20 março 2014, Outras Palavras
http://outraspalavras.net (Brasil)
Por Pepe Escobar,
no Znet | Tradução: Antonio Martins
Sob influência dos “falcões” neoconservadores, Obama lançou-se a nova
aventura arrogante. Nem toda histeria da mídia ocultará sua derrota
Vamos aos fatos, rápido e rasteiro:
1. O jogada “estratégica” do governo Obama para subcontratar, junto ao
“Khaganato de Nulands1” do Departamento de Estado, e exclusão da Ucrânia da esfera de
influência Russa e sua anexação subsequente à NATO está arruinada. Ela
baseava-se em instrumentalizar uma coalizão de neonazistas e fascistas, pintada
com verniz de banqueiro (o primeiro ministro Arseniy Yatsenyuk).
2. O contra-ataque de Moscou consistiu em evitar, na Crimeia, um
repetição programada do putsch de Kiev. O referendo na Crimeia (85%
de comparecimento, em torno de 93% dos eleitores a favor da reincorporação à
Rússia) é fato consumado, ainda que a “tão democrática…” União Europeia
continue ameaçando punir o povo por exercitar seus direitos democráticos.
3. A principal razão para todo o movimento “estratégico” dos EUA – levar
seus aliados, os putschistas de Kiev, a cancelar o acordo que
permite a presença de uma base naval russa em Sebastopol – virou fumaça. Moscou
continua presente no Mar Negro, com pleno acesso ao Mediterrâneo Oriental.
O resto é blablablá.
Nos últimos dias, o Departamento de Estado dos EUA praticamente
concordou com uma Ucrânia federativa e, em termos práticos, finlandizada2. Por sinal, é a solução proposta pelo ministro das Relações Exteriores
russo, Sergey Lavrov desde o início, com atesta um documento russo. O secretário de Estado dos
EUA, John Kerry vai tentar roubar todo o crédito dos russos, assim como fez na
crise síria. A mídia corporativa norte-americana comprará a versão docilmente,
mas não publicações independentes, como Moon of Alabama3.
Esta solução inteligente implica, entre outros pontos cruciais: forte
autonomia para as regiões, na Ucrânia; a reintrodução do russo como língua
oficial, ao lado do ucraniano; e,
principalmente, neutralidade política e
militar do país – ou seja, a “finlandização”. Construir o entendimento será a
missão de um grupo de apoio – igualmente proposto por Moscou desde o início –
em que estarão presentes Estados Unidos, União Europeia e Rússia..
E tudo será santificado por uma resolução do Conselho de Segurança da
ONU (ressalve-se que tudo pode dar errado, espetaculosamente, caso o “Ocidente”
continue em posição de sabotagem). E tudo isso, também, sem que Moscou
obrigue-se a reconhecer os putschistas de Kiev. Trocando tudo em miúdos:
diante do blefe de Washington, Moscou pagou para ver – e ganhou.
Portanto, após toda a interminável série de ameaças, que envolveu desde
Obama, Kerry e os falcões neoconservadores até parceiros menores, como o
primeiro-ministro britânico David Cameron, seu chanceler William Hague e o
premiê francês Franços Hollande, o essencial é: o governo Obama concluiu que
não valia a pena arriscar um conflito nuclear com a Rússia pelo Khaganto de
Nulands. Especialmente depois que Moscou fez saber, discretamente, que poderá
criar condições para que o Leste e o Sul da Ucrânia também se separem da
Ucrânia.
A Suécia, por exemplo, propôs um embargo à venda de armas para Moscou.
Paris voltou os olhos rapidamente para os interesses de seu complexo
industrial-militar e disse não. Só os decerebrados cultivam a noção de que
Paris e Berlim desejarão arriscar suas relações comerciais com a Rússia. Ou
pensarão que Beijing aderiria a sanções contra a Rússia – sua companheira no
G-20, no BRICS e na Organização de Cooperação de Shangai – apenas porque
Washington, vista na China como cada vez mais irracional, recomentou o gesto.
Ainda assim, a histeria ocidental prosseguirá invicta. Nos Estados
Unidos, onde importa, a pergunta posterior será, inevitavelmente, “quem perdeu
a Síria?” e “quem perdeu a Ucrânia?”
Eis o placar: George Bush lançou-se em duas guerras – e perdeu
miseravelmente ambas. Obama tentou lançar duas guerras (Síria e Ucrânia). Por
sua própria sorte, perdeu ambas ainda na fase de “tentativa”. Os
neoconservadores e toda a brigada de excepcionalistas4 estão previsivelmente lívidos.
