13 novembro 2015, Jornal Notícias
http://www.jornalnoticias.co.mz (Moçambique)
Para garantir maior participação da mulher nas
diferentes áreas de actividade que possam contribuir para o desenvolvimento do
país, os governantes têm um papel fundamental no cumprimento das políticas
vigentes que visam capitalizar os valores éticos e morais através do seu
envolvimento no processo de construção do país.
Esta tese foi recentemente defendida na
Beira por mulheres académicas de diversos pontos do mundo durante a sua
participação no I Congresso Internacional sobre o Género e Segurança Alimentar
pela Sustentabilidade da África Austral, evento que foi organizado pela
Universidade do Zambeze (UniZambeze) que juntou mais de duas mil pessoas, na
sua maioria do sexo feminino.
Em entrevista
ao “Notícias” na Beira,
as nossas fontes afirmaram que há muitas políticas que foram aprovadas,
sobretudo as sobre os direitos da mulher, mas não são aplicadas integralmente
pelos governantes em termos de participação nos órgãos de tomada de decisão,
acesso aos serviços básicos, concorrendo deste modo para outros males de
desvalorização da mulher.
Apesar disso, elas reconheceram que
Moçambique tem-se destacado bastante ao nível da região de África, ao fazer
parte dos 12 melhores países que estão a se esforçar no cumprimento das mesmas.
Há grandes avanços – Generosa
Gonçalves, da UEM
Para a directora do Centro de Coordenação
dos Assuntos do Género na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), em Maputo,
Generosa Gonçalves, Moçambique tem estado a aplicar-se a fundo no empoderamento
da mulher através da sua participação nos diferentes ramos de actividade,
contribuindo, deste modo, no processo de desenvolvimento do país.
Aquela académica explicou que hoje nota-se
com muita satisfação a participação das mulheres nos cargos de chefia nas
diversas áreas de actividade, desde as políticas até as consideradas mais
chave, marcando assim uma diferença assinalável com os outros países, sobretudo
nos últimos anos.
Apesar desta melhoria, esforços devem ser
envidados pelas autoridades competentes no sentido de cultivar na mulher o
espírito de que ela é muito importante na sociedade através da sua formação
escolar.
“O país avançou bastante nos últimos tempos
na questão de empoderamento da mulher, do ponto de vista político. Neste
momento está a fazer um grande esforço para empoderar a mulher do ponto vista
económico e social. A nossa luta é que paralelamente ao empoderamento económico
se faça um grande trabalho para empoderar a mulher na questão social, porque ela
ainda é sujeita a vários males”, defendeu a académica.
Academias têm um papel – Beth
Ahlberg, presidente do órgão
Já a presidente das mulheres cientistas e
académicas de África, a queniana Beth Ahlberg, afirmou que, apesar de a
participação da mulher, sobretudo na política, educação e emprego, ter
melhorado nos últimos tempos em África, situando-se entre 30 e 40 por cento em
relação aos homens, as desigualdades de género ainda persistem, negando a esta
camada social os benefícios.
Ahlberg explicou que as academias devem
sempre auto-questionar-se em relação ao desenvolvimento, educação e pesquisas
efectuadas nas diversas áreas, de forma a ajudarem no alcance da inclusão
social, incluindo a igualdade de género.
Apontou que os casamentos prematuros, a
mutilação dos órgãos genitais e a saúde sexual reprodutiva continuam a matar as
mulheres, sobretudo em África, daí que as academias têm um papel preponderante
na pesquisa desses males para que se encontrem plataformas para se pôr cobro a
estas situações.
“Sobre os vários males que as mulheres
enfrentam as academias devem auto-questionar-se sobre o desenvolvimento
inclusivo em várias áreas, ir às comunidades para compreender as perspectivas
das pessoas, sobretudo das mulheres. Contudo, a participação da mulher nos
últimos anos avançou mas ainda temos de fazer muito porque não cumprimos com os
objectivos do milénio na componente da mulher”, sublinhou a queniana.
A fonte defendeu ainda a necessidade de
haver transdisciplinaridade nas pesquisas que as academias efectuam.
