher uma 'moeda dos
Brics' para todas as transações entre os países do grupo e atrelá-la ao euro
para facilitar a conversão; em seguida, criar centros monetários e de
transação, bem como um sistema de pagamento próprio.
Tenho certeza que muitos países da América
Latina, Sudeste Asiático e África iriam gradualmente usar essa moeda, já que
estão ficando cada vez mais cansados da hegemonia do dólar e euro -- as duas
únicas moedas em que as coisas são compradas e em que os investimentos são
feitos.
Se isso acontecer nos próximos três anos, esse
novo sistema de pagamento global englobaria pelo menos 70% de todos os países,
em termos de população mundial, o que poderia nos livrar do dólar de uma vez
por todas.
BBM: Como é que uma moeda comum do Brics poderia se
diferenciar do dólar ou do euro?
OS: A diferença é que seria apoiada por
ativos e recursos reais - incluindo recursos humanos, naturais e
matérias-primas - nos quais nossos países são ricos. Muito provavelmente, uma
vez que essas medidas forem introduzidas, o mundo ficará dividido em dois
grupos: o “progressista”, que incluiria países dos Brics e os mercados
emergentes alinhados a eles; e os “pessimistas”, que incluiria os Estados
Unidos, a Europa e os países associados a eles.
É por isso que criar a nossa própria moeda é um
passo vital. Quanto mais cedo ocorrer, maiores serão os avanços no nosso
desenvolvimento econômico e melhores as nossas chances de construir uma aliança
poderosa e independente para contrabalançar os EUA.
BBM: Você poderia resumir os principais passos
que a Rússia e demais países devem tomar para compensar as consequências das
sanções e para levar suas economias para um novo nível tecnológico?
OS: Como eu disse antes, o primeiro passo
seria a criação de uma moeda comum. O segundo seria remontar a nossa base
tecnológica em conjunto com nossos parceiros. Nem todas as tecnologias
importantes estão disponíveis nos países que introduziram sanções contra nós.
Além disso, há países no Ocidente que adotaram uma perspectiva mais sóbria;
eles têm as tecnologias que precisamos, mas não possuem matérias-primas.
Precisamos negociar e encontrar maneiras de alcançar e explorar as
oportunidades de benefício mútuo. Claro que também precisamos construir
tecnologias por nós mesmos.
Enfim, o terceiro passo está relacionado a
infraestrutura, e talvez esta seja a área mais importante. O desenvolvimento de
infraestrutura estimularia outras indústrias, porque é a base sobre a qual tudo
é construído - do prego à parte mais complexa de qualquer equipamento. Para que
isso aconteça, precisamos adotar uma nova maneira de pensar e começar a lidar
com essas questões. Precisamos fazê-lo imediatamente, e não procrastinar
hábitos como de costume.
Publicado originalmente pela BRICS Business Magazine
http://br.rbth.com/economia/2014/10/27/proximo_passo_logico_e_a_criacao_de_uma_moeda_comum_para_os_brics_28013.html
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