19 maio 2016, Odiario.info
http://www.odiario.info (Portugal)
55 anos, israelense
natural de Jerusalém, escritor e ativista da paz
Não foi por esquecimento que os media portugueses –
rádios, jornais e televisões – ignoraram a criminosa ocupação da Palestina
pelos sionistas fez dia 15 de maio passado 68 anos. Tinham a agenda, se
quisessem recordar a data. As agendas servem precisamente para isso. Foi um
propósito que os qualifica.
O texto que hoje publicamos, de um escritor
israelense, ativista da luta pela Paz, nascido em Jerusalém, em 1961, é uma
denúncia, do comportamento sionista que o autor compara ao comportamento dos
nazis para com os judeus.
15 de maio de 2016 em
Nova Iorque
Sessenta e oito anos
depois da ocupação da Palestina as pessoas começam a referir-se à violação e à
pilhagem sionistas da Palestina como um “conflito”. É o “conflito
israelo-palestino” ou a “questão” israelo-palestina; alguns até lhe chamam de
“disputa” e outros de “problema”.
Mads Gilbert disse-me
recentemente que se alguém na Noruega se referisse à ocupação alemã da Noruega
como um “conflito” ou “disputa”, seria expulso da sala. Espero que isso se
torne verdade em França ou na Bélgica e até na ilha de Jersey.
Ninguém se referirá à
ocupação alemã, para não mencionar as políticas alemãs para com os judeus sob o
regime nazi, como um conflito. No entanto, ao falarem da Palestina ocupada,
onde a limpeza étnica e o genocídio têm sido uma realidade desde há 68 anos, as
pessoas muitas vezes abstêm-se de usar o termo ocupação – sobretudo relativamente
a 1948, quando a parte do leão da Palestina foi ocupada.
Há duas coisas que não
estamos autorizados a dizer sobre a Nakba palestina. Duas coisas que a
sociedade ocidental “civilizada” acha pouco educadas. A primeira é
comparar ou
simplesmente justapor a experiência judaica sob o regime nazi à experiência
palestina sob o regime sionista. A segunda é afirmar que a experiência
palestina é um genocídio lento e metódico. Portanto, vou já pedir desculpa por
quebrar as regras da sociedade civilizada e vou tratar já aqui destas duas
questões.
Os judeus da Alemanha e
das partes da Europa que foram ocupadas pela Alemanha sofreram com as políticas
nazis de racismo e extermínio físico desde o momento em que Hitler chegou ao
poder em 1933 até à derrota da Alemanha em 1945. Os palestinos têm vivido sob
as políticas sionistas de apartheid, limpeza étnica e lento genocídio
desde 1948 e não se vê um fim à vista. É verdade que o plano nazi de exterminar
os judeus era rápido, violento e muito eficaz, e felizmente os nazis foram
derrotados e o genocídio terminou. Também é verdade que as políticas sionistas
não replicam as da Alemanha nazi e a matança dos palestinos não tem sido tão
horrenda. Ao mesmo tempo, as famílias de Gaza que perderam os seus entes
queridos em bombardeamentos israelitas indiscriminados, e milhões de refugiados
palestinos que estão aprisionados em campos devem achar essas diferenças
irrelevantes.
Caso haja alguma dúvida
de que o que o regime sionista na Palestina, isto é, Israel, está a fazer é
genocídio, o artigo 2º da Convenção das Nações Unidas sobre genocídio pode
clarificar as coisas. Ele define o genocídio como um dos seguintes actos
cometidos com a intenção de destruir, totalmente ou em parte, um grupo
nacional, étnico, racial ou religioso. O artigo 3º estabelece quem pode ser punido
pelo crime de genocídio.
Artigo IIº: Na presente
Convenção, genocídio significa qualquer dos actos cometidos com intenção de
destruir, totalmente ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou
religioso, tal como:
(a) matar membros do
grupo;
(b) causar danos graves físicos ou mentais a membros do grupo;
(c) infligir deliberadamente ao grupo condições de vida calculadas para levar à sua destruição física totalmente ou em parte;
(d) impor medidas com a intenção de evitar nascimentos dentro do grupo;
(e) transferir pela força crianças de um grupo para outro.
(b) causar danos graves físicos ou mentais a membros do grupo;
(c) infligir deliberadamente ao grupo condições de vida calculadas para levar à sua destruição física totalmente ou em parte;
(d) impor medidas com a intenção de evitar nascimentos dentro do grupo;
(e) transferir pela força crianças de um grupo para outro.
Artigo IIIº: Os
seguintes actos serão punidos:
(a) genocídio;
(b) conspiração para cometer genocídio;
(c) incitamento directo e público para cometer genocídio;
(d) tentativa de cometer genocídio;
(e) cumplicidade em genocídio.
(b) conspiração para cometer genocídio;
(c) incitamento directo e público para cometer genocídio;
(d) tentativa de cometer genocídio;
(e) cumplicidade em genocídio.
Durante os últimos
sessenta e oito anos, Israel tornou a sua intenção mais que evidente através
das suas acções em relação aos palestinos, e três dos actos do Artigo 2º e
todos os do Artigo 3º se aplicam a Israel. Na realidade, tudo o que no artigo
3º se refere à Palestina também se aplica aos EUA, Reino Unido, França,
Alemanha e vários outros países europeus.
A saga “Tempos de
Cavalos Brancos”, de Ibrahim Nasrallah, conta as histórias de uma Palestina que
já não existe, e as obras de Walid Khalidi e Salman Abu Sitta recordam as
cidades, vilas e aldeias que foram destruídas ainda vivem nos corações dos
palestinos em todo o mundo, e permitem-nos apreciar o que lá existia antes da
invasão sionista.
Não era uma terra sem
povo, não era um deserto feito para ser desabrochado por judeus, mas sim um
país de uma diversidade rica, que foi um lar para uma nação viva e próspera
feita de agricultores e intelectuais, escritores e políticos, negociantes e
construtores.
Este ano, a comunidade
palestina realizou eventos do dia da Nakba e manifestações em todo o país,
comemorando a Nakba nas localidades onde foram destruídas aldeias em 1948. Os
palestinos levavam bandeiras da Palestina, o que, dentro das fronteiras de
1948, é algo de notável. E num caso, em Eljalil, a bandeira de Israel foi
arrancada numa esquadra de polícia e a bandeira palestiniana foi colocada no
seu lugar. Milhares de pessoas assistiram a um evento no Negev, onde a aldeia
de Wadi Zubala existiu até 1948. Os moradores de Wadi Zubala foram para as
colinas do sul de Hebron na Cisjordânia, que nesse tempo estava fora da
jurisdição israelita. Lá, eles compraram terras e estabeleceram-se em Um Hiran,
onde vivem desde então. Agora, colonos judeus tomaram as suas terras em Um Hiran,
forçando-os a sair das suas terras pela segunda vez.
“O velho morrerá e o
jovem esquecerá”, é o que os dirigentes sionistas dizem uns aos outros. Mas
isto é apenas uma fantasia. Os velhos morrem, infelizmente é como anda o mundo,
mas os jovens palestinianos recordam. Não há muito tempo, assisti a uma
conferência sobre a Palestina em Chicago. Como é frequente no caso de
conferências às quais muçulmanos e árabes assistem, havia muitas, muitas
crianças pequenas presentes. É uma alegria participar em tais conferências.
Durante uma pausa, alguns amigos e eu sentámo-nos na sala do hotel e olhámos as
crianças a brincar. Quando perguntámos a essas crianças, que tinham todas
nascido nos Estados Unidos e muitas dela já os pais tinham nascido nos Estados
Unidos, de onde é que elas eram, as respostas surgiram depressa e sem
hesitação. Entre as suas respostas estavam Yaffa, Haifa, Isdud, Akka, Yibne,
etc. Tanto para esquecer.
Nader Elbanna diz
sempre, “A Nakba é muito mais do que perder a terra e a casa”. Fadwa, a minha
cara metade, coloca a questão da Nakba em termos muito crus:
“Eu quero o meu país de volta, e quero que o meu pai tenha a sua dignidade de volta antes dele morrer. E depois de tudo o que eles nos fizeram e continuam a fazer-nos, os judeus nunca serão bem-vindos aqui.” O pai dela tem 85 anos, é um estudioso e um educador. “Por ele se ter recusado a trabalhar com o Yahud, não pôde trabalhar de todo”, disse-me ela. Ele recusou-se a colaborar com a polícia secreta israelita, a Shabbak, e então, com 40 anos, perdeu o emprego como director de escola e nunca mais conseguiu outro emprego.
Para além do genocídio,
da limpeza étnica e da morte e destruição, para além da humilhação e dos anos
de sofrimento que nenhuma indemnização ou restituição poderá alguma vez
compensar, há um aspecto profundamente pessoal na Nakba. Todo o palestiniano
foi tocado por isto e cada um tem uma história pessoal, comovente. E ainda há
um fio comum entre as inúmeras histórias: não existe nenhuma disputa, nenhum
conflito, apenas um povo que muito simplesmente quer o seu país de volta.
Tradução de Solidariedade com a Palestina (comitepalestina@bdsportugal.org)
Nenhum comentário:
Postar um comentário