10 março 2016, ADITAL Agencia de Información Fray Tito
para América Latina http://site.adital.com.br (Brasil)
Por Luis Nassif
A operação fugiu do padrão escracho da Lava Jato. Lula
foi conduzido em sigilo à sala VIP do aeroporto de Congonhas, na beira da
pista, com um jatinho da Polícia Federal no hangar pronto para decolar. Pesados
todos os fatos e possibilidades, a hipótese mais robusta foi levantada por José
Gregori, ex-Ministro da Justiça do governo FHC: a intenção era, de fato,
prender Lula e conduzi-lo a Curitiba.
No interrogatório havia quatro delegados da PF e
quatro procuradores. À medida que o tempo avançou e divulgou-se a localização
de Lula, de dentro da sala era possível ouvir os urros da multidão do lado de
fora.
Seja lá o que ocorreu, a ida de deputados do partido a
Congonhas, a aglomeração de manifestantes, o fato é que não se consumou a
operação.
No final do dia, um Sérgio Moro visivelmente assustado
com os riscos da operação, soltou a nota oficial explicando que o pedido partiu
dos procuradores, enfatizando a intenção de preservar a imagem e a integridade
de Lula e lançando um apelo pela paz e pela concórdia.
Mesmo com a perspectiva de acirramento de conflitos de
rua, os procuradores da Lava Jato trataram de botar mais óleo na fervura,
soltando a nota em que desmentiam as razões invocadas por Moro e se comportam
como deuses ex-machina.
Aliás, a história reconhecerá no futuro a enorme
contribuição do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima para expor a
conspiração quase em tempo real. Seu estilo grosseiro, tosco, atropela e expõe
uma estratégia muito mais refinada. Tão refinada que parece difícil que tivesse
sido planejada em Curitiba.
A estratégia se completa com a matéria de ontem da
Folha, de que a Lava Jato prepara um conjunto de ações de improbidade
visando impedir Lula de concorrer novamente, confirmando, aliás, os
cenários que venho traçando.
Os dois comunicados, mais as informações adicionais,
colocam, de uma vez, quatro peças a mais no nosso quebra-cabeças.
Peça 1 – A radicalização é alimentada pelos procuradores
da Lava Jato. Mais do que explicações, a nota oficial dos procuradores é um
libelo, antecipando a peça final da acusação.
Peça 2 – Moro não é nem nunca foi o cérebro por
trás da operação.
Uma operação dessa envergadura não poderia ter sido
obra de um juiz de primeira instância, de um estado pouco relevante
politicamente, conhecido por
seu conservadorismo, rígido nas sentenças, mas
tímido, tosco até fora dos limites dos autos. Foi só recuar para ser atropelado
pela Força Tarefa.
Peça 3 – A Polícia Federal é um mero instrumento
nas mãos dos procuradores.
Domingo, o Estadão publicou matéria condenando os
abusos da operação, atribuindo-os à Polícia Federal. Ora, a PF limitou-se a
cumprir um mandado requerido pelos procuradores e autorizado pelo juiz Moro. Já
os procuradores formam um todo coeso, obedecendo a uma estratégia nítida: a
inabilitação política de Lula.
Peça 4 – Em meio às turbulências políticas, houve o
risco de confrontos entre manifestantes se alastrarem por todo o país. Um mero
Procurador Regional de Curitiba pode definir, por si, a oportunidade de um
libelo político com aquele grau de temperatura?
Aí cabem duas hipóteses:
Hipótese 1 – O Ministério Público Federal é um
arquipélago formado por comitês, regionais independentes, cada qual com poderes
de interferir até nos aspectos psicossociais do país, sem nenhuma forma de
coordenação ou de controle interno.
Hipótese 2 – há um comando central, de nível
hierárquico superior ao dos procuradores do Paraná.
Em qualquer hipótese se abre um enorme flanco na
armadura institucional do Ministério Público. Quando o modelo de atuação torna
o país refém de um juiz de 1a instância armado por procuradores regionais
beligerantes, há algo de errado na história.