“Em África a busca de água para o consumo
tem sido tarefa exclusiva da mulher, cuidar das crianças, entre outras tarefas,
são incumbidas à mulher. Ora, as academias têm um papel fundamental na mudança
de comportamento”, aflorou a fonte.
Acrescentou que as academias devem
reflectir sobre o discurso desenvolvimentalista e a prática, de forma a
assegurar a implementação de políticas integradas que trazem conhecimentos
endógenos.
Há muito por se fazer para a
mulher – Glória Naene, da UniZambeze
Por seu turno, a directora do Gabinete das
Relações Internacionais na Universidade do Zambeze (UniZambeze),Glória Naene,
diz que apesar de se terem registado alguns avanços no empoderamento da mulher
ainda há muito por fazer, o que envolve todos os segmentos da sociedade civil.
Actualmente, segundo Glória Naene, as
mulheres ainda são sujeitas a vários males, desde a falta de acesso aos
serviços básicos, sendo da primeira necessidade até aos financiamentos para
desenvolver os seus projectos de geração de renda para a sua sustentabilidade.
“A mulher continua a ser marginalizada e
relegada ao último plano. Isso deve acabar, e ela deve ser vista como um
contribuinte maioritário para o crescimento do país. Ela pode fazer o que os
homens fazem, daí que a educação aqui é chamada a intervir alocando mais
escolas nas zonas rurais, sobretudo de alfabetização, para maior educação. Uma
mulher formada está mais pronta para conhecer os seus direitos e deveres”,
argumentou a fonte.
Disse ainda que o Governo deve adoptar medidas
apropriadas contra os que praticam a violência doméstica, tráfego, abuso
sexual, entre outros.
“Há muitas mulheres que são violentadas sem
denunciarem, sobretudo nas zonas recônditas, porque não conhecem os seus
direitos, daí que elas são exploradas. Deve haver um plano de educação nas
comunidades de forma que elas conheçam os seus direitos e deveres.
Práticas religiosas retrocedem
esforços – Maria Barbito, docente brasileira
Para Maria Barbito, docente de uma
universidade brasileira, algumas práticas religiosas estão a influenciar
grandemente na desvalorização da mulher, visto que na religião ensina-se que a
cabeça da mulher é sempre o homem.
Aquela académica é de opinião que a
promoção do empoderamento da mulher deve envolver todos os segmentos da sociedade
civil, com principal enfoque para as igrejas, onde se ensina os modos de
convivência.
“É na igreja que se aprende que o marido é
que tem o poder de decisão e há coisas que as mulheres não devem fazer que os
homens fazem, o que não é verdade. Ora, todos nós somos chamados a enfrentar
esta situação e dizer não. As mulheres são iguais aos homens e elas podem fazer
tudo e gozam dos mesmos direitos”, defendeu a brasileira.
Disse estar a constatar uma fraca
participação da mulher e valorização das suas capacidades nos meios de
convivência social e laboral como estando a contribuir para acentuar a sua
dependência em relação ao seu cônjuge.
“Temos de incutir na mulher que é possível
ser diferente mas com igual autonomia sobre os processos de tomada de decisão
na família e na comunidade. O importante é promover as acções de escolarização
das mulheres através de programas de educação de adultos, crédito, poupanças
bem como assistência jurídica”, referiu Barbito.
Igualdade não é tomar o lugar do
homem – Patrícia Kasarigilak, estudante sueca
Já a estudante universitária sueca e
participante no congresso, Patrícia Kasarigilak, referiu que falar de igualdade
não é tomar o lugar do homem mas é dar oportunidade à mulher de contribuir para
o desenvolvimento do país.
“Muita gente pensa que quando as mulheres
falam de igualdade de género querem tomar o lugar do homem. O que se pretende é
que haja uma convivência social e não discriminação”, referiu a fonte.
Afirmou ainda que em relação aos problemas
que afectam as mulheres são generalizados, porque estas são sempre relegadas ao
segundo plano.
Para pôr cobro à situação, as autoridades
governamentais e a sociedade civil devem desenhar políticas claras para que
haja um maior respeito à mulher, sobretudo a da zona rural, que mais sofre da
desvalorização, sobretudo da violência doméstica.
Laiton Sifa
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