28 de setembro de
2015,Rede Voltaire http://www.voltairenet.org (France)
Senhor Morgens Lykketoft, Presidente
da Septuagésima Assembleia Geral das Nações Unidas,
Senhor Ban Ki-moon, Secretário-Geral das Nações Unidas,
Senhores e Senhoras Chefes de Estado, de Governo e de Delegações,
Senhoras e Senhores,
Senhor Ban Ki-moon, Secretário-Geral das Nações Unidas,
Senhores e Senhoras Chefes de Estado, de Governo e de Delegações,
Senhoras e Senhores,
É um privilégio poder dirigir-me à
Assembleia-Geral neste ano em que as Nações Unidas celebram seu septuagésimo
aniversário.
Minhas primeiras palavras, senhor
presidente, são de congratulações por sua escolha para presidir esta Assembleia
Geral.
Reitero, em especial, o apoio do
Brasil à sua disposição de adotar medidas que fortalecem a agenda de
desenvolvimento da organização.
Setenta anos são passados da
Conferência de São Francisco. Buscou-se, naquela ocasião, construir um mundo
fundado no Direito Internacional e na busca de soluções pacíficas para os
conflitos. Desde então, tivemos avanços e recuos. O processo de descolonização
apresentou notável evolução, como se pode constatar contemplando a composição
desta Assembleia.
A ONU ampliou suas iniciativas
incorporando a Agenda 2030 e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, ou
seja, as questões relativas ao meio ambiente, ao fim da pobreza, ao
desenvolvimento social e econômico e ao acesso a serviços de qualidade.
Temas como os desafios urbanos, a
questão de gênero, das mulheres e das meninas, as questões de raça, ganharam
prioridade. Não conseguiu o mesmo êxito ao tratar da segurança coletiva,
questão que esteve na origem da Organização e no centro de suas preocupações.
A multiplicação de conflitos
regionais – alguns com alto potencial destrutivo –, assim como a expansão do
terrorismo que mata homens, mulheres e crianças, que destrói patrimônio da
humanidade, que expulsa de suas comunidades seculares milhões de pessoas,
mostram que a ONU está diante de um grande desafio.
Não se pode ter complacência com
tais atos de barbárie, como aqueles perpetrados pelo chamado Estado Islâmico e
por outros grupos associados. Esse quadro explica, em boa medida, a crise dos
refugiados pela qual passa atualmente a humanidade.
Grande parte dos homens, mulheres e
crianças que se aventuram nas águas do Mediterrâneo e erram penosamente nas
estradas da Europa provêm do Oriente Médio e Norte da África, onde países
tiveram seus Estados nacionais desestruturados por ações militares ao arrepio
do Direito Internacional, abrindo espaço para a proliferação do terrorismo.
A profunda indignação provocada pela
foto de um menino sírio morto nas praias da Turquia e pela notícia sobre as 71
pessoas asfixiadas em um caminhão na Áustria deve se transformar em ações
inequívocas de solidariedade prática. Em um mundo onde
circulam, livremente,
mercadorias, capitais, informações e ideias, é absurdo impedir o livre trânsito
de pessoas.
O Brasil é um país de acolhimento,
um país formado por refugiados. Recebemos sírios, haitianos, homens e mulheres
de todo o mundo, assim como abrigamos, há mais de um século, milhões de
europeus, árabes e asiáticos. Estamos abertos, de braços abertos para receber
refugiados. Somos um país multiétnico, que convive com as diferenças e sabe a
importância delas para nos tornar mais fortes, mais ricos, mais diversos, tanto
cultural, quanto social e economicamente.
Senhor presidente,
Esse inquietante pano de fundo nos
impõe uma reflexão sobre o futuro das Nações Unidas e nos exige agir concreta e
rapidamente. Necessitamos uma ONU capaz de fomentar uma paz sustentável no
plano internacional e de atuar com presteza e eficácia em situações de guerra,
de crise regional localizada e de quaisquer atos contra a humanidade.
