19
dezembro 2014, Pátria Latina http://www.patrialatina.com.br (Brasil)
Segundo presidente, em um
"cenário desfavorável", país levará dois anos para se recuperar
economicamente Foto: Konstantin Zavrájin/RG
Maksim Kórchunov,
Gazeta Russa
Nesta
quinta-feira (18), o presidente russo Vladímir Pútin realizou a já tradicional
coletiva de imprensa de final de ano. Como era previsto, os problemas
econômicos do país e as diferenças políticas na comunidade internacional
pautaram o evento em Moscou.
Economia e o rublo
“É
evidente que a situação atual está sendo provocada, acima de tudo, por fatores
externos. Mas assumimos que não fizemos muito daquilo que planejávamos.
Antes
de mais nada, sofremos com a queda do preço do petróleo e, por trás disso, vem
a alteração do preço do gás. Existem pretensões quanto à atuação do governo e
do banco central, mas, no geral, tudo está acontecendo de forma adequada.
Espero que a taxa de câmbio das moedas estrangeiras continue caindo. É possível
que isso aconteça. Assim como também é possível que os preços do petróleo
continuem caindo.
A
nossa economia sairá da situação em que se encontra. Quanto tempo
necessitaremos para isso? Em caso de um cenário mais desfavorável, dois anos.
O
Banco Central não pretende queimar cegamente suas reservas. As reservas totais
da Rússia chegam a 8,3 trilhões de rublos [US$ 141 bilhões].
Em
discurso, Pútin diz que opositores querem ‘desintegrar’ país
Na
Rússia, criar negócios absolutamente independentes do setor energético é
difícil, pois, por enquanto, essa área é bastante lucrativa. (...) Vai ser mais
difícil cumprir as obrigações sociais do Estado. Mas conseguiremos cumpri-las?
Sim, conseguiremos.”
Política internacional
“Por
acaso, não nos disseram depois da queda do Muro de Berlim que não haveria
qualquer expansão da Otan para o Leste? Mas essa expansão começou quase que
imediatamente. Isso não é um muro? Ninguém parou, e esse é o problema das
relações internacionais - os nossos parceiros ocidentais decidiram que eles são
um império, e que todos os outros são vassalos que devem ser totalmente espremidos.
A nossa posição firme em relação a situações conhecidas, incluindo ao que se
passa na Ucrânia, deve mostrar aos parceiros ocidentais que não é preciso
construir muros.
A
posição firme da Rússia em relação às situações de crise deve passar claramente
a mensagem de que temos que construir um espaço de segurança comum.
O
que quer que façamos, sempre se opõem a nós, estão sempre lutando contra nós.
Lembram-se de como nos preparamos para as Olimpíadas [de Moscou, em 1980]? No
entanto, foram feitas tentativas sem precedentes para desacreditar tanto as
Olimpíadas em si, como a sua preparação. [O Ocidente] sempre tentará colocar
correntes no nosso ‘Misha’ [ursinho mascote da Olimpíadas de 1980, visto como
símbolo da Rússia], arrancar-lhe os dentes e garras, mesmo que ele deixe de
perseguir leitões e porquinhos no bosque e vire vegetariano, passando a se
alimentar de bagas silvestres e mel. Já há quem diga que não é justo a Sibéria
inteira pertencer à Rússia. Transformam o nosso urso em espantalho. Nós queremos
nos preservar e lutar para sermos mais independentes ou para ver a nossa pele
pendurada em uma parede?
Os
EUA estão se voltando para o Oriente, porque ali surgem novas oportunidades. A
demanda energética por parte dos países asiáticos é crescente. E por que
deveríamos desistir de tal guinada [ao Oriente], sendo que a concebemos há
muito tempo? O contrato com a China não é lucrativo, concordamos em fazer
descontos. Mas ele nos permitirá ligar os sistemas de gasoduto ocidental e
oriental e, dependendo da conjuntura, poderemos liberar gás de um local para
outro. Estamos falando de uma construção imensa, da entrada de impostos, da
revitalização da economia. Quanto à Turquia, conhecemos as suas necessidades. A
possibilidade de criar um gasoduto rumo a Turquia e Grécia irá depender dos
nossos parceiros europeus. Querem ter acesso constante a gás? – Então haverá
gasoduto. Não querem? – Então não haverá. Mas não há variante que permita
conseguir fornecimento mais barato e mais confiáveis da Rússia.”
