Por Paulino Neto
Luanda, 31 maio 2011 (AngolaPress) – Os Acordos de Bicesse, assinados a 31 de Maio de 1991 entre o Governo da República de Angola e a Unita, em Portugal, na Escola Superior de Hotelaria e Turismo de Estoril, e que marcaram a fase decisiva do fim de uma longa guerra civil, completam hoje, terça-feira vinte anos.
Embora não tenham trazido a paz definitiva para Angola, os Acordos de Paz transformaram consideravelmente a vida política angolana, pois, com a cessação das hostilidades, foram criadas condições, por pouco tempo, que projectaram o país para a democracia e a livre circulação de pessoas e bens.
Depois de cerca de trinta anos de dor, privações e luto, causados por uma guerra cruel e devastadora, o povo angolano teve, a partir da assinatura dos Acordos de Paz, a possibilidade de encarar com optimismo e confiança o seu futuro, mas tudo foi por “água abaixo”, devido ao reacender dos conflitos.
O conflito armado foi a causa principal da morte de mais de quatro mil pessoas, milhares de deslocados, centenas de crianças órfãs e da destruição de grande parte das infra-estruturas e a contracção de uma elevada dívida externa.
O escasso tempo de tranquilidade e paz relativa que os angolanos viveram mostraram que, sem guerra, Angola poderia dar, económica e socialmente, um pulo rumo ao desenvolvimento.
No acto da assinatura do documento, o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, disse que “o povo angolano e o país precisam de sossego e estabilidade inteira, precisam da compreensão e apoio da comunidade internacional para construir o seu futuro”.
Segundo o Chefe de Estado, “em todo este processo houve também uma bem sucedida conjugação de esforços a nível internacional, que ajudaram a atenuar as divergências e lançar as bases de uma convivência pacífica e aberta entre todos os angolanos”.
“Tenho a expressar em nome do povo angolano e do seu Governo, e também em meu nome pessoal, o mais vivo reconhecimento ao Governo da República Portuguesa, pela forma empenhada, isenta, sensata e sábia como exerceu o seu esforço de mediação entre o Governo angolano e a Unita”, reconheceu o Presidente.
Bicesse previa um “acordo de cessar fogo”, da responsabilidade do Governo de Angola e da Unita, actuando no âmbito da Comissão Conjunta Político-Militar (CCPM), criada nos termos de princípios fundamentais para a instauração da paz no país.
Segundo os acordos, a CMVF (Comissão Mista de Verificação e Fiscalização) teria a competência necessária para assegurar o efectivo cumprimento do cessar fogo, cabendo-lhe, nomeadamente, conhecer as áreas de localização das tropas, controlar o cumprimento das normas de conduta previamente acordadas para as tropas nas áreas de localização.
Com o acordo deu-se então início ao processo de democratização, que conduziu o país às primeiras eleições multipartidárias e presidenciais, realizadas nos dias 29 e 30 de Setembro de 1992.
Divulgados os resultados finais, ratificados pela então representante em Angola do secretário geral da ONU, Margaret Anstee, confirmaram que as eleições, realizadas de forma livre e justa e fiscalizadas por observadores internacionais, foram ganhas por maioria absoluta pelo MPLA, com 2.124.126 votos, correspondendo a 53,74 porcento.
Os resultados foram contestados pela Unita que, no período de paz, foi se rearmando, mergulhando novamente o país numa guerra sem precedente, ocupando ilegalmente as principais cidades de províncias, numa clara tendência de tomada do poder pela força.
Este acto surpreendeu a então representante do secretário geral da ONU, Margaret Anstee, que não acreditava ou nada fazia a volta das denúncias apresentadas pelo órgão reitor dos acordos, a CCPM.
Mergulhado numa nova guerra civil, o número de vítimas mortais triplicou comparativamente aos conflitos anteriores, assim como aumentaram os deslocados, a fome, a miséria e as destruições das infra-estruturas.
Com o “andar da carruagem”, as Nações Unidas enviaram a Angola o maliano Alioune Beye, em substituição de Margareth Anstee, com o objectivo de mediar novas negociações e encontrar uma solução africana ao conflito.
A partir daí, a capital zambiana, Lusaka, passou a albergar novas negociações entre o Governo e a Unita que, depois de mais de um ano de debates, a 20 de Novembro de 1994, foi rubricado o protocolo de Lusaka pelo então ministro das Relações Exteriores, Venâncio de Moura (Governo), e pelo antigo secretário geral da Unita, Eugénio Manuvakola.
Mesmo com o Acordo de Lusaka registavam-se constantemente ataques armados em várias localidades do país, até que, após negociações, sem a interferência de mediação estrangeira, os angolanos entenderam que havia a necessidade da cessação das hostilidades.
Assim foi assinado a 4 de Abril de 2002 o Memorando de Entendimento Complementar ao Protocolo de Lusaka, entre o Governo e a Unita, marcando o fim de um longo período de guerra.
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