Não se pode postergar, por exemplo,
a criação de um Estado Palestino que conviva pacífica e harmonicamente com
Israel. Da mesma forma, não é tolerável a expansão de assentamentos nos
territórios ocupados.
Para dar às Nações Unidas a
centralidade que lhe corresponde, é fundamental uma reforma abrangente de suas
estruturas. Seu Conselho de Segurança necessita ampliar seus membros
permanentes e não permanentes para tornar-se mais representativo, mais legítimo
e eficaz. A maioria dos Estados-membros não quer que uma decisão a esse
respeito possa ser eternamente adiada.
Temos a esperança de que a reunião
que hoje se inicia entre para a história como o ponto de inflexão na trajetória
das Nações Unidas. Que traga resultados concretos no longo e, até agora,
inconcluso processo de reforma da Organização.
Nossa região – onde impera a paz e a
democracia – se regozija com o estabelecimento de relações diplomáticas entre
Cuba e os Estados Unidos, que põe fim a um contencioso derivado da Guerra Fria.
Esperamos que esse processo venha a completar-se com o fim do embargo que pesa
sobre Cuba.
Celebramos, igualmente, o recente
acordo logrado com o Irã, que permitirá a esse país desenvolver a energia
nuclear para fins pacíficos e devolver a esperança de paz para toda uma região.
No âmbito do Brics, lançamos um Novo
Banco de Desenvolvimento, que ajudará na ampliação do comércio e dos
investimentos e, possivelmente, na consecução dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável.
Senhor presidente,
A Agenda 2030 desenha o futuro que
queremos. Os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável reafirmam o preceito
da Rio+20, que é afirmar que é possível crescer, incluir, conservar e proteger.
Estabelecem metas universais, evidenciam a necessidade de cooperação entre os
povos e um caminho comum para a humanidade.
Esta Agenda exige solidariedade
global, determinação de cada um de nós e compromisso com o enfrentamento da
mudança do clima, com a superação da pobreza e da miséria e a construção de
oportunidade para todos.
Em Paris, em dezembro próximo, devemos
fortalecer a Convenção do Clima com pleno cumprimento de seus preceitos e
respeito a seus princípios. As obrigações que assumirmos devem ser ambiciosas –
inclusive no que se refere a apoios financeiros e tecnológicos aos países em
desenvolvimento e às pequenas ilhas –, em sintonia com o princípio das
responsabilidades comuns, porém diferenciadas.
O Brasil está fazendo grande esforço
para reduzir as emissões de gases de efeito estufa sem comprometer seu
desenvolvimento, nosso desenvolvimento. Continuamos diversificando as fontes
renováveis em nossa matriz energética, que está entre as mais limpas do mundo.
Estamos investindo na agricultura de baixo carbono. Reduzimos em 82% o
desmatamento na grande floresta amazônica.
A ambição continuará a pautar nossas
ações. Por isso, anunciei ontem, aqui na ONU, nossa INDC [ - Pretendida
Contribuição Nacionalmente Determinada, na sigla em inglês - ]. Será de 43% a
contribuição do Brasil para a redução das emissões de gases de efeito estufa
até 2030, com base em 2005. Neste período, o Brasil pretende o fim do
desmatamento ilegal; o reflorestamento de 12 milhões de hectares; a recuperação
de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas; a integração de 5 milhões de
hectares de lavoura, pecuária e florestas.
Em um mundo em que a participação
das fontes renováveis de energia é de apenas 13%, em média, da matriz
energética, pretendemos garantir o percentual de 45% de fontes renováveis na
nossa matriz energética. Vamos buscar a participação de 66% da fonte hídrica na
geração de eletricidade; a participação de 23% das fontes renováveis – eólica,
solar e biomassa – na geração de energia elétrica; o aumento de cerca de 10% na
eficiência energética; e a participação de 16% de etanol carburante e das
demais biomassas derivadas da cana-de-açúcar no total da matriz energética. O
Brasil contribui, assim, para que o mundo possa atender às recomendações do
Painel de Mudança do Clima, que estabelece o limite de dois graus Celsius de
aumento de temperatura neste século.
