1o. junho 2016, Odiário.info http://www.odiario.info (Portugal)
A simples nomeação dos membros das duas delegações às conversações entre
o governo de Moçambique e a oposição é uma boa notícia para todos os
moçambicanos.
«Apesar da repetida disponibilidade do presidente Nyusi em negociar com Dhlakama, este, com declarações contraditórias e comportamentos erráticos, tem-se recusado a sentar à mesa de conversações».
Com esta decisão renovam-se as esperanças que, desejamos não sejam em vão…
O presidente da
República de Moçambique, Filipe Nyusi, também dirigente da Frelimo, no poder,
saudou o previsto recomeço do diálogo político com a Renamo, na oposição, tendo
em vista a paz e a normalização no país.
Falando no sábado [21
de maio] em Jinan, na República Popular da China – no final de uma visita em
que foram assinados entre Pequim e Maputo acordos de cooperação económica mas
também de reforço das relações militares e de segurança,
no quadro de uma
«parceria estratégica global» –, Nyusi, citado pela AIM, agência noticiosa
moçambicana, comentou que a anuência da Renamo em sentar-se à mesa de
negociações «é a notícia de que o povo moçambicano estava à espera».
A missão das
delegações do governo e da Renamo, segundo a AIM, é apenas preparar as
condições para uma reunião entre o presidente da República e Afonso Dhlakama, o
controverso líder oposicionista.
O presidente
mostrou-se optimista, disse que só na cimeira é que serão «tomadas decisões
vinculativas» e manifestou a convicção de que o encontro «vai acontecer e vai
ser produtivo». Contudo, criticou os ataques armados contra civis em estradas
da região central de Moçambique, da responsabilidade do «braço armado» da
Renamo. «Fazer pressão através de ataques armados é uma velha táctica que não
funciona», advertiu. E esclareceu que a resposta do governo tem sido exortar as
Forças de Defesa e Segurança de Moçambique a manter a calma e a não responder a
provocações, procurando defender o povo e proteger as colunas de transportes
nas estradas em risco.
O governo tinha
nomeado em Março uma equipa para participar do processo de retoma de
conversações e, agora, em finais de Maio, a Renamo anunciou os nomes dos seus
três negociadores. Jacinto Veloso, membro do Conselho Nacional de Defesa e
Segurança e antigo ministro da Segurança, Benvinda Levy, conselheira do
presidente, e Alves Muteque, dos serviços da presidência da República, foram os
designados por Nyusi. Quanto a Dhlakama, indicou os nomes de José Manteigas,
Eduardo Namburete e André Magibiri, todos deputados do seu partido.
Situação singular
O diálogo entre o
governo e a Renamo tinha começado em Abril de 2013 e fora interrompido em
meados de Agosto de 2015, quando os representantes oposicionistas abandonaram o
processo.
Para reatar as
conversações, o chefe da oposição exigia a presença de mediadores
internacionais, designadamente o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, e
representantes da União Europeia e da Igreja Católica. A exigência não foi
aceite por Nyusi e, pelo menos para já, o diálogo será só entre as duas partes.
Moçambique, com 25
milhões de habitantes e um enorme potencial de desenvolvimento (gás, carvão,
recursos hidroeléctricos, agricultura, pesca e outras riquezas naturais),
espera um crescimento económico da ordem dos seis ou sete por cento do PIB em
2016 e 2017, uma das maiores taxas na África.
A situação, contudo,
agravou-se desde há alguns meses, com a desvalorização do metical em relação ao
dólar e a suspensão da «ajuda» do Fundo Monetário Internacional, do Banco
Mundial e dos países ocidentais, quando foi conhecida, em Abril, a existência
de dívidas do Estado moçambicano, fora das contas públicas, no valor de 1,2 mil
milhões de euros. Essas dívidas foram contraídas em 2013 e 2014 (no mandato do
presidente Guebuza) e são justificadas por razões de segurança e de construção
de infra-estruturas estratégicas.
Nestes 40 anos de
independência, o país tem sido governado pela Frelimo e hoje vive uma situação
política e militar singular. Nos últimos tempos têm aumentado os confrontos
militares entre bandos da Renamo e forças de defesa governamentais, sobretudo
nas províncias do centro e Norte (Manica, Sofala, Zambézia e Tete).
A Renamo apresenta
duas faces – uma, a de um partido na oposição, com os seus deputados
trabalhando «normalmente» no parlamento; e outra, a de um grupo armado que
ataca colunas, faz emboscadas a autocarros, rapta autoridades locais, provoca
vítimas. O seu líder vive escondido, supostamente algures na serra da
Gorongosa, mas dá entrevistas e presta declarações, com frequência, aos media
moçambicanos e estrangeiros.
Apesar da repetida
disponibilidade do presidente Nyusi em negociar com Dhlakama, este, com
declarações contraditórias e comportamentos erráticos, tem-se recusado a sentar
à mesa de conversações. Com um discurso belicoso, rejeita os resultados das
eleições presidenciais e legislativas de finais de 2014, ganhas pela Frelimo, e
ameaça «tomar o poder» pela força (o prazo era até ao fim de Março) nas seis
províncias do centro e Norte, as mais povoadas, onde alega ter obtido a maioria
dos votos.
Agora há, de novo, a
expectativa de um diálogo para a paz.
Texto publicado no
Avante nº 2217 de 25 de maio de 2016.
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