Maputo, 17 outubro 2007 - A entrega de grandes extensões de terra aos investidores, sem uma prévia consulta às comunidades locais, é uma das graves violações da Lei de Terras, numa altura em que se pretende combater a pobreza absoluta desde a base, considera o vice-presidente da Associação Nacional dos Camponeses (UNAC), João Palate. Falando à nossa Reportagem à margem de uma marcha que juntou, na capital do país, mais de 400 camponeses, em representação das associações agrárias de todas as províncias do país, João Palate destacou que a lei trouxe muita coisa positiva em prol da camada desfavorecida, que são os camponeses, mercê de uma ampla divulgação. Contudo, aponta alguns fenómenos preocupantes, como é o caso de uma tendência quase generalizada de usurpação da terra pertencente a esta classe.
"Um dos desafios do nosso Governo é o combate cerrado à pobreza absoluta. Se se pretende que essa luta triunfe, há que ter em conta a protecção dos menos favorecidos, que são a maioria da população deste país. A existência de empresários estrangeiros, detentores de poder económico e com interesses no país é bem-vinda. Mas começa a ser problema quando coloca os nativos numa situação de privação da terra, que é o seu único meio de sobrevivência, nalguns casos, e de rendimento, noutros, colocando-os numa situação de dependência total", disse.
Denunciou alguns casos de grandes investidores que semeiam situações de conflito de terra nos diversos projectos de desenvolvimento que lançam no país. "Falo de casos de farmeiros boers em Manica, malawianos em Milange, do programa de reflorestamento em Niassa e, nos arredores de Maputo, onde a "usurpação" é para fins de construção de habitações. Os madeireiros, por exemplo, quando exploram uma determinada área vedam o acesso aos camponeses locais, o que no nosso entender, não deveria ser", acrescentou.
A consulta comunitária prevista na lei não está a ser cumprida na íntegra. O que tem acontecido é que muitos dos investidores aparecem na comunidade a exibir documentos que lhes conferem a propriedade de uma determinada extensão de terra, algo que espanta os verdadeiros donos, por não terem sido, muitas vezes, consultados.
O vice-presidente da UNAC falou de casos de pressão por parte de alguns investidores no sentido de se alterar a actual Lei de Terras, para que a terra possa ser vendida.
Entretanto, segundo Palate, 10 anos após a aprovação da Lei de Terras, pode concluir-se que nem tudo andou mal, uma vez que houve forte campanha de divulgação até a nível da base. "Muitos conflitos foram amainados, uma vez havendo espaço na lei para a sua resolução, muitas comunidades rurais estão mais ou menos seguras, mas ainda há muito que fazer", afirmou.
O grande propósito da marcha dos camponeses do país, que desaguou no Gabinete da Primeira-Ministra, foi uma chamada de atenção ao Governo no sentido de considerar as inquietações dos camponeses, bem como assinalar a passagem dos 10 anos da aprovação daquele dispositivo legal. (Notícias/Anabela Massingue)
Nenhum comentário:
Postar um comentário