segunda-feira, 2 de março de 2009

Escritor brasileiro revela plano da CIA para depor Allende

Lisboa, 27 fevereiro 2009 (Lusa) - O escritor e cientista político brasileiro Luiz Alberto Moniz Bandeira defende, em seu novo livro, que os dois acontecimentos mais importantes da América Latina no Século 20 foram a revolução cubana e a deposição de Salvador Allende, no Chile, numa "conspiração norte-americana organizada pela CIA".

No livro "A fórmula para o Caos", publicado em Portugal, Moniz Bandeira analisa o processo político, econômico e social que levou à queda do governo de Salvador Allende, em setembro de 1973, após ser eleito democraticamente.

O autor cita a conspiração da CIA com os grupos civis de extrema direita, com os militares e com a oposição para derrubar Allende.

Em declarações à Agência Lusa, o cientista político, ou "politólogo", como gosta de se classificar, explicou que o título da obra foi inspirado na expressão que o chefe do escritório da CIA em Santiago, Henry Heckscher, usou para denominar o conjunto de operações encobertas - atentados terroristas, assassinatos, sabotagens, boicote econômico - que culminariam com o golpe de Estado.

Contexto
O historiador defendeu que "os golpes de Estado que existiram nos diversos países da América Latina após a revolução cubana foram um fenômeno da guerra fria", não um fenômeno nacional.

"Foram o resultado da mutação da estratégia da segurança continental dos EUA no contexto da guerra fria", disse o especialista.

"Antes, a estratégia de segurança dos EUA tinha como objeto a defesa de uma agressão do bloco sino-soviético. Com a revolução cubana houve uma mutação da estratégia de segurança para dar ênfase, como primeira hipótese de guerra, à subversão", afirmou.

Em seguida, "começou a funcionar a doutrina da ação cívica, que atribui às forças armadas, considerando-as a instituição mais estável e modernizadora, o papel político que deviam fazer as reformas, a revolução, antes que os comunistas a fizessem".

Ação dos EUA
Para Moniz Bandeira, esta mutação da estratégia de segurança permitiu às forças armadas passarem a "fazer golpes de Estado de todas as vezes que o governo se opunha àquilo que os EUA consideravam como fundamental".

"Allende estava fraturado, era inviável o regime socialista. O Chile era um país atrasado, dependente do mercado mundial, não só para as suas exportações de cobre como até para importações de alimentos, e não se pode socializar a pobreza", disse.

De acordo com o cientista político, "a teoria de Marx é a socialização da riqueza que o capitalismo produz, de forma excludente ou discriminatória. O socialismo nunca foi pensado como via de desenvolvimento, mas sim como via de distribuição".

Por esse motivo, explicou que "os EUA temeram que houvesse uma aliança com Cuba. Mais um foco comunista, juntamente com Cuba".

Fazendo uma comparação entre os dois regimes, lembrou também que, inicialmente, "Cuba não ia ser socialista" e que "Fidel Castro não era comunista"

"Ele [Fidel] começou uma reforma agrária, expropriando as terras da empresa norte-americana United Fruits e distribuindo-as por camponeses, não queria fazer socialismo. Fidel foi compelido a ser comunista quando caiu nos braços da União Soviética. Já o que Allende tentou foi um sonho, ele queria fazer um modelo, implantar, socializar, e mexeu com tudo. Não era possível, criou as condições para ser derrubado, que era o que os EUA queriam", disse.

Pesquisa
O escritor admitiu a polêmica da sua obra, mas ressaltou que a narrativa sobre os três anos do regime de Salvador Allende, assim como sobre a trama interna e internacional que provocou bombardeio do palácio de La Moneda e a tomada de poder por Augusto Pinochet, foram elaboradas a partir de documentação primária fornecida por arquivos chilenos, brasileiros e norte-americanos, especialmente os arquivos da própria CIA.

"Todos os meus livros são polêmicos, se não o forem não têm graça. Eu defendo teses, sou um politólogo, estudo, analiso, pesquiso em fontes primárias. Mostro todo o processo", declarou, afirmando que mostra no livro "como a CIA passou a desenvolver a técnica de criar situações que permitem o golpe de Estado".

Em defesa da sua teoria, Moniz Bandeira revelou à Lusa que o líder da organização de extrema direita Pátria e Libertat lhe disse como receberam dinheiro da CIA para fazer atentados terroristas para criar o caos.

"Inclusive contou-me, ele que foi genro do Pinochet, que Pinochet chegou atrasado ao posto de comando do golpe para derrubar Allende porque antes foi perguntar ao embaixador norte-americano se os EUA o estavam apoiando ou não", revelou.

O autor concluiu que a CIA foi o grande vencedor do 11 de setembro de 1973, dia do golpe, e que Allende e o seu projeto de implantação do socialismo pela via pacífica foram os grandes perdedores.

Autor
Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira, nascido em 1935 em Salvador, é reconhecido como um dos maiores historiadores sul-americanos e é autor de mais de 20 obras traduzidas em diversos países.

Licenciado em Direito, é professor titular de história de política exterior da Universidade de Brasília, doutorado pela Universidade de São Paulo.

Foi professor visitante do Instituto Superior de Ciências Sociais e Política (ISCSP) de Lisboa em 2006 e conferencista regular do Instituto de Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores.

Em 2006, foi eleito intelectual do ano de 2005 pela União Brasileira de Escritores. Moniz Bandeira mora atualmente Alemanha, é Grande Oficial da Ordem de Rio Branco e Comendador da Ordem de Mérito Cultural (Brasil) e Comendador da Ordem de Mayo (Argentina) e Cruz de Mérito - 1ª Classe da Alemanha.

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