Crise na Ucrânia
“Na
Rússia, o presidente é o responsável por tudo. Quanto aos militares, o
responsável pelo destino deles é o seu comandante supremo, que é a mesma
pessoa. Todos aqueles que por iniciativa própria participam das hostilidades,
incluindo na Ucrânia, não o fazem por dinheiro. Nós interpretamos a atuação da
liderança de Kiev como uma operação punitiva. Não foram as milícias que
atacaram Kiev. Após o golpe de Estado armado, em vez de diálogo político com os
dissidentes, Kiev recorreu à polícia, ao Exército, ao bloqueio econômico. Nós
acreditamos que isso não tem qualquer futuro e que é prejudicial. Estamos
dispostos a atuar como intermediários para ajudar a chegar a um diálogo
político, até mesmo a restauração de um único espaço político.
Acredito
que temos que trocar todos por todos [troca de prisioneiros entre o Donbass e
Kiev]. Mas a vida é mais complicada. Se a Ucrânia quer restaurar a paz e a
integridade territorial, deverá então respeitar as pessoas que vivem em
determinadas regiões do país, ter com elas um diálogo político.
Oposição e a “quinta-coluna”
“Eu
quero unir, não dividir a nossa sociedade. Se isso aconteceu, tenho de ter mais
cuidado com o que digo. No entanto, é preciso dar nome aos bois. Essa linha é
muito tênue. É complicado demarcar cientificamente a oposição da quinta coluna
[expressão usada para se referir a grupos clandestinos que atuam dentro de um
país ou região prestes a entrar em guerra]. Todos conhecemos o poema de
Lérmontov: “Adeus, Rússia mal lavada!”. O poeta era um oposicionista?
Claro
que sim. Quando escreveu o poema “Para a morte de um poeta”, um seu familiar
lhe pediu que suavizasse os versos. Lérmontov, porém, os tornou ainda mais
agressivos. Claro que foi oposicionista, mas também um patriota. Trata-se de um
limiar indefinido. Um oposicionista luta até o fim pelos interesses da sua
Pátria, enquanto a quinta-coluna é movida por interesses de outros Estados.
Quando
tomei a decisão de comutar a pena do empresário Mikhail Khodorkóvski, suas
intenções políticas não me interessavam, era assunto dele. Que Deus o ajude,
que trabalhe à vontade. A minha decisão teve por base razões humanitárias, pois
a sua mãe estava doente. Ele já cumpriu a maior parte da pena. Não me arrependo
de nada, penso ter agido corretamente.”
Relações russo-georgianas
“Tentei
convencer [o ex-presidente georgiano Mikheil] Saakachvili a não desencadear
ações militares, mas ele não atendeu aos meus pedidos. Todos sabemos que, em
1991, também se deram graves acontecimentos, quando a Geórgia se proclamou um Estado
independente. Somos sempre acusados de todos os pecados mortais, de
termos provocado tudo. Não provocamos nada. A Rússia reconheceu a independência
das repúblicas.”
Jogos Olímpicos e Mundial de 2018
Tudo
o que planejamos na preparação e realização dos Jogos Olímpicos [de Sôtchi, em
2014], conseguimos alcançar. Mais ainda, ganhamos. As instalações olímpicas são
hoje um grande centro de descanso e recuperação para toda a população. Em
Sôtchi vão ocorrer competições, será desenvolvido o esporte infantil, surgiu
até um time de hóquei.
Entretanto,
são muitos os países que se recusam a participar das competições. Queremos que
as pessoas se exercitem, em vez de comprar vodca. Precisamos da Copa do Mundo
de 2018 para popularizar o futebol entre as crianças. Ele representa um impulso
ao desenvolvimento da Rússia.
Vida pessoal
Um
conhecido me perguntou se tenho namorada. Está tudo em ordem, não se preocupem.
Ludmila Aleksándrovna [ex-mulher do presidente] e eu somos amigos, nos vemos de
vez em quando. Não estou aborrecido, não se preocupem. O que é preciso é
trabalhar – e assim que deve ser.
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