Vermelho/21 janeiro 2008
Por Eric Tossaint*
Por outro lado, nos grandes meios de comunicação, que em sua grande maioria tomaram claramente partido contra Rafael Correa durante a campanha eleitoral, percebe-se uma evolução prudente. A desaprovação por parte do eleitorado dos partidos que os meios tinham apoiado é tal, que estes moderam, pelo menos de forma provisória, as suas críticas ao presidente e ao seu movimento político. É necessário assinalar que os partidos de direita assim como os de centro direita (democratas cristãos — UDC — e sociais democratas — ID —)foram esmagados. O PRIAN, o partido do magnata da banana, Álvaro Noboa, que tinha sido derrotado no ano passado na segunda volta das presidenciais por Rafael Correa só terá uns 5% de lugares na Constituinte. O Partido Social Cristão, pilar da direita, está em queda. O ex presidente Lucio Gutierrez apenas se separou dos perdedores, com uns resultados bastante pobres (o seu partido terá entre 15 e 18 lugares). Estes resultados apanharam desprevenidos os partidos mencionados já que as sondagens davam resultados modestos aos candidatos mantidos por Correa. A evolução prudente dos grandes meios de comunicação é no entanto limitada: quase nunca dão a palavra a Rafael Correa nem aos dirigentes do seu movimento político. O presidente fala pela rádio num programa semanal todos os sábados. Várias rádios privadas e comunitárias retransmitem ao vivo a sua intervenção. Dentro de algumas semana vai reaparecer uma cadeia pública de rádio e televisão...
Segundo Alberto Acosta, o calendário da nova Constituinte é muito apertado. Uma vez reunida, deverá emitir uma proposta de nova Constituição em seis meses. A seguir, o projeto apresentar-se-á em referendo 45 dias mais tarde. No final de 2007 e durante o ano de 2008 haverá uma série de novas eleições: referendo sobre o conteúdo da Constituição e, provavelmente, eleição de um novo Parlamento, e nova eleição presidencial. Na realidade teria a intenção de renunciar antes do termo do seu mandato (que normalmente seria em finais de 2010), para reforçar ainda mais a sua base popular e exercer a sua presidência no marco da nova Constituição. Se este cenário se confirmar, se a democracia equatoriana não for enterrada por um golpe de Estado militar, em fins de 2008 o Equador poderia ter uma nova Constituição democrática, com um novo Parlamento (no qual, ao contrário de hoje, o movimento político de Rafael Correa seria maioria) e um presidente eleito para um novo período. Isso abre caminho a reformas econômicas e sociais que poderiam ser profundas.
O economista Alberto Acosta, um dos ex dirigentes da campanha para a anulação da dívida, presidirá provavelmente à nova Assembléia Constituinte. Proporá a esta trabalhar em comissões temáticas e Plenários. Quanto à dívida pública, a sua intenção é associar a Comissão de Auditoria Integral de Crédito (CAIC) nos trabalhos da comissão econômica da Constituinte. A nova constituição poderia conter uma definição clara das condições nas quais o Estado e os poderes públicos locais possam contrair dívidas públicas, prescrevendo as dívidas odiosas e fixando um limite máximo no reembolso da dívida. Por exemplo, a constituição poderia prever que a parte do orçamento do Estado dedicada ao reembolso da dívida nunca possa superar a soma dos gastos em educação e saúde.
Alguns dias depois da vitória eleitoral de 30 de Setembro de 2007, o Governo de Rafael Correa anunciou que no futuro as empresas petrolíferas que operam no país deveriam pagar ao Estado uma proporção maior dos seus lucros. Quantia que traria ao Estado uma entrada suplementar de um pouco mais de mil milhões de dólares, que poderá ser utilizada no aumento dos gastos sociais.
Esta medida foi muito apreciada pela população. Além disso, o Governo de Rafael Correa quer conseguir que os bancos baixem os tipos de juros, que são atualmente muito elevados. Há poucos meses, o Parlamento que tem uma maioria de direita recusou o projeto de lei para reduzir os tipos de lucro. A popularidade do Parlamento caiu de chofre. As sondagens realizadas depois das eleições de 30 de Setembro indicam que a maioria da população é favorável à demissão do atual Parlamento com o fim de deixar o lugar à Constituinte.
O povo espera muito de Rafael Correa. O seu discurso radical convenceu a maioria dos equatorianos que é necessária e possível uma mudança fundamental, na condição de dar uma clara maioria ao presidente. O presidente Rafael Correa quer reduzir radicalmente a parte do orçamento destinada ao reembolso da dívida pública. Simultaneamente a sua intenção é aumentar as despesas sociais. Chegará até à suspensão do pagamento de certas dívidas em 2008? Decidirá repudiar as numerosas dívidas odiosas e ilegítimas? Não há a certeza por várias razões. A principal, é a seguinte: as importantes receitas petrolíferas do Estado permitiriam ao governo continuar a pagar a dívida, enquanto, ao mesmo tempo, se aumentam progressivamente os gastos sociais. Para levar a cabo esta política, como já dissemos, aumentam-se as deduções aos lucros das empresas petrolíferas e reestruturam-se as dívidas antigas com novos empréstimos obtidos no mercado interno e externo. Esta política não é prudente já que não leva em conta os perigos que ameaçam o Equador e a maioria dos países em desenvolvimento: um possível aumento da taxa de juros (uma parte importante dos novos empréstimos contraem-se com tipos de juros variáveis) e um abaixamento no preço do petróleo e outras matérias primas. Por outro lado, é muito provável que o CAIC identifique com toda a clareza as dívidas odiosas e ilegítimas. O Estado equatoriano continuará a reembolsá-las sob o pretexto de evitar tensões internacionais com os credores e tensões internas com os grandes grupos privados que controlam uma boa parte da economia do país? Este debate fundamental terá lugar em 2008. Rafael Correa tomará o caminho para uma solução soberana e justa à dívida ilegítima? É isso que esperamos mas não se pode garantir.
No âmbito da integração regional latino-americana, a criação do Banco do Sul que se tinha anunciado para Junho de 2007 atrasou-se devido às reticências do Brasil. Com este objetivo realizou-se no Rio de Janeiro uma reunião ministerial importante nos dias 9 e 10 de Outubro de 2007. Foram superados alguns obstáculos. Apesar da vontade do Brasil e da Argentina de rever a fórmula — um país um voto (ratificada em Maio-Junho de 2007) – que tinha sido proposta pelo Equador, parece que a reunião concluiu a favor deste princípio democrático.
O caminho das reformas sociais está semeado de obstáculos. Vários presidentes de esquerda foram eleitos na América Latina nestes últimos anos, que tentaram romper com a política neo-liberal dos seus antecessores mas muito poucos cumpriram as suas promessas. Esperemos que Rafael Correa não duvide e realize uma política democrática de justiça social. Na realidade, até agora a sua estratégia permitiu aumentar e consolidar o apoio popular a favor da mudança. Permitiu também criar as condições de uma mudança democrática das instituições. Reforçou a independência do país perante os Estados Unidos consolidando ao mesmo tempo um planejamento de integração latino-americano. Devemos considerar que foi dado um grande passo. (Fonte: Diário.info)
* Economista belga
Nenhum comentário:
Postar um comentário