12 de Maio 2015, Jornal de Angola (Angola)
Benjamim Formigo
Na sexta-feira decorreram 70 anos desde que no quartel-general de
Eisenhower, em Reims, o general Alfred Jold, comandante do Exército alemão,
assinou a rendição incondicional das tropas alemãs aos Aliados.
Na Europa, África e
Ásia 48 milhões de pessoas perderam a vida no pior dos conflitos que o Mundo
conheceu. Mais de metade foram civis.
Passadas sete décadas os Aliados dividiram-se em dois blocos, novas potências surgiram na cena internacional e as armas foram substituídas pelo dinheiro como forma de subjugar outros povos e regiões.
Os Estados da União
Europeia fizeram-se notar
pela ausência em Moscovo como forma de se
manifestarem contra o que consideram a interferência russa na Ucrânia. Os
restantes aliados foram incapazes de se unir como o fizeram no ano passado em
plena crise ucraniana, no aniversário do desembarque na Normandia a 6 de Junho
de 1944.A verdade é que desde o final da Segunda Guerra Mundial, fruto da Guerra Fria e da entrada dos Estados Unidos na economia europeia, a História tem sido reescrita.
Após a invasão da Polónia e a queda de França, em 1940, e da Batalha de Inglaterra entre o Verão e Outono de 1940, Hitler concebe a “Operação Barbarossa”. No ano seguinte, quebrando o pacto de não agressão assinado com Estaline, as tropas alemãs viram-se para Leste em Junho de 1941, numa ofensiva que parecia imparável, e quatro milhões de soldados alemães invadem a União Soviética.
Se Estaline assinou o pacto de não agressão como uma forma de ganhar tempo, a verdade é que o Exército Vermelho não estava totalmente recuperado das purgas estalinistas. Face a um terreno favorável, a Wehrmacht e as suas 600 mil viaturas blindadas progrediram rapidamente até aos arredores de Moscovo e aos subúrbios de Leninegrado. Na sua retirada, o Exército soviético e os civis queimaram tudo quanto pudesse apoiar os alemães e a sua logística, obrigando a linhas de abastecimento cada vez mais longas e vulneráveis.
A Luftwaffe estava desgastada pelas perdas materiais e humanas sofridas na tentativa de derrotar a RAF e conseguir a supremacia aérea que permitiria a Hitler tentar o desembarque em Inglaterra. A resistência soviética beneficiou de um misto de nacionalismo, historicamente presente no povo russo, e de recusa absoluta à submissão nazi.
Se a batalha por Moscovo foi um ponto essencial do desgaste alemão, a maquina militar nazi soçobrou no cerco a Leninegrado / Estalinegrado / São Petersburgo. Morreram no cerco milhões de russos, em combate, de fome ou de frio. Qualquer visita ao cemitério histórico é esmagadora quando se sabe o que ali se passou. Mas morreram também centenas de milhares de alemães. Com o apoio do general “Inverno”, o Exército Vermelho lançou uma contra-ofensiva que obrigou à retirada alemã e se transformou numa guerra de atrito, para a qual os alemães, desmoralizados, não estavam preparados.
A derrota alemã na Frente Leste foi, de facto, o ponto de viragem da guerra, foi a desmistificação da Wehrmacht como a Batalha de Inglaterra fora para a Luftwaffe.
A entrada dos Estados Unidos na guerra não foi, ao contrário do que se pretende hoje fazer crer, o factor decisivo da derrota nazi. Sem dúvida que o desembarque na Normandia teria sido muito complicado sem a força norte-americana, que pesou no abreviar da guerra e evitou que no teatro europeu fossem usadas armas atómicas, como viria a suceder na frente asiática. Milhares de americanos perderam a vida na Europa, o material e o petróleo vindo dos EUAforam cruciais. Mas a espinha dorsal nazi estava quebrada desde a derrota em Moscovo e, sobretudo, Leninegrado.
Por tudo isto, “snobar” Putin foi um erro político que em nada contribuiu para a estabilidade e segurança europeias.
A entrada dos Estados Unidos na guerra na Europa, depois do ataque japonês a Pearl Harbour, não foi apenas um acto em defesa da democracia. No seu primeiro encontro com Winston Churchill, o Presidente Roosevelt levava na agenda uma exigência: a independência gradual dos países do Império Britânico e das colónias dos aliados e a sua abertura ao comércio mundial para favorecer as populações locais, promover o desenvolvimento industrial desses países, melhorar condições sanitárias e o acesso à educação, limitado pelo colonialismo. Na reunião, a bordo de um navio ao largo da Terra Nova, Churchill acabou por ceder de forma tão relutante como dúbia.
O comércio com as colónias era a riqueza da Inglaterra. Truman sucedeu a Roosevelt e preocupou-se mais com a penetração económica americana na Europa e Ásia e uma frente unida contra a URSS do que com a Carta Atlântica assinada entre Roosevelt e Churchill.
Terminada a guerra nas suas várias frentes, Europa, Leste, África e Ásia, as independências foram varridas para debaixo do tapete. Inglaterra e França mantinham as suas colónias em África e na Ásia. Londres assinou a acta de independência da Índia, a sua “Jóia da Coroa”, em 1947. O documento dividiu o subcontinente em dois países: Índia e Paquistão, um hindu outro muçulmano, deixando áreas de definição complicada como o Punjab e Caxemira. A independência ocorreu, mas o conflito entre os dois países tem sido uma constante.
No Médio Oriente é conhecido o problema criado pela forma como foi constituído o Estado de Israel. África, o continente mais rico e mais explorado, manteve-se em luta até à independência do Zimbabwe e da Namíbia e o fim do apartheid.
Essas foram as mudanças políticas formais. As dependências económicas, históricas ou criadas mantêm-se em África e na Europa onde o poder financeiro substituiu as armas, mas em todo o lado numa situação bem mais pérfida. Na Segunda Guerra Mundial e nas Guerras de Libertação que se seguiram os campos estavam definidos, os inimigos ou adversários identificados, característica que se manteve durante a Guerra Fria.
No Século XXI o poder deixou de estar nas mãos dos políticos, em especial nos países desenvolvidos, para estar nas mãos dessas entidades sem rosto que são os mercados. A independência nacional, por todo o lado, é um compromisso entre a verdadeira soberania gerida por políticos nacionais e os limites que a finança e os mercados impõem ao seu exercício.
O princípio parece ser este: democracia sim, mas sem exageros que ponham em causa os interesses infiltrados. Será exagero dizer que os 70 anos não mudaram o Mundo? Talvez, que cada um o decida.
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