29 abril 2008 / Blog do Emir
Uma das novas modalidades que o racismo assume hoje em dia é o separatismo, forma de tentar delimitar os territórios da raça branca, apropriando-se privadamente de riquezas que pertencem à nação e ao seu povo. Nós já conhecíamos essas tentativas na forma de bairros ricos que procuram constituir-se como prefeituras próprias, para que os impostos que são obrigados a pagar por uma parte —a parte que não podem sonegar— das suas imensas riquezas, fiquem ali, aumentando os benefícios dos seus bairros entrincheirados, dentro dos quais procuram isolar e defender —com segurança privada, é claro— suas formas privilegiadas de vida.
Um fenômeno que inicialmente caracterizou cidades como Los Angeles e Miami, que agrupam em territórios comuns ou próximos setores muito ricos da população e outros muito pobres —com freqüência imigrantes—, foi se alastrando pela América Latina, conforme os estilos de vida miamescos e californianos das burguesias e classes médias altas do continente foram se espalhando. São reiteradas as tentativas, por exemplo, de bairros da Barra da Tijuca (que já foi caracterizada como “A Miami da América do Sul”) para conseguir aprovar, por meio de referendos, a separação das suas zonas residenciais da cidade do Rio de Janeiro.
Fracassaram sistematicamente, seja porque domingos de sol dificultam o quorum necessário para que a consulta tenha validade legal, seja porque os bairros pobres que estão em volta votam massivamente contra essas tentativas elitistas. Não há dúvida de que os moradores de bairros como Chacao, em Caracas, e outros redutos privilegiados de cidades latino-americanas alimentam sempre esse sonho racista e separatista.
É uma postura típica do desenvolvimento desigual das nossas sociedades. Os preconceitos do sul do Brasil com respeito ao nordeste, da cidade de Buenos Aires com respeito aos “cabecitas negras” e “descamisados”, entre tantos outros, também se reproduz na Europa, e o exemplo recente disso é o enorme crescimento da Liga do Norte, partido neofascista italiano. Trata-se de uma nova expressão do preconceito do norte – tendo o progresso de cidades como Milão e outras da região – contra o sul da Itália, que é exatamente de onde vêm os trabalhadores que criam as riquezas dessa região – igual que nos casos citados do Brasil e da Argentina. É um preconceito de raça e de classe.
É o mesmo que hoje afeta gravemente a Bolívia. As províncias da chamada Meia-Lua, com seu epicentro em Santa Cruza de la Sierra, tiveram derrotados seus governos, da ditadura de Hugo Banzer a todos os governos neoliberais que vieram depois e que concentraram como nunca a riqueza na Bolívia, acentuaram sua apropriação privada e sua desnacionalização. A queda de seu derradeiro governo, o de Sánchez de Losada – refugiado nos EUA, com demanda de extradição para a Bolívia para responder pelos assassinatos de centenas de bolivianos, na tentativa desesperada de continuar protegendo os interesses das elites de Santa Cruz e das províncias do leste do país – representou uma grande vitória do povo boliviano que, pela primeira vez em sua vida, elegeu um indígena como presidente do país. Um país no qual 62% da população se reivindica como indígena e que somente agora conseguiu eleger um presidente que defende os interesses da maioria do país.
Mas a minoria continua dispondo de grande parte das riquezas do país e foi afetada pela nacionalização das riquezas naturais. Eles, que faziam com que a Bolívia pobre vendesse o gás a preço “solidário” para a Argentina e o Brasil, muito mais desenvolvidos, agora querem ficar com a grande fatia dos impostos que o governo de Evo Morales recuperou para o país, com a nacionalização. Querem, além disso, impedir que a reforma agrária se estenda por todo o país, buscando reservar para si o direito de dispor da concentração de terras em suas províncias, para continuar exportando soja transgênica e acumulando riquezas para eles e não para o país e o povo boliviano.
Convocaram um referendo que tentava legalizar seu separatismo racista. Racista, porque sua imprensa monopólica não esconde seus preconceitos contra os indígenas, contra Evo Morales, não deixa de contrapor sua raça branca à da grande maioria do povo boliviano, que há séculos discriminam, oprimem, humilham. Mantiveram uma consulta que teve negado qualquer valor legal por parte da Justiça boliviana, que tem sido condenada por todo tipo de organismo internacional, pelos governos da região, pelas forças democráticas.
É uma tentativa que, não por acidente, é apoiada pelo governo dos EUA e sua embaixada em La Paz, abertamente envolvida em tentativas de espionagem e financiamento do separatismo racista. Esse bloco de forças do separatismo racista tem que ser derrotado, para que o povo da Bolívia possa seguir adiante, construindo a mais avançada Constituição do continente — de corte plurinacional, pluriétnico, pluricultural. Para que os povos originários do continente possam afirmar sua soberania, para que os recursos naturais da Bolívia sejam explorados a favor do seu povo, para que a terra produza sadiamente os alimentos que a Bolívia precisa, para que o governo democrático e soberano de Evo Morales continue transformando a Bolívia em um país livre, à imagem e semelhança do seu povo.
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