sexta-feira, 10 de junho de 2016

ALERTA PARA O PERIGO DE GUERRA MUNDIAL



7 junho 2016, ODiário.info http://www.odiario.info (Portugal)


Se, como é sabido, o vencedor de uma guerra nuclear não lhe sobreviverá, por que razões têm os Estados Unidos da América um programa de «revitalização atómica» em curso?
Frederico de Carvalho diz-nos que a razão primeira da contradição enunciada acima está na «necessidade de os Estados Unidos “suprimirem toda a ameaça potencial de outras nações e impedir qualquer outra nação de ascender à posição de superpotência.”»
«E a verdade é que qualquer país que prossiga uma política externa independente é um possível candidato à categoria de “potência hostil”»…

No discurso de despedida de Dwight Eisenhower ao povo americano, em 1961, o presidente alertava para a nova realidade da «existência de um imenso complexo militar e uma poderosa indústria de armamentos» na América. Acrescentava que os Estados Unidos «despendiam com a segurança militar mais do que os resultados líquidos de todas as corporações dos EUA».

Sublinhava a necessidade de «entender (…) as graves implicações» dessa realidade na própria estrutura da
sociedade norte-americana, e fazia notar que os círculos governantes “têm que se precaver contra o crescimento de uma influência injustificada, deliberada ou não, do complexo militar-industrial.

Os riscos de um potencial crescimento desastroso são reais e persistirão». O controlo avassalador dos media pelos círculos de interesses dominantes, particularmente eficaz na maioria dos estados mais poderosos, impede o cidadão comum de ter uma percepção correcta da dimensão dos perigos que pendem sobre o futuro da humanidade nestes dias em que o mundo assiste a uma nova corrida aos armamentos.

O complexo militar-industrial é em si mesmo, neste contexto, uma força impulsora poderosa já que se dá naturalmente bem num ambiente de conflito permanente, vendendo os seus produtos a amigos e inimigos com igual boa consciência. Entretanto, o investimento mais lucrativo requere a identificação de um inimigo poderoso. No mundo multipolar dos nossos dias o velho poder unipolar ― os Estados Unidos, autoproclamada nação excepcional e indispensável ― não pode prosperar sem um inimigo conveniente.

Os cinco Estados que em 2015 registaram as maiores despesas militares, foram os EUA, a China, a Arábia Saudita, o Reino Unido e a Rússia. A despesa militar dos Estados Unidos foi, em 2015, quatro vezes superior à da China. A despesa militar per capita foi, contudo, não quatro mas 17 vezes superior.

Particularmente preocupante é o facto de, nos anos mais recentes, as despesas militares daqueles cinco Estados terem vindo a aumentar substancialmente. Assim, armamentos convencionais e não convencionais têm vindo a ser objecto de um contínuo esforço de melhoramento técnico e de desenvolvimentos inovadores. Incluem-se aqui armas de destruição massiva, químicas, biológicas e nucleares. O programa em curso nos Estados Unidos dito de revitalização atómica tem um custo estimado de um milhão de milhões de dólares a gastar ao longo de três décadas. Isto deve ser visto como uma flagrante infracção da obrigação estipulada no Artigo VI do Tratado de Não Proliferação Nuclear, tratado que os Estados Unidos assinaram e ratificaram, onde se diz, designadamente, que cada uma das Partes signatárias, se compromete «a prosseguir de boa-fé negociações sobre medidas efectivas com vista ao fim da corrida aos armamentos, em data próxima, e ao desarmamento nuclear sob controlo internacional estrito e eficaz». Pode avaliar-se da gravidade da situação se se tiver em conta que um pilar principal do referido «programa de revitalização atómica» é o desenvolvimento e ensaio de bombas mais inteligentes («smarter bombs»), de grande precisão, menores dimensões e de difícil detecção em voo («stealthier»).

Este caminho vai, de facto, pôr perigosamente em causa o nível do chamado «limiar nuclear» (nuclear threshold), isto é, as circunstâncias em que se considere «aceitável» o emprego da arma nuclear num possível teatro de guerra ou mesmo contra alvos não militares.

A abordagem focada no objectivo de fazer bombas inteligentes e mais pequenas, encontra um eco favorável em altas esferas políticas e militares norte-americanas que encaram ou «pensam no impensável». Contemplar a eventualidade de um ataque nuclear preventivo contra uma suposta potência inimiga, está ligada à convicção de que uma guerra nuclear pode ser ganha, que pode haver um vencedor. Este é um erro conceptual de que enferma a posição de alguns políticos neoconservadores acerca da utilização das armas nucleares. «Para que servem as armas nucleares se não podem ser usadas?», perguntam. No cerne daquela que, não oficialmente, é chamada «doutrina Wolfowitz», defendida em 1992, pelo então Subsecretário de Estado para a Defesa, Paul Wolfowitz, está a consideração da necessidade de os Estados Unidos «suprimirem toda a ameaça potencial de outras nações e impedir qualquer outra nação de ascender à posição de superpotência». Desde o fim da segunda guerra mundial, seguido do estabelecimento da NATO, os factos mostram que os EUA procuram empenhadamente criar constrangimentos ao ascenso de «potências hostis». E a verdade é que qualquer país que prossiga uma política externa independente é um possível candidato à categoria de «potência hostil».

Quando, todavia, a atenção é dirigida para uma «potência hostil» que possui uma capacidade nuclear de resposta, efectiva, como é o caso da República Popular da China ou da Federação Russa, aumenta o risco de ocorrência de um incidente nuclear deliberado ou acidental que pode levar à extinção da vida no planeta, dando razão a séria preocupação. Desenvolvimentos recentes no palco mundial não são de molde a fazer diminuir o alarme de todos os amantes da Paz em qualquer parte do mundo.

A política de cerco, por meios militares, às que são consideradas as principais «potências hostis» nos círculos dirigentes americanos ― financeiros, industriais ou políticos ― tem vindo a desenvolver-se a um ritmo acelerado. Ao mesmo tempo monta-se um cenário propício à criação de condições que possam justificar acções de agressão ditas em defesa da liberdade e da democracia, tais como a diabolização de ditadores que foram no passado abraçados como bons amigos, ou a montagem de atentados de conveniente autoria, falsamente atribuída (os chamados «false flag attacks»). O mundo atravessa uma fase em que se multiplicam guerras regionais com a destruição massiva de estruturas materiais e pesadas perdas de vidas humanas, a falência de estados unitários e o caos, que é terreno fértil para o terrorismo.

Todos os homens e mulheres amantes da Paz têm o dever de se organizarem colectivamente para defender um futuro viável para a nossa geração e para as que nos sucederem, em que Paz, prosperidade, direitos humanos, democracia e justiça, se sobreponham aos objectivos hegemónicos de uma qualquer potência autoproclamada «excepcional e indispensável».

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Frederico de Carvalho: Investigador. É vice-presidente do Conselho Executivo da Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos.

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