Para entender o jogo, vamos relembrar o histórico da
perseguição a Lula.
A perseguição a Lula
As declarações reiteradas dos procuradores – que
investigam fatos e não pessoas – foram desmentidas cabalmente pela última
operação.
A perseguição a Lula pela Lava Jato começou em março
do ano passado, em cima das investigações da Bancoop pelo Ministério Público
Estadual (MPE). Procuradores da Lava Jato.
O site Jota contou em detalhes essa história, em
reportagem de Laura Diniz.
Em março de 2015 o promotor José Carlos Blat, do MPE
paulista, foi procurado por integrantes da Força Tarefa da Lava Jato, para
compartilhar informações. Em maio teriam surgido fatos novos em relação à
Bancoop, OAS e o prédio de Guarujá. Blat comunicou à juíza Cristina Ribeiro
Leite Costa, da 5a Vara Criminal da Capital. Em despacho de 10 de junho, a
juíza informou que novas informações deveriam ser investigadas em separado.
Resolveu-se rapidamente o problema através de um
artifício, uma Representação Criminal combinada com três escritórios de
advocacia que já atuavam no caso Bancoop, dirigidas diretamente ao procurador –
atropelando o conceito de promotor natural, aquele designado por sorteio.
Com o estratagema, o tríplex entrou na Lava Jato, na
companhia de todas as suspeitas já veiculadas pela imprensa, diz a matéria. E "caídas
literalmente do céu”, segundo a reportagem, as informações sobre a offshore
Murray e a Mossak Fonseca, que serviram de pretexto para a Operação Triplo X.
Caíram do céu da mesma maneira que as informações
iniciais sobre a Petrobras caindo no colo do juiz Moro.
Na mesma época, um obscuro deputado federal do PSDB do
Acre pega matéria de Veja, que falava do sítio de Atibaia, com informações
erradas – atribuindo as obras à OAS – e fez uma representação ao MPE paulista.
O MPE recusou e encaminhou a representação para a Procuradoria Geral da
República. No dia 15 de julho, o próprio PGR Rodrigo Janot encaminhou a
Curitiba, abrindo o segundo duto de bombas contra Lula.
Na nova etapa, a primeira investida foi sobre a Mossak
Fonseca. A Força Tarefa invadiu os escritórios, deteve funcionários, recolheu
computadores e e-mails. Pouco depois vazou a informação das ligações da Murray
com a casa atribuída à família Marinho em Parati.
Imediatamente a operação Mossak sumiu dos noticiários,
os detidos foram imediatamente liberados, contradizendo todo o padrão da
operação até então, demonstrando que a Lava Jato não investigava fatos, mas
pessoas. Aliás, algumas
pessoas.
A perseguição a Lula ficou mais nítida no dia 2 de
fevereiro, por volta das 18 horas, quando quatro procuradores da Força Tarefa
foram à casa do trabalhador Edivaldo Pereira Vieira. Eram eles, Athayde Ribeiro
Costa, Roberto Henrique Pozzobon, Januario Paludo e Júlio Noronha.
Não tinham mandado, intimação, apenas suas carteiras
de promotores e o autoconferido poder de investigar. Pressionaram,
constrangeram e intimidaram Edivaldo, um sexagenário humilde, porque era irmão
de Élcio Pereira Vieira, caseiro do Sítio Santa Bárbara – levado em
condução coercitiva na 24a fase da Operação. Ao final dessa típica batida policial,
os procuradores deixaram um telefone de Curitiba, para o caso de sua presa
decidir "colaborar".
Finalmente, com a operação de sexta, se valeram do
estratagema de envolver esposa e filhos, visando derrubar emocionalmente o
adversário.
No decorrer de todo o ano, os vazamentos da Lava Jato,
planejados pelos Procuradores da República e Delegados Federais, lançaram no ar
toda sorte de factoides.