Somos um dos poucos países em
desenvolvimento a assumir meta absoluta de redução de emissões. Nossa INDC
inclui ainda ações que aumentam a resiliência do meio ambiente e reduzem os
riscos associados aos efeitos negativos da mudança do clima sobre as populações
mais pobres, mais vulneráveis, com atenção para as questões de gênero, do
direito dos trabalhadores, das comunidades indígenas, ou quilombolas/negras e
tradicionais. Reconhecemos a importância da cooperação Sul-Sul no esforço
global de combater a mudança do clima.
Enfatizo que, desde 2003, políticas
sociais e de transferência de renda contribuíram para que mais de 36 milhões de
brasileiros superassem a pobreza extrema. O Brasil saiu, no ano passado, do
Mapa Mundial da Fome. Isso evidencia a eficácia de nossa política, chamada Fome
Zero, que agora se transforma no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número
2.
Na transição para uma economia de
baixo carbono, consideramos importante assegurar condições dignas e justas para
o mundo do trabalho. O desenvolvimento sustentável exige a promoção do trabalho
decente, a geração de empregos de qualidade e a garantia de oportunidades. O
esforço para superar a pobreza e promover o desenvolvimento tem de ser coletivo
e global. Em meu País, no entanto, sabemos que o fim da pobreza extrema é só um
começo de uma longa trajetória de novas conquistas.
Senhor presidente,
Por seis anos, buscamos evitar que
os efeitos da crise mundial que eclodiu em 2008 no mundo desenvolvido, se
abatessem sobre nossa economia e nossa sociedade. Por seis anos, adotamos um
amplo conjunto de medidas reduzindo imposto, ampliando crédito, reforçando o
investimento e o consumo das famílias. Aumentamos os empregos, aumentamos a
renda nesse período.
Esse esforço chegou agora no limite,
tanto por razões fiscais internas como por aquelas relacionadas ao quadro
externo. A lenta recuperação da economia mundial e o fim do superciclo das
commodities incidiram negativamente sobre nosso crescimento. A desvalorização
cambial e as pressões recessivas produziram inflação e forte queda da
arrecadação, levando a restrições nas contas públicas. O Brasil, no entanto,
não tem problemas estruturais graves, nossos problemas são conjunturais. E,
diante dessa situação, estamos reequilibrando o nosso orçamento e assumimos uma
forte redução de nossas despesas, do gasto de custeio e até de parte do
investimento. Realinhamos preços, estamos aprovando medidas de redução
permanente de gastos. Enfim, propusemos cortes drásticos de despesas e
redefinimos nossas receitas.
Todas essas iniciativas visam
reorganizar o quadro fiscal, reduzir a inflação, consolidar a estabilidade
macroeconômica, aumentar a confiança na economia e garantir a retomada do
crescimento com distribuição de renda.
Hoje, a economia brasileira é mais
forte, sólida e resiliente do que há alguns anos atrás. Temos condições de
superar as dificuldades atuais e avançar na trilha do desenvolvimento.
Estamos num momento de transição
para um novo ciclo de expansão mais profundo, mais sólido e mais duradouro.
Além das ações de reequilíbrio fiscal e financeiro, de estímulo às exportações,
também adotamos medidas de incentivo ao investimento em infraestrutura e
energia.
No Brasil, o processo de inclusão
social não foi interrompido. Esperamos, que o controle da inflação, a retomada
do crescimento e do crédito contribuirão para uma maior expansão do consumo das
famílias.
