22 junho 2014, Desafio EDITORIAL http://desafio.co.mz (Moçambique)
Moçambique
celebra quarta-feira 39 anos de independência nacional. A data é assinalada
quando passam escassos 22 anos depois do calar das armas dos tristes 16 anos de
guerra fratricida movida pela Renamo.
Trata-se
de tempo escasso porque é suposto assumir a paz como eterna no livre
pressuposto de que o ser humano devia viver sempre em paz. Desejo que, ao que
parece, não fazer parte do plano de alguns moçambicanos. Triste sina a nossa.
A maioria
dos moçambicanos anseia pela paz. Clama por ela. Contudo existe o triste
contraponto de homens que em pelo Século XXI advogam o caos. A confusão. A
balbúrdia. Para estes o troar das armas
deve substituir manifestações de
alegria.
Se
subtrairmos os 16 anos de guerra aos 39 da independência, sobra muito pouco… e
desse pedaço, também há quem queira tirar mais um quinhão com este reacender de
hostilidades, apegando-se ao argumento da pólvora e deixando abaixo a
capacidade dos moçambicanos, conhecidos pelo mundo inteiro pela sua capacidade
de resolver pacificamente os seus problemas. A assinatura do Acordo Geral de
Paz, em 1992, foi mais do que um exemplo; foi uma lição de vida para um mundo
pontuado por conflitos intermitentes.
Mas há
aqui um ponto que merece particular atenção; é que, ciclicamente, quando se
aproximam os períodos eleitorais há sempre tensão militar no país. As ameaças
de retorno às armas são recorrentes. Foi assim em 1994, altura das primeiras
eleições, e a história repetiu-se ao longo dos processos seguintes,
nomeadamente em 1999, 2004 e 2009. Noutras ocasiões, houve boicote às eleições
autárquicas. O protagonista das ameaças é, curiosamente, o mesmo: a Renamo!
Este ano,
seguindo a cartilha, a Renamo abriu publicamente as hostilidades. Avisou que
iria metralhar quem ousasse cruzar o Rio Save. Cumpriu a ameaça. Há gente
inocente a morrer quase todos os dias naquelas bandas. Se o argumento inicial
era a Lei Eleitoral, tal parece não mais colher louros, porquanto foi revista
nos termos desejados pela “perdiz”, desejosa de viver para sempre nas matas,
semeando a morte de pessoas inocentes. Há dias, António Muchanga, em viva voz,
reiterou a continuação dos tiros!
O curioso
nisso tudo, é que a mesma Renamo tem representação no Parlamento; submeteu já a
sua candidatura para as próximas eleições e até está a eleger candidatos para a
Assembleia da República e para as “provinciais”.
Aliás, a
partir de amanhã, a Renamo agrega-se, em Reunião Nacional, na cidade da Beira,
mas sem o querido líder. Alega problemas de segurança. Mas aconteceria à
perdiz-mor com tantas outras reunidas, em liberdade e em paz, no tal conclave?
Á luz do dia, não parecem existir razões para essa atitude. Acreditamos que,
querendo (ou se calhar podendo), Dhlakama, poderia participar dessa reunião.
Mas não… ele não estará lá. Estranha forma de agir de um partido que se
auto-proclama diariamente democrata. Que se saiba, a democracia desenvolve-se
sob alçada das leis e não sob a ditadura das armas…
O
Presidente da República, Armando Guebuza, já disse que está disposto a receber
o líder da Renamo dado que este último condiciona o cessar das armas a um
encontro entre os dois chefes; Guebuza já disse que está até disponível a criar
todas as condições para que Dhlakama venha a Maputo. Contudo, o “pai da
democracia” diz que não pode sair do mato porque sabe que querem assassiná-lo.
Em que é
que ficamos? Continuam as mortes? O país pára? O que é que se segue no próximo
episódio?
O país
tem estado a assinalar índices de desenvolvimento interessantes (na casa dos 8
porcento), mas -- não haja ilusões - não há economia que resista ao troar de
armas. Aquela pancadaria no Centro do país vai-nos fazer recuar milhares de
anos. Estamos a voltar para a idade da pedra enquanto o mundo, lá fora, avança
a largos passos para o desenvolvimento sustentável e equilibrado.
A asneira
é tanta que já várias chancelarias já deram a voz aos protestos e condenaram as
acções belicistas da Renamo. Atente-se que algumas dessas chancelarias nem
sempre viram com bons olhos o Governo da Frelimo mas, neste particular, acham
que é um verdadeiro absurdo a promoção de um conflito claramente desnecessário!
É que a
manutenção de partidos armados no país nos tira o sono. É que as armas impõem o
silêncio ditado pelo vencedor de ocasião. Os partidos passam a ser exércitos
que se preparam ciclicamente para a guerra. Se se sentam à mesa do diálogo,
levam as metralhadoras a talabarte. O ambiente envolvente é tecido pelo medo,
em vez de favorecer a convivência pacífica, o que urge reverter.
Se os
estrangeiros acham que é uma completa estupidez andarmos aos tiros, o que não
passará pela cabeça de milhares de moçambicanos – os mesmos que a Renamo afirma
representar? Resposta: também julgam que esta confusão é uma completa falta de
respeito pela vida e dignidade humanas. Querem paz. Em todos os momentos,
apelam para a resolução pacífica do diferendo. Entretanto, parece que os
“bosses” da Renamo não fazem a mesma leitura. Todos os dias reiteram a
necessidade da guerra.
Isto
atinge gravemente o Estado de Direito modelado na Constituição da República. A
Renamo aprovou essa mesma Lei-Mãe em ambiente de consenso parlamentar, não se
coibindo, agora, de vir a público esburacar o seu próprio texto, amedrontando à
esquerda e à direita, atacando, matando e destruindo bens. Isto porque,
pensamos, não foi capaz até hoje de se apresentar aos moçambicanos como
alternativa credível de governação. Por outras palavras: não tem agenda
credível.
Há que
reter que os investimentos feitos nas últimas décadas guindaram o país para a
rota do desenvolvimento. Há biliões de dólares investidos em outros tantos
projectos de desenvolvimento que iriam, a breve prazo, alavancar o país para as
primeiras páginas do desenvolvimento. A guerra fará tudo menos contribuir para
o desenvolvimento do país. Isso é uma certeza absoluta.
Há alguns
“actores sociais” que, quando o assunto envolve a Renamo, quedam-se mudos. Não
atam nem desatam, mas aguardam ansiosamente que o Governo tropece nalgum calhau
para começarem a uivar. Também uma estranha forma de defender os interesses da
sociedade civil. E atenção que também defendemos que, quando o Governo pisa na
bola, deve ser sim criticado mas não pode haver critérios dúbios no julgamento.
O que não é correcto é convocarmos a neutralidade quando nos convém.
Não
tenhamos ilusões. A escuridão só acaba quando você resolve abrir os olhos.
A Renamo
parece estar em desespero de causa. Não está preparada para nada. Está tonta.
Quer governar na base da chantagem. Não quer eleições. Agora se agarra apenas à
solução militar. Dhlakama parece conhecer a máxima de Aquiles que, na
antecâmara da guerra de Troia, proclamou: O que todos os Homens querem, eu
quero mais; mas parece esquecer que "o inteligente aprende com os seus
erros. Já o sábio aprende com os erros dos outros”.
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