Qualquer suspeita, por mais ridícula que fosse, era
transformada em sentença condenatória, misturando fatos relevantes com bobagens
monumentais. Essa mistura ajudou a alimentar dois sentimentos conflitantes. Nos
especialistas, a convicção de que a Lava Jato perseguia pessoas, depois ia
atrás de qualquer fato que incriminasse o alvo. Nos leigos a certeza de que
havia um ladrão de galinhas no Planalto, pois até suspeitas de desaparecimento
de estátuas e adagas foram ventiladas pelo escoadouro montado na Lava Jato.
E aí alguns fatos incômodos começam a invadir o
raciocínio. Toda a estratégia de mídia foi montada em Brasília, pela própria
Procuradoria Geral da República, assim como o reforço da Força Tarefa e a
ênfase na cooperação internacional.
Seria Janot responsável direto por todos esses
absurdos, ou meramente abriu a porteira e perdeu o controle da boiada?
Vamos avançar no nosso quebra-cabeça, sem nenhum juízo
de valor definitivo.
A Primavera brasileira no início de tudo
O ponto de partida foram as manifestações de junho de
2013, que deixaram claro que o Brasil estava preparado para a sua
"Primavera”, a exemplo das que ocorreram nos países árabes e do leste
europeu. Essa possibilidade alertou organismos de outros países, como o
próprio FBI e acendeu alerta na Cooperação Internacional– a organização
informal de procuradores e polícias federais de vários países, que se
articularam a partir de 2002 para combate ao crime organizado.
Evidência: informação me foi confirmada por Jamil
Chade, correspondente do Estadão em Genebra, para explicar porque o FBI decidiu
só agora investir contra a FIFA. As manifestações teriam comprovado que a
opinião pública brasileira estaria suficientemente madura para apoiar ações
anticorrupção – e de interesse geopolítico dos EUA, claro.
Atenção - não significa que as manifestações foram
articuladas de fora para dentro. O início foi de um grupo acima de qualquer
suspeita, o MPL (Movimento Passe Livre). Foi a surpreendente adesão de todos os
setores, da classe média à extrema esquerda que mostrou que a sede de
participação, trazida pelas redes sociais, havia transbordado para todos os setores.
As manipulações das manifestações passam a ocorrer mais tarde devido à absoluta
insensibilidade do governo Dilma e do próprio PT em entender o momento.
É a partir daí que, em contato com a cooperação
internacional, começam a ser planejadas as duas grandes operações mundiais
anticorrupção do momento, a Lava Jato, que visaria desmontar a quadrilha que
se apossou da Petrobras e a do FBI, contra quadrilha que se apossou da FIFA e
da CBF. A Globo foi peça central da atuação da FIFA no Brasil.
Houve movimentos internos relevantes que antecederam o
início do jogo. No bojo das manifestações de 2013 ficou nítida a parceria da
Globo com o MPF.
Evidência - Do nada começaram a pipocar cartazes
pedindo a derrubada da PEC 37 – que proibia procuradores de realizar
investigações por conta própria. Os veículos da Globo passaram a dar cobertura
exaustiva à campanha, ajudando na derrubada da PEC. Matérias no Jornal Nacional
conferindo dimensão nacional ao movimento. E propondo não apenas derrubar a
PEC, como aprovar nova PEC que garantisse explicitamente o poder do MP de
investigar.
No mesmo mês de junho de 2013 surge outro fato
revelador: o vazamento de informações da NSA (Agência de Segurança Nacional)
pelo ex-técnico Edward Snowden.
Na primeira semana, foram vazados documentos de casos
internos de espionagem. Depois, a espionagem sobre outros países.
Na enxurrada de documentos vazados, fica-se sabendo
que a NSA espionava preferencialmente a Petrobras.
De repente, um juiz de 1a instância em Curitiba,
Sérgio Moro, tendo como fonte de informação apenas um doleiro, Alberto
Yousseff, tem acesso a um enorme volume de informações sobre a Petrobras e
consegue nacionalizar um processo regional.