Essas são as bases para este novo
ciclo de crescimento e desenvolvimento, baseado no aumento da produtividade e
na geração de mais oportunidades de investimento para empresas e de empregos
para os cidadãos.
Senhoras e senhores,
Os avanços que logramos nos últimos
anos foram obtidos em um ambiente de consolidação e de aprofundamento da nossa
democracia.
Graças à plena vigência da
legalidade e ao vigor das instituições democráticas, o funcionamento do Estado
tem sido escrutinado de forma firme e imparcial pelos poderes e organismos
públicos encarregados de fiscalizar, investigar e punir desvios e crimes.
O governo e a sociedade brasileiros
não toleram e não tolerarão a corrupção.
A democracia brasileira se fortalece
quando a autoridade assume o limite da lei como o seu próprio limite.
Nós, os brasileiros, queremos um
país em que a lei seja o limite. Muitos de nós lutamos por isso justamente
quando as leis e os direitos foram vilipendiados durante a ditadura.
Queremos um País em que os
governantes se comportem rigorosamente segundo suas atribuições, sem ceder a
excessos. Em que os juízes julguem com liberdade e imparcialidade, sem pressões
de qualquer natureza e desligados de paixões político-partidárias, jamais
transigindo com a presunção da inocência de quaisquer cidadãos.
Queremos um País em que o confronto
de ideias se dê em um ambiente de civilidade e respeito.
Queremos um País em que a liberdade
de imprensa seja um dos fundamentos do direito de opinião. E a manifestação de
posições diversas, direito de cada um dos brasileiros.
As sanções da lei devem recair sobre
todos os que praticam e praticaram atos ilícitos, respeitados o princípio do
contraditório e da ampla defesa. Essas são as bases de nossa democracia e
valho-me de recente manifestação de meu amigo José Mujica, ex-presidente
uruguaio, que disse:
“Esta democracia não é perfeita
porque nós não somos perfeitos. Mas temos que defendê-la para melhorá-la, não
para sepultá-la”.
Que fique consignado que o Brasil
continuará trilhando o caminho democrático e não abrirá mão das conquistas
pelas quais tanto lutamos.
Senhoras e senhores,
Quero valer-me desta ocasião para
reiterar que o Brasil espera, de braços abertos, os cidadãos de todo o mundo
para a realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 no Rio de Janeiro.
Essa será oportunidade única para
difundir o esporte como instrumento fundamental de promoção da paz, da inclusão
social, da tolerância, por meio da luta contra a discriminação racial, étnica e
de gênero.
Será também ocasião para que
possamos promover a inclusão de pessoas com deficiência, uma das prioridades de
meu governo.
Uma última palavra. Há poucos dias,
foram reinaugurados aqui na sede das Nações Unidas os murais chamados Guerra e
Paz, do artista brasileiro Cândido Portinari, doados à ONU pelo governo do meu
País, em 1957.
A obra denuncia a violência e a
miséria e exorta os povos a buscar o entendimento. É um símbolo para as Nações
Unidas quanto à sua responsabilidade de evitar os conflitos armados e de
promover a paz, a justiça social e a superação da fome e da pobreza.
Portinari sempre afirmou que, cito:
“Não há nenhuma grande arte que não esteja identificada com as pessoas”.
A mensagem dos murais permanece
atual. Alude tanto às vítimas das guerras como aos refugiados que arriscam suas
vidas em precários barcos e a todos os anônimos que buscam na ONU proteção, paz
e bem-estar.
Esperamos que, ao ingressar neste
recinto das Nações Unidas e ao olhar esses murais em sua entrada, sejamos
capazes de escutar a voz dos povos que representamos e de trabalhar com afinco
para que seus anseios de paz e progresso venham a ser atendidos. Afinal, foram
esses os ideais que estiveram, 70 anos atrás, presentes no ato fundacional
dessa grande conquista da humanidade que é a Organização das Nações Unidas.
Muito obrigada, senhor presidente.
Muito obrigada a todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário