26 setembro
2015, ODiario.info http://www.odiario.info (Portugal)
A
Guiné-Bissau vivia desde Agosto uma crise política e institucional, situação
que está longe de ser inédita naquele país. Contrariando um historial de
violência política e militar, nesta crise na Guiné-Bissau parece ter sido
encontrada uma solução pacífica, sem intervenção das Forças Armadas e no
respeito pelas decisões dos tribunais, neste caso o Supremo Tribunal de Justiça.
No momento em que passa o 42.º aniversário da proclamação do Estado da Guiné-Bissau, os dirigentes guineenses procuram ultrapassar mais uma crise no país.
Carlos
Correia, 1.º vice-presidente do PAIGC (Partido Africano para a Independência da
Guiné e Cabo Verde), indigitado por este partido, foi escolhido para
primeiro-ministro e encarregado de formar um novo governo. O experiente
político – tem 81 anos, é engenheiro agrónomo, chefiou o governo em três outras
ocasiões, é um veterano da luta de libertação nacional
– deverá oferecer pastas
ministeriais a outras formações, incluindo o PRS (Partido da Renovação Social),
a maior força da oposição parlamentar.
A crise
política e institucional foi desencadeada a 12 de Agosto, quando o presidente
da República, José Mário Vaz, demitiu o primeiro-ministro Domingos Simões
Pereira, líder do PAIGC, que conquistara nas eleições de 2014 a maioria de
deputados na Assembleia Nacional Popular.
Vaz, alegando
incompatibilidades com Pereira, escolheu logo a seguir um primeiro-ministro,
Baciro Dja, tal como ele também do histórico partido, e empossou o novo
governo, com ministros do PAIGC e do PRS. Contudo, 48 horas depois, o Supremo
Tribunal de Justiça deliberou por unanimidade a anulação da nomeação de Dja,
por considerá-la inconstitucional, o que provocou a demissão do recém-formado
gabinete.
O presidente
pediu então ao PAIGC que apresentasse um nome para primeiro-ministro e Domingos
Simões Pereira, conciliatório e com o apoio da direcção do seu partido,
abdicando ele próprio de retomar o cargo do qual foi afastado sem justificações
fundadas, indicou Carlos Correia, uma figura que reúne amplo consenso na
sociedade guineense.
Os países
vizinhos da Guiné-Bissau mostraram-se desde o começo da crise preocupados com a
situação. O assunto foi debatido em meados deste mês, em Dakar, numa cimeira
extraordinária da Cedeao (Comunidade Económica dos Estados da África
Ocidental). A organização escolheu o antigo presidente da República da Nigéria,
Olesegun Obasanjo, como mediador da crise guineense. O velho general,
considerado um «sábio» africano, deslocou-se a Bissau, onde se encontrou com os
principais responsáveis políticos e ajudou a desbloquear o impasse. Propôs aos
diferentes actores a assinatura de um «pacto de estabilidade» que evite, no
futuro, a repetição de situações como a actual.
Importância da paz
A cimeira da
Cedeao decidiu prolongar a permanência do contingente militar da África
Ocidental de manutenção da paz na Guiné-Bissau (Ecomib) por mais seis meses,
até Junho de 2016. A missão, no país desde o último golpe militar, em 2012,
devia terminar a sua presença na Guiné-Bissau em Dezembro deste ano.
Também as
Nações Unidas se manifestaram por um rápida resolução da crise. O representante
especial do secretário-geral da ONU, Miguel Trovoada – antigo presidente da
República de São Tomé e Príncipe –, chamou a atenção para a necessidade de se
resolver com urgência o conflito institucional, cumprindo-se as normas da
Constituição. E sublinhou a importância da paz e da estabilidade no país, até
porque, lembrou, a comunidade internacional prometeu, numa mesa-redonda
realizada este ano em Bruxelas, mais de mil milhões de dólares de ajuda ao
desenvolvimento.
Terão sido,
aliás, estas prometidas verbas avultadas e a sua gestão a causa principal das
divergências, nunca bem explicadas, entre o presidente José Mário Vaz e o líder
do PAIGC e agora ex-primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira. Dirigente que,
apesar de afastado da chefia do governo, continua a gozar de amplos apoio e
prestígio.
Apesar de
tudo, contrariando um historial de violência política e militar, nesta crise na
Guiné-Bissau foi encontrada uma solução pacífica, sem intervenção das Forças
Armadas e no respeito pelas decisões dos tribunais, neste caso o Supremo
Tribunal de Justiça.
Estes factos
ocorrem precisamente quando o país comemora o 42.º aniversário da proclamação
da sua independência.
A 24 de
Setembro de 1973, em plena guerra de emancipação nacional, o PAIGC – que tinha
visto o seu líder, Amílcar Cabral, ser assassinado meses antes, em Conakry, por
agentes do colonialismo português – proclamou unilateralmente, nas áreas
libertadas do Boé, no Leste, o Estado da Guiné-Bissau, com parcelas do
território então ainda ocupadas por forças estrangeiras.
Menos de um
ano depois, a 10 de Setembro de 1974, já depois do derrubamento do regime
colonial-fascista, a 25 de Abril, e no contexto da Revolução de Abril em curso,
Portugal reconheceu a independência do jovem país africano.
*Este artigo
foi publicado no “Avante!” nº 2182, 24.09.2015
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