Aguarde: a página de editoriais do Wall Street Journal vai tornar-se
“balística”. E a embaixadora dos EUA na ONU, Samantha Power desejará ser Sinead
O’Conner, cantando Nothing Compares to You.
Os putschistas de Kiev já estão anunciando suas intenções.
O capo do grupo neonazista Right Sector, Dmytro Yarosh afirma: “A Rússia ganha dinheiro enviando petróleo
para o Ocidente por meio de nossos oleodutos. Destruiremos estes oleodutos para
privar nosso inimigo de sua fonte de renda”.
É a estratégia brilhante de um playboy do Khaganato de Nulands. As
famílias e toda a base fabril da Ucrânia ficariam sem gás (vendido barato, com
desconto), para não falar das grandes indústrias alemãs, para que os
neonazistas cantem “vitória”. Com amigos como estes…
Os executivos da Gazprom não estão exatamente franzindo as sobrancelhas.
Cerca de metade do gás que a Rússia envia à Europa já não passa pela Ucrânia, e
em 2015, quando o gasoduto South Stream ficar pronto, este percentual
crescerá (as “sanções” da União Europeia contra o South Stream são pura
retórica).
Os putschistas vão tentar armar confusão também em
outros fronts. O novo parlamento ucraniano decidiu constituir uma Guarda
Nacional de 60 mil membros, coalhada de “ativistas”. Adivinhe quem a dirigirá:
o novo chefe de segurança, Andriy Parubiy, um dos fundadores do Partido
Nacional-Social, neonazista. Seu vice não é outro senão Yarosh, líder dos
paramilitares do Right Sector. Que fiquem à vontade para criar suas próprias
metáforas hitlerianas, mesmo que cresça o risco de a Ucrânia quebrar. Não é
necessariamente má ideia. Vamos deixar que a “democrática” União Europeia pague
as contas de gás de Kiev…
1Referência à presença crescente da extrema-direita norte-americana (os
“neoconservadores”) no Departamento de Estado, no governo Obama. “Nulands” é Victoria Nuland, a subsecretária de Estado para assuntos da
Eurásia. Radicalmente anti-Rússia, ficou conhecida há semanas, quando vazou um
telefonema que manteve com o embaixador dos EUA na Ucrânia. Recomendava-lhe
ampliar a disputa com Moscou, ignorando a postura, mais conciliadora, da União
Europeia. “Foda-se a UE”, disse então. “Khaganato” refere-se a Robert Kagan, seu marido, um dos principais expoentes dos
neoconservadores, defensor de que os EUA imponham, por meios militares, sua
hegemonia global. [Nota do Tradutor]
2“Finlandizar” a Ucrânia significa assegurar que ela assuma neutralidade
entre Estados Unidos e Rússia. O termo origina-se do papel semelhantes que a
Finlândia cumpriu, durante a Guerra Fria, como “tampão” entre Estados Unidos e
União Soviética. A “finlandização” tem sido defendida mesmo por analistas
norte-americanos conservadores, como Henry Kyssinger e Zbigney Brezinsky [Nota
do Tradutor]. A notícia das negociações de bastidores em curso, entre EUA e
Rússia, para “finlandizar” a Ucrânia pode ser lida em Lavrov, Kerry agree to work on
constitutional reform in Ukraine: Russian ministry, Reuters, March 16, 2014.
4Corrente de pensamento na política segundo a qual os EUA são uma nação
“excepcional”, imprescindível, por seu poder e suposta sabedoria, à segurança
do mundo. [Nota do Tradutor]
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Lavrov, Kerry agree to work on constitutional reform
in Ukraine: Russian ministry
Sun, Mar 16 2014
http://www.reuters.com/article/2014/03/16/us-ukraine-crisis-lavrov-kerry-idUSBREA2F05Y20140316
MOSCOW (Reuters) - Russian Foreign Minister Sergei Lavrov
and U.S. Secretary of State John Kerry agreed on Sunday to seek a solution to
crisis in Ukraine by pushing for constitutional reforms there, the Russian
foreign ministry said.
It did not go into details on the kind of reforms needed
except to say they should come "in a generally acceptable form and while
taking into the account the interests of all regions of Ukraine".
There was no immediate confirmation from Washington.
In their second phone conversation in two days, Lavrov
also urged Kerry to use the influence of the United States to encourage
authorities in Kiev to stop "massive lawlessness" against
Russian-speaking population.
"Sergei Viktorovich Lavrov and John Kerry agreed to
continue work to find a resolution on Ukraine through a speedy launch of
constitutional reform with the support of international community," the
ministry said in a statement.
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