Até hoje a Lava Jato não revelou como chegou às
primeiras informações sobre a Petrobras, que permitiram expandir a operação
para todo o país.
O que se viu, dali em diante, foram dois dutos de
informação montados entre o MPF brasileiro e a cooperação Internacional: o duto
da Lava Jato e o duto da FIFA. Pelo duto da Lava Jato vieram informações
centrais para o desmantelamento da quadrilha da Petrobras. Já o duto da FIFA
ficou obstruído. As informações de lá para cá esbarraram em uma mera juíza de
1a instância do Rio de Janeiro e até hoje não foram destravadas. E as
informações daqui para lá não fluíram.
Depois disso, a cooperação internacional torna-se
instrumento central nas investigações da Lava Jato. Mas nas investigações da
FIFA, o braço brasileiro da cooperação internacional falha.
Evidência - A entrevista de Jamil Chade informa o
desagrado do FBI com a demora do MPF em atender às suas solicitações sobre a
Globo. Diz ele: "Um dos únicos países que não colabora nesse caso (é o
Brasil), ironia total. O craque que montou é brasileiro e parte fundamental
atuação foi dos dirigentes brasileiros. O Departamento de Justiça já deixou
muito claro ao Brasil que estava muito incomodado com essa falta de
colaboração.
A estratégia midiática da Lava Jato
Um levantamento sobre as intervenções norte-americanas
nas Primaveras que sacudiram o Oriente Médio, mostra que todas elas vieram
acompanhadas de uma estratégia de comunicação através das redes sociais. E com
foco na corrupção e na defesa da democracia.
A Lava Jato foi montada seguindo todo o receituário
das Primaveras. Receita pronta, ou recolhida de algum manual ou aulas
particulares com especialistas.
Acesso a informações críticas sobre a quadrilha que
atuava na Petrobras.
Identificação de algum inquérito regional que pudesse
ser nacionalizado. Não havia nenhum melhor que Sérgio Moro, testado na AP 470 –
como assessor da Ministra Rosa Weber – tendo atuado no caso Banestado.
Montagem imediata de um aparato de comunicação,
contratando assessorias especiais, montando hotsites de maneira a potencializar
as denúncias de corrupção. O que foi feito por Janot.
Outro know-how adquirido foi o da criação de
personagens para atuar como polos nas batalhas pelas redes sociais.
Nas eleições de 2010, com seus consultores
estrangeiros a campanha de Serra registrou pela primeira vez o uso científico
das redes sociais. Criavam perfis fakes, capazes de galvanizar ilhas de
influência no Twitter. Havia o jovem curitibano de vinte anos, vítima de uma
doença fatal; o músico negro da periferia de São Paulo, capaz das maiores
baixarias (aliás, o fato de conferir esse perfil a um músico e negro é
indicativo do jogo conservador).
Na Lava Jato, investiram em duas imagens reais. Numa
ponta, a imagem evangelizadora de rapaz do bem, o procurador Deltan Dallagnol;
na outra, do homem mau, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, uma
imagem tão marcadamente detestável que, infelizmente, será a imagem do MPF
durante bons anos para grande parte da opinião pública.
Obviamente, não me refiro ao procurador, que nem
conheço, mas à imagem propagada. O MPF não tem mais a cara dos procuradores
que ajudaram a institucionalizar direitos sociais, democracia, direitos das
minorias, a punir os crimes da ditadura. É de Carlos Fernando e seu olhar
rútilo, de matador, a nova cara do MPF.
Nas redes sociais e movimentações de rua surgem, da
noite para o dia, movimentos como o "Movimento Brasil Livre” e
"Estudantes Pela Liberdade”. Constatou-se, com o tempo, que eram
financiados pelo Charles Kock Institute, ONG de dois irmãos, Charles e David,
herdeiros donos de uma das maiores fortunas dos Estados Unidos.
