24 abril 2014, ODiário.info http://www.resistir.info (Portugal)
Um texto noticioso com interessante
leitura nas entrelinhas. A
convergência de interesses entre a grande industria alemã e a Rússia - e também
a China - é bem conhecida e muito importante no desenrolar da situação
presente. Se “a guerra é a continuação da política por outros meios”, devemos
igualmente recordar a afirmação de Lénine de que “a política é economia
concentrada”.
Os grandes patrões alemães estão à beira da crise de nervos. A
crise que opões a União europeia e os Estados Unidos à Rússia ameaça os
negócios pacientemente desenvolvidos num país onde a lógica política perturba
muito frequentemente as regras do “business”. Em 2013 a Alemanha vendeu
produtos e serviços à Rússia no valor e 67 milhares de milhões de euros, ou
seja, mais 10% do que em 2012. Para além disso, as 30 empresas do DAX – o
índice bolsista alemão – empregam aí 46 000 pessoas. “Perante a deterioração da
situação, as empresas alemãs receiam muito que a UE venha a curto prazo impor
sanções económicas ainda mais duras à Rússia”, lamenta-se o secretário-geral
das Câmaras do comércio e da indústria alemãs, Martin Wansleben.
Putin reabilitado
O receio é tal que, desde há um mês, os grandes patrões alemães se
lançaram numa operação de comunicação e de diplomacia “paralela” destinada
tanto a restabelecer o diálogo com Moscovo como a descredibilizar a política de
sanções de Bruxelas e Washington.
“Não temos a intenção de inflectir a nossa
estratégia de longo prazo por causa de turbulências de curto prazo”, afirmava
ainda há pouco o patrão do gigante Siemens, Joe Kaeser. Este, que aparentemente
reduz a crise na Crimeia a uma simples intempérie, vinha na ocasião de um
encontro com Vladimir Putin em pessoa. “Com luz verde da Chancelaria”,
acrescentava aos jornalistas.
Kaeser deverá ser em breve seguido pelo patrão dos
caminhos-de-ferro alemães Rudger Grube que, oficialmente, irá defender em
Moscovo um projecto de ligação ferroviária. Grube conta igualmente com a bênção
da Sr.ª Merkel, que não quer que as relações com a Rússia “se rompam”.
Perante a opinião pública nacional, a posição da economia alemã
face ao urso russo está bem resumida no vibrante apelo à clemência lançado em
Março por Gabor Steingart, patrão do “Handelsblatt”, o maior diário económico
alemão. “Des-indignem-se! O presidente russo Vladimir Putine não é o infame
agressor que o Ocidente descreve”, explicava na primeira página este influente
formador de opinião. Para ele, Vladimir Putine é o único homem capaz de
garantir a estabilidade daquilo que foi outrora o “bloco de leste”. Seria
portanto “estúpido” e “destinado ao fracasso” aplicar-lhe sanções económicas.
A estratégia “subterrânea” dos patrões transita através dos
poderosos lobbies que são o Fórum germano-russo e a “Comissão-leste da economia
alemã”. Apoia-se igualmente em veneráveis figuras políticas como os
ex-chanceleres social-democratas Helmut Schmidt e Gerhard Schroeder.
Expansão para leste
Schmidt considera que a atitude de Putin em relação à Crimeia é
“completamente compreensível”. Coloca mesmo em dúvida, aliás, a noção de “nação
ucraniana”. Posições que são inteiramente partilhadas por Schroeder, velho
amigo de Putin e grande promotor do gasoduto Nord-Stream entre a Rússia e a
Alemanha.
Apesar do recente anúncio da chancelaria alemã de que pretende tornar o país menos dependente do gás russo, “a Alemanha não tem qualquer desejo de se afastar da Rússia. Existe mesmo a vontade de reforçar ao máximo a imbricação económica dos dois países. Trata-se do desenvolvimento da estratégia de integração a leste elaborada e seguida desde Kohl e Schroeder”, lembra Ewald Bocks, perito na questão russa do DGAP, um dos principais “think tanks” alemães de política externa.
O problema é que esta estratégia, centrada essencialmente na
aproximação económica, se preocupou pouco com os dados da geopolítica. Hoje, o
conflito ucraniano está iminência de a desfazer em estilhaços.
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