segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Timor-Leste/Nomeação de Xanana Gusmão provoca protestos

Dili, 6 Agosto 2007 - O Presidente de Timor-Leste, José Ramos-Horta, convidou hoje Xanana Gusmão, líder do CNRT, para formar o novo governo, cuja posse anunciou que ocorrerá quarta-feira. A noticia provocou manifestações de protesto no país.

A Fretilin ficou em primeiro lugar nas eleições com 29% dos votos e, de acordo com a Constituição, tem o direito de formar governo, apesar de não contar com uma maioria absoluta. Contudo, José Ramos-Horta, que recebeu apoio de Xanana Gusmão para ser eleito presidente, em Maio, optou por ajudar o seu aliado a se tornar primeiro-ministro.

Xanana Gusmão é o presidente do Congresso Nacional da Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), que ficou em segundo lugar nas eleições parlamentares de 30 de Junho, com 23% dos votos. Este partido integra a Aliança para Maioria Parlamentar (ANP), formada após a consulta popular. Uma interpretação largamente contestada da Constituição, feita por Jose Ramos-Horta, colocou no centro do poder um partido que recebeu apenas um quarto dos votos do eleitorado.

«É, não tenho dúvidas, um golpe de estado constitucional», acusou o ex-primeiro-ministro e secretario-geral da FRETILIN, Mari Alkatiri, em conferência de imprensa realizada antes da divulgação da decisão de José Ramos-Horta. «Há dois anos que eu avisei que o golpe ia acontecer», acrescentou.

No encontro com os jornalistas, a FRETILIN anunciou que «não cooperará com um governo empossado à margem da Constituição» de Timor-Leste e «combaterá por vias legais a usurpação do poder».

A declaração da FRETILIN foi lida pelo presidente do partido, Francisco Guterres «Lu Olo» acompanhado por Mari Alkatiri e por Manuel Tilman, líder da Aliança Democrática, que reúne os partidos KOTA e PPT.

«A Fretilin considera a decisão do presidente da República de convidar o CNRT e seus aliados para formar o governo, uma decisão contrária à Constituição da República Democrática de Timor-Leste e politicamente desrespeitadora das expectativas do eleitorado timorense», diz também a declaração aprovada em reunião da Comissão Política Nacional.

Xanana traidor
A informação de que Xanana Gusmão ia ser convidado para formar o novo governo de Timor-Leste tinha provocado a reacção antecipada em pelo menos dois dos campos de deslocados de Díli, com o ex-Presidente a ser tratado de «traidor».

Cartazes e declarações directas contra Xanana Gusmão, o Congresso Nacional de Reconstrução de Timor-Leste (CNRT) e a Aliança para Maioria Parlamentar (AMP) surgiram nas últimas 24 horas junto ao campo de deslocados do aeroporto, em Comoro, e ao campo do porto de Díli, no jardim diante do Hotel Timor.

Num dos cartazes colocado em Comoro, Xanana é comparado a John Howard e a G.W.Bush, respectivamente primeiro-ministro da Austrália e Presidente dos Estados Unidos. Estes políticos são impopulares em Timor-Leste.

Um cartaz em bahasa indonésio, língua usada em vários dos letreiros erguidos hoje em Comoro, exige a Xanana que «páre o seu plano de guerra» («Stop!!! Konsep Perang», literalmente).

«Deputado Xanana tem que responsabilizar-se pela crise entre "lorosae" e "loromonu"», exige outro cartaz por referência ao conflito que estalou em Abril e Maio de 2006 entre timorenses originários dos distritos ocidentais e orientais do país.

Por ocasião dos conflitos, o então presidente Xanana Gusmão foi acusado de ter organizado os confrontos, que causaram agressões fisicas, incêndios e mortes, tanto na capital como em alguns distritos. Mais de 150.000 pessoas foram obrigadas a abandonar as suas casas.

Um número estimado de 100 mil deslocados continuam a viver em campos ou em residências provisórias na capital e por todo o país, segundo a última actualização, relativa a Julho, divulgada pelo Ministério do Trabalho e da Reinserção Comunitária. Em Díli, há pelo menos 30 mil deslocados.

Crimes de 2006 e outras acusações
Os campos do aeroporto e do porto de Díli estão entre os mais politizados da cidade e acompanham muito de perto a situação política e de segurança da capital e do país. «Os traidores não merecem governar», declarou hoje de manhã uma das responsáveis do campo de deslocados do aeroporto, dizendo falar em nome dos deslocados de toda a cidade. «Queremos justiça para os autores dos crimes de 2006», afirmou Madalena Tilman numa declaração lida à imprensa.

«Não concordamos que o Presidente da República inclua Xanana Gusmão como primeiro-ministro», afirmou a representante dos deslocados, alegando que declarações do ex-chefe de Estado na televisão pública, em 2006, «resultaram em muitas vítimas».

«Não somos tratados como pessoas, mas como projecto dos governantes», acrescentou Madalena Tilman, afirmando que «os deslocados não têm dignidade a viver debaixo de um toldo no seu próprio país».

O mesmo tom contra Xanana Gusmão marca vários cartazes erguidos em Comoro e no centro da cidade, junto aos campos de deslocados que têm demonstrado com frequência posições pró-FRETILIN.

Num deles, a sigla CNRT é desdobrada em «Conselho Nacional da Revolta do Traidor» e «Conselho Nacional da Recolha do Traidor». Um cartaz refere apenas: «Traidor uma vez, traidor sempre».

Os «objectivos» da AMP, de que o CNRT faz parte, são referidos noutro cartaz como «salvar os autonomistas, pisar o povo maubere, sobretudo o mais miúdo, alcançar uma nação capitalista e dar liberdade aos autores da crise». São conhecidos como autonomistas aquelas pessoas que defendiam a anexação de Timor-Leste pela Indonésia. Entre eles se encontram membros de milícias responsaveis pelo assassinato de centenas de pessoas durante a ocupação estrangeira.

Os ataques à pessoa de Xanana Gusmão começaram de forma clara domingo, em frente ao campo de deslocados do porto de Díli, com uma enorme faixa: «O filho do povo maubere precisa de um primeiro-ministro e não de uma pessoa choramingas (»tanis ten«, em tétum) como o irmão grande Xis». (Redação com agências)

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