23 março 2016,
Carta Maior EDITORIAL http://cartamaior.com.br (Brasil)
por: Saul Leblon
Insultaram Dilma, depois Mantega, em seguida o ex-ministro Padilha, Lula, Jacques Wagner e agora o filho de um ministro do STF, Teori Zavascki.
Nazistas
marcavam as casas dos judeus com uma estrela de David; era a senha: ali
seriam colhidas as vítimas para os campos de concentração, seus bens seriam
pilhados, a casa expropriada, sua existência física e civil dissolvida no
estado de exceção.
Hoje o
método eletrônico é mais eficaz e fulminante: fornece-se o endereço
das vítimas na rede -- como fez o roqueiro Lobão com o filho do
Ministro do STF, Teori Zavascki, que teve a sua casa cercada por bandos
raivosos nesta noite de terça-feira.
Ato
contínuo, milícias cevadas diuturnamente pelo ódio midiático destilado contra o
PT, os partidos, a política e, portanto, o Estado de Direito, as
garantias individuais e a democracia, saem sedentas de tacape nas mãos para
fazer o que é preciso.
Seguem o
exemplo de
seus doutrinadores.
Os donos
do monopólio da comunicação no Brasil -- que o PT não civilizou com a
competente regularização democrática -- há muito decidiram que podem fazer
justiça com as próprias manchetes.
Por que a
turba, assim colonizada, não pode caçar os vermelhos nas ruas, ainda que
isso inclua deslizes, como hostilizar um cachorro com lenço carmim
na coleira, ou um menino de oito anos que vestia a camisa com as cores da
bandeira suíça?
Na mesma
sintonia, a Polícia Militar de Geraldo Alckmin em São Paulo interveio em
conflito causado por um carro de som que ecoava mantras fascistas em frente à
Pontifícia Universidade Católica, PUC, na segunda-feira. As forças
da ordem do governo do Estado protegeram o agressor e dispararam
balas e bombas contra estudantes que reagiam à provocação.
Não foi
longo o percurso até o clique que desencadeou o cerco à casa do
filho do ministro Teori, em Porto Alegre.
É
resgatável, se algum jornalista digno quiser faze-lo, o alarido midiático que
transformou José Dirceu, por exemplo, em fascínora número um do país,
caçado pelas ruas por onde passava até cair no buraco negro do justiceiro-mor,
Sergio Moro.
Ao
linchamento de Zé Dirceu, seguiu-se o cerco à casa de Genoíno,
depois, os insultos à Dilma na Copa, então o Mantega; imediatamente em seguida,
o ex-ministro Padilha, então a casa de Lula, as ofensas a Jacques
Wagner...
Lobão é
caso clínico? OK. Mas a TV Globo, Folha, Estadão, Veja e assemelhados, que
insuflaram e insuflam ódio ao governo e ao PT, ao mesmo tempo em
que convocam e bombam meetings fascistas na Paulista
sabem o que estão chocando.
Qual a
diferença entre o que o Lobão fez com a família do Ministro Teori e o que
Moro e sua milícia midiática fazem semanalmente com vazamentos destinados
a promover o linchamento do ex-presidente Lula, de sua família, do
PT, do governo e da Presidenta Dilma?
Qual a
diferença entre o que Lobão fez com a família do Ministro do STF e o que
Gilmar Mendes faz contra a agenda progressista que ele condena em cada
sentença, em cada entrevista, em cada manifestação política agressiva e de
ódio justiceiro que excreta, dentro e fora do Supremo?
Lobões,
botelhos, mervais, bonners, waacks, cantanhedes, noblats, diegos e
assemelhados constituem apenas a borra que flocula.
O
floculante tem origem mais embaixo: é a 'lógica dos livres mercados', a
virulenta campanha dos interesses graúdos que não podem permitir o debate
democrático do essencial; daí 'cruzada ética', a cortina de fumaça que não
renega a adesão de figuras impolutas do calibre de
um Eduardo Cunha.
O
essencial nesse momento é que o desenvolvimento brasileiro precisa ser
repactuado para superar um ciclo que se esgotou e deflagrar o passo seguinte da
sua história.
Daí a
sofreguidão em esmagar, silenciar e desqualificar vozes
e bandeiras, lideranças e organizações que pretendem preservar
conquistas acumuladas e pautar outras novas.
O
jornalismo isento e seus colunistas não escondem a reação estupefata diante da
adesão da Presidenta Dilma a esse mutirão de resistência e
construção de uma rede da legalidade.
A edição
do Globo desta quarta-feira diz que Dilma 'radicaliza' ao levar o embate
político para as cerimônias do Palácio, interrompidas não
raro pelo bordão-síntese do embate político ora travado em campo aberto:
'o povo não é bobo, abaixo a Rede Globo' . Da mesma forma,
o rapaz da Folha que gargareja rudimentos de economia em sua coluna
afirma que é 'aloprado' resistir...
A verdade
é um pouco mais ampla que as cerimonias engajadas no Palácio de onde querem
expulsar a Presidenta e seus 54,5 milhões de votos.
A
parcialidade repugnante do noticiário e os métodos dos justiceiros de
Curitiba atingiram um ponto de saturação e nele catalisaram a
indignação cívica de intelectuais, juristas e artistas, cuja credibilidade
guiou a classe média democrática do sofá da desilusão, para a luta
pela legalidade nas ruas.
Esse é um
fenômeno muito recente, de dias apenas.
Mas já
mudou o país.
O
Brasil hoje é uma fornalha de atos pela legalidade democrática que pipocam
espontaneamente e se espalham por todo o território com energia suficiente para
alterar a relação de forças na sociedade e mudar agenda do
golpe para a da repactuação do desenvolvimemto pela democracia.
Falta
apenas planejamento e desassombro para -- sem prejuízo da autonomia
dessas iniciativas dar-lhes a coordenação suficiente para levar às ruas o
vigor capaz de derrotar o golpe.
Foi o medo
dessa virada em curso que desencadeou o ódio golpista contra o
Ministro Teori Zavascki e sua família.
Nesta
terça-feira, ele determinou que que todas as investigações da
Operação Lava Jato na primeira instância da Justiça Federal que envolvam o
ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva e políticos com foro privilegiado, como
a atual Presidente da República, sejam remetidas ao Supremo.
Em um
despacho contundente, desmontou a condução justiceira
do caso pelo juiz Sergio Moro, criticou duramente os vazamentos
e repôs a legalidade como alicerce da sociedade e escudo dos direitos
individuais.
Ao
enquadrar o herói do golpismo, Teori devolveu ao Supremo o papel de
guardião do Estado de Direito e da Constituição.
Com
firmeza, mas sem concessão ao espetáculo é como se ele colocasse Moro, Gilmar
Mendes, os promotores tucanos, a mídia golpista que deles se serve em uma
sala de aula e dissesse:
'Senhoras e senhores, vou lhes dizer o que é um juiz.
Um juiz não defende suas convicções políticas em público.
Juiz não deve ter facebook, principalmente se for para manifestar
opiniões sobre pessoas e eventos que envolvam de alguma forma os fatos do
processo sobre sua jurisdição.
Não interessa ao juiz a opinião pública ou a publicada.
Juiz não pode virar ídolo nacional a ponto de ser considerado
presidenciável. Isso, no mínimo, é sinal de que alguma coisa está errada,
porque um juiz de verdade não é parte, ou deixará de ser
juiz. Ele é isento. Caso contrário não pode decidir, porque o fará
injustamente.
Juiz não é justo, injusto ou justiceiro: é juiz, ponto.
Juiz concilia, resolve conflitos. Um juiz não pode submeter réus a
penas superiores às condenações. Para isso deve ser o juiz natural. Deve
observar o princípio da inocência.
A lei que quer um juiz socialize o apenado, jamais que se utiliza
dela como instrumento de tortura, linchamento ou humilhação, expondo-o
injustamente ao escárnio da sociedade.
Isso, senhores, é um juiz. Obrigado'.
Obrigado
ao senhor, ministro Teori
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