segunda-feira, 24 de março de 2014

Moçambique/Código Penal: Parlamento recua

Portal do Governo http://www.portaldogoverno.gov.mz (Moçambique)

Os artigos considerados ofensivos e contra os direitos humanos, que constavam no Projecto de Lei para a revisão do Código Penal (CP), aprovada na generalidade pelo Parlamento moçambicano, em Dezembro de 2013, já foram retirados daquele documento há mais de um mês.

Esta informação foi avançada esta quinta-feira na sede da Assembleia da República (AR), pelo presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade, Teodoro Waty, minutos após a recepção de uma petição das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), no término de uma marcha de protesto contra os referidos artigos.

A petição foi entregue por Teresinha da Silva, coordenadora da organização Mulher e Lei na África Austral
(WLSA, sigla em inglês).

Waty explicou que os artigos em causa foram discutidos pela Comissão que decidiu retirá-los do Projecto de Revisão do Código Penal depois de concluir que feriam a dignidade e cultura moçambicana.

“Em sede da Comissão, discutimos o Projecto de Lei e chegamos a um consenso que foi retirar todos os artigos que colocam em causa os direitos humanos. Eu garanto que 100 por cento dos artigos apresentados na petição das OSCs, que acabou de ser entregue à Presidente da Assembleia da República, já não constam na revisão e foram retirados antes de Fevereiro”, asseverou Waty.

Criticou as OSCs, afirmando que elas não acompanham as actividades das comissões parlamentares.

“Isso pode parecer que as organizações de sociedade civil estão paradas no tempo”, disse Waty para de seguida acrescentar“convido todas as organizações a participarem nos debates da Comissão”.

Waty, que achou positiva a presença das OSCs no parlamento, disse ainda que a elaboração do relatório público da revisão do CP já está na fase final e espera que seja apresentado dentro de dias no plenário da AR.

Contudo, é estranho que Waty tenha feito estas declarações, pois a Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e Legalidade, depois de retirar os artigos em causa, remeteu-se ao silêncio total mesmo sabendo a preocupação da sociedade civil sobre o assunto.

Por isso, a marcha acabou por ter lugar na manhã desta quinta-feira em Maputo, tendo partido da Praça da OMM para terminar na sede da AR, onde entregaram a petição a Presidente do Parlamento, Verónica Macamo.

Os artigos que provocaram o ultraje das OSCs incluem os que tratam dos casos de violação de menores, de mulheres, idade para responsabilização criminal entre outros.

Por exemplo, na proposta do artigo 223, referente aos efeitos de casamento, determinava que o violador tenha a sua pena suspensa ao casar-se com a vítima (violada sexualmente), agravando o seu sofrimento em nome da honra da família.

No seu entender, as OSCs repudiam a formulação por considerar que não só despenaliza a violação, como protege o violador.

No caso do artigo 218, referente a violação, as OSCs afirmam que a lei só considera violação a “cópula ilícita”, deixando de proteger as mulheres casadas violadas pelo marido. O mesmo artigo não considera outras formas de violação sexual, como as relações sexuais por via anal, oral ou a introdução de objectos na vagina e ânus em indivíduos de ambos sexos.

Citada pela AIM, a presidente da Liga Moçambicana dos Direitos Humanos (LDH), Alice Mabota, disse que as mulheres moçambicanas tinham decido fazer tudo ao seu alcance para forçar retirada daqueles artigos.

“Se o Parlamento moçambicano deixar passar os artigos da forma como estão, nós as mulheres moçambicanas prometemos despir e manifestar nas avenidas, como forma de mostrar o nosso repúdio”, disse a presidente da LDH.

Falando durante a recepção da petição, a Presidente da AR garantiu a delegação das OSCs que no processo da revisão do Código Penal foi acautelada a questão cultural e civil, uma vez que “a Casa do Povo trabalