Vermelho / Editorial do dia 23 de junho de 2007
O mínimo que se pode dizer do telefonema do primeiro ministro Tony Blair para o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, na tarde do dia 22, é que foi insólito. Demissionário, entre a limpeza de uma gaveta e outra - ele vai deixar o governo, pressionado pela impopularidade de seu mandato, na próxima semana - o dirigente britânico encontrou tempo para ligar para Lula e pressioná-lo a abrir o mercado brasileiro de produtos industriais, para "salvar" a Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).
O pretexto do telefonema de Blair foi o fracasso da reunião realizada em Potsdam, na Alemanha, do chamado G-4, grupo que reúne Estados Unidos, União Européia, Brasil e Índia, para destravar as negociações e avançar rumo a um acordo para regular o comércio mundial. Mas o impasse continuou; sem chance de chegar a um acordo favorável e esbarrando na intransigência dos países ricos, os representantes do Brasil e da Índia afastaram-se das negociações, proclamando a morte do G-4, grupo que, desde 2001, busca uma saída entre as pressões dos países ricos pela abertura dos mercados do chamado "terceiro mundo" a seus produtos industriais e a demanda dos países pobres por um maior acesso dos produtos agrícolas aos mercados europeu e norte-americano.
Há um conjunto de fatores, econômicos e políticos, envolvidos na questão. Os países ricos querem mais mercados para suas indústrias e, ao mesmo tempo, proteger a prosperidade de seus agricultores. Os emergentes, ao contrário, precisam - como disse o ministro indiano de Comércio, Kamal Nath - proteger a sobrevivência de seus camponeses. E, ao mesmo tempo, garantir regras capazes de fortalecer sua própria indústria e torná-la competitiva no mercado mundial.
Esta é a contradição econômica que aparece, nesse cenário, enlaçada com o jogo de poder mundial. A insistência dos países ricos em abrir os mercados dos países emergentes para suas indústrias, em troca de algumas migalhas concedidas à agricultura do "terceiro mundo", desde que não ameacem os agricultores europeus e norte-americanos, mal esconde a ambição de manter o status quo mundial intocado, com sua assimétrica distribuição de poder (que favorece o chamado Norte, os ricos, em detrimento do Sul, os pobres) e com uma divisão de trabalho entre as nações que vai sendo superada pela industrialização de países como China, Brasil, Índia, México, África do Sul, entre outros.
O mínimo que se pode dizer do telefonema do primeiro ministro Tony Blair para o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, na tarde do dia 22, é que foi insólito. Demissionário, entre a limpeza de uma gaveta e outra - ele vai deixar o governo, pressionado pela impopularidade de seu mandato, na próxima semana - o dirigente britânico encontrou tempo para ligar para Lula e pressioná-lo a abrir o mercado brasileiro de produtos industriais, para "salvar" a Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).
O pretexto do telefonema de Blair foi o fracasso da reunião realizada em Potsdam, na Alemanha, do chamado G-4, grupo que reúne Estados Unidos, União Européia, Brasil e Índia, para destravar as negociações e avançar rumo a um acordo para regular o comércio mundial. Mas o impasse continuou; sem chance de chegar a um acordo favorável e esbarrando na intransigência dos países ricos, os representantes do Brasil e da Índia afastaram-se das negociações, proclamando a morte do G-4, grupo que, desde 2001, busca uma saída entre as pressões dos países ricos pela abertura dos mercados do chamado "terceiro mundo" a seus produtos industriais e a demanda dos países pobres por um maior acesso dos produtos agrícolas aos mercados europeu e norte-americano.
Há um conjunto de fatores, econômicos e políticos, envolvidos na questão. Os países ricos querem mais mercados para suas indústrias e, ao mesmo tempo, proteger a prosperidade de seus agricultores. Os emergentes, ao contrário, precisam - como disse o ministro indiano de Comércio, Kamal Nath - proteger a sobrevivência de seus camponeses. E, ao mesmo tempo, garantir regras capazes de fortalecer sua própria indústria e torná-la competitiva no mercado mundial.
Esta é a contradição econômica que aparece, nesse cenário, enlaçada com o jogo de poder mundial. A insistência dos países ricos em abrir os mercados dos países emergentes para suas indústrias, em troca de algumas migalhas concedidas à agricultura do "terceiro mundo", desde que não ameacem os agricultores europeus e norte-americanos, mal esconde a ambição de manter o status quo mundial intocado, com sua assimétrica distribuição de poder (que favorece o chamado Norte, os ricos, em detrimento do Sul, os pobres) e com uma divisão de trabalho entre as nações que vai sendo superada pela industrialização de países como China, Brasil, Índia, México, África do Sul, entre outros.
O ministro Celso Amorim, das Relações Exteriores, indicou esta contradição ao criticar as pressões do diretor da OMC, Pascal Lamy, por maiores concessões por parte dos países em desenvolvimento. "Às vezes", disse Amorim, "sinto uma ambição excessiva a respeito dos países em desenvolvimento. No fim das contas, esta é uma Rodada para o desenvolvimento e não contra o desenvolvimento".
O hegemonismo industrialista dos países ricos fica cada vez mais claro nas negociações mundiais sobre o comércio. E, ao mesmo tempo, cada vez mais inaceitável para os países que buscam construir seu próprio desenvolvimento. No Brasil, particularmente, é uma situação complexa. Os países ricos exigem a redução das tarifas sobre a importação de produtos industrializados, que eles fabricam. Hoje, a tarifa máxima é de 35%; eles querem que ela seja reduzida para menos da metade, para 12,73%. Com isso, 3.437 ítens industriais (dos 8.800 negociados) seriam gravemente afetados, praticamente inviabilizando sua produção no Brasil, principalmente nos setores da eletrônica e da informática.
Se exigências dessa natureza forem atendidas, elas fragilizariam ainda mais a indústria brasileira, já severamente ameaçada pela política cambial e pela valorização do real, que derruba o preço dos produtos importados e encarece os fabricados aqui. A ameaça de desindustrialização é real, e apontada por vários especialistas. Luís Moura, do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos, por exemplo, diz que "várias indústrias estão sendo afetadas no Brasil por causa da baixa do dólar”. Newton de Mello, presidente em exercício da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), considera que “diminuir mais a proteção alfandegária aos produtos industriais brasileiros seria, neste momento, medida desastrosa, que estimularia ainda mais o ingresso de produtos importados, acelerando o processo de desindustrialização em curso”. E o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP) e do Conselho de Política Industrial da CNI, Rodrigo da Rocha Loures, dramatiza a questão ao perguntar: "Será que realmente queremos nos especializar somente em produtos primários e commodities para os quais contamos com vantagens comparativas? Vamos abrir mão da diversificada base produtiva industrial construída ao longo de décadas?"
Este é o ambiente que torna insólita a iniciativa de Tony Blair usar o telefone para pressionar Lula pela abertura do mercado brasileiro para a indústria dos ricos. E a resposta do presidente brasileiro não podia ser senão a defesa da posição brasileira e a recusa em aceitar a pressão. Lula destacou a intransigência da Europa e dos EUA observando que querem "acomodar seus próprios interesses defensivos em agricultura” e ao mesmo tempo pedem “contribuição desproporcional dos países em desenvolvimento no que diz respeito aos bens industriais". E, nestas condições, para Lula, qualquer negociação só pode ser levada adiante num encontro que reúna os líderes mundiais para encontrar uma solução política, e não meramente técnica, para a questão.
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