Os Kock ficaram conhecidos por financiar ONGs de
ultradireita visando interferir na política norte-americana. E tem obviamente
ambições de ampliar seu império petrolífero explorando outras bacias fora dos
EUA.
Para selar de vez a parceria com a cooperação
internacional, o próprio PGR Rodrigo Janot foi aos Estados Unidos comandando
uma equipe da Lava Jato para dois eventos controversos.
O primeiro, levar informações da Petrobras para
possíveis processos conduzidos pelo Departamento de Justiça contra a estatal
brasileira. O segundo trazer de lá informações que explodiram na Eletronuclear,
depois de encontro com advogado do Departamento de Justiça ligada a escritório
de advocacia que atende o segmento nuclear por lá.
A geopolítica da cooperação internacional
Desde os anos 70, a parceria com ditaduras militares
mostrou-se inconveniente para a diplomacia norte-americana. De um lado, pela
dificuldade em justifica-la perante a opinião pública liberal norte-americana.
De outro, pelo fato dos governos militares terem nítido cunho nacionalista –
como se viu com o governo Geisel, no Brasil, ou a ditadura militar argentina
deflagrando a guerra das Malvinas.
Gradativamente, a diplomacia e as instituições
norte-americanas foram mudando o eixo, aproximando-se dos sistemas judiciários
nacionais, das polícias federais, de procuradores e estimulando ONGs,
especialmente aquelas voltadas para a defesa do meio-ambiente. A
internacionalização da Justiça tornou-se um fator legitimador, para fortalecer
outro polo de influência nos sistemas nacionais.
Tornou-se conhecido o modelo de desestabilização no
Oriente Médio com as diversas primaveras nacionais. Insuflava-se a classe
média com denúncias de corrupção. Seguiam-se as manifestações de rua que,
devido ao clima de catarse criado, descambavam para a violência. Depois, a
intervenção de alguma força visando trazer a ordem e implantar a democracia.
Foi assim nas ações desastrosas no Iraque, Afeganistão e Líbia – conforme
explicou o professor Moniz Bandeira em longa entrevista concedida esta manhã ao
GGN. Em todos esses casos, desmontou-se um regime autoritário e deixou-se como
herança o caos, a destruição de nações.
O problema está no lado oficial da história. E aí
entra o papel da cooperação internacional na nova geopolítica do poder.
Desde a viagem de Janot aos Estados Unidos começamos a
desconfiar que os EUA estavam se valendo dessa cooperação para impor suas
estratégias geopolíticas.
A Lava Jato não pode mais ser vista como uma operação
de investigação isolada. Ela é tudo o que gerou de forma associada, e teve a
ajuda central de organismos internacionais – caso contrário jamais teria
chegado às quadrilhas que operavam na Petrobras.
No plano econômico e social, a contraparte da
flexibilização da Lei do Petróleo e dos gastos sociais, acabando de vez com o
legado social dos últimos governos. Ambos – operadores da Lava Jato e do
Congresso -- estão umbilicalmente ligados.
Evidências – as operações de impacto da Lava Jato
sempre caíram como uma luva, sincronizadas com as estratégias de impeachment
seja no Congresso seja em dobradinha com Gilmar Mendes no TSE (Tribunal
Superior Eleitoral). Toda a pressão em cima de Dilma têm, do lado
político-econômico, a intenção precípua de obter concessões nas áreas de
petróleo e de gastos sociais.
No plano social, a Lava Jato conseguiu despertar a
comoção popular, o afloramento de uma ideologia da classe média,
ultraconservadora e intolerante, muito longe da vitalidade juvenil do MPL.
No plano econômico, além da flexibilização da lei do
pré-sal e do fim dos gastos sociais obrigatórios, a criminalização das
estratégias de desenvolvimento autóctone– como o avanço diplomático na
África e o financiamento às exportações, as políticas de conteúdo nacional (que
podem ser liquidadas com o fim da Lei do pré-sal).
Ou seja, não dá para desvencilhar a Lava Jato de todo
esse leque de princípios ultraconservadores e ultraliberais. Fazem parte do
mesmo pacote político.
Na falta de estudos mais apurados sobre o tema, alguns
comentaristas julgaram estar frente a uma dessas teorias conspiratórias que
povoa o universo das redes sociais.
No Brasilianas de ontem, o professor Luiz Felipe de
Alencastro (recém aposentado da Universidade de Sorbonne) informou que nas
últimas semanas, o tema ganhou repercussão nos círculos acadêmicos
internacionais.
Em breve, a Lava Jato deixará de ser estudada
meramente como uma imensa operação anticorrupção para se transformar em um case
sobre as estratégias geopolíticas norte-americanas na era das redes sociais, da
globalização e da alta tecnologia.
O presidencialismo de coalizão do MPF
E aí se entram nas questões internas do Ministério
Público Federal.
Trata-se de uma organização admirável que, desde a
Constituição de 1988, foi protagonista de inúmeros avanços civilizatórios no
país.
Com o tempo, algumas de suas maiores virtudes – como a
independência de cada procurador – transformaram-se em alguns dos seus maiores
problemas. A sucessão de representações contra Lula, partindo de todos os
cantos, mostra que, hoje em dia, qualquer procurador que queira participar do
jogo político basta pegar um factoide qualquer e transformar em representação,
valendo-se do poder que lhe foi conferido pela Constituição. E nada acontecerá
com ele, sequer o repúdio dos colegas.
Os procuradores se organizam em grupos, de acordo com
suas convicções e áreas de atuação. Há desde grupos envolvidos com direitos
humanos até os que atuam na área criminal. E há, também, uma enorme gana de
protagonismo político por parte de alguns grupos, de participar de cargos
executivos, a exemplo de colegas de MPs estaduais.
Quando Lula sancionou a eleição direta para escolha do
PGR, abriu a caixa de Pandora. Os candidatos são
indicados pela ANPR (Associação Nacional de Procuradores da República) – que
representa apenas uma classe de procuradores e é uma associação sindical, de
defesa dos interesses corporativos da classe. Não participam os procuradores
estaduais, os dos Tribunais de Contas, os militares.
Recentemente, o CNMP (Conselho Nacional do Ministério
Público) avançou na questão de permitir que procuradores ocupem cargos no
Executivo – hipótese vedada pelo STF.
Na própria campanha eleitoral, os candidatos a PGR vão
firmando acordos políticos capazes de viabilizar sua eleição. E, com isso, diluindo poder e capacidade de intervir
em abusos.
Em Brasília, há integrantes isentos do Judiciário que
defendem Janot, consideram-no uma pessoa equilibrada e responsável. Sustentam
que ele perdeu o controle da situação. Ou seja, abriu a caixa de Pandora quando
estimulou o vazamento da Lava Jato e agora não conseguiria controlar sua tropa.
Mas há um conjunto de atos e omissões inexplicáveis:
A visita aos EUA levando informações da Petrobras e
trazendo da Eletronorte.
A blindagem ao senador Aécio Neves. Na única vez que
conversei com Janot ele assegurou que até abril (do ano passado) daria parecer
no inquérito que investiga contas de Aécio em Liechtenstein. Não só não
desengavetou como desqualificou três delações sobre ele.
A incapacidade de conduzir um inquérito sequer sobre
as Organizações Globo.
Será possível que, com a enorme capacidade jurídica
acumulada entre seus procuradores mais velhos, com as inúmeras referências de
direitos humanos, cidadania, responsabilidade para com o Estado brasileiro, o
Ministério Público Federal tenha se transformado em uma corporação dominada
pelo sindicalismo?
É a última incógnita desses tempos turbulentos. Todas
as demais peças já foram devidamente encaixadas.
Fonte: Jornal GGN
Nenhum comentário:
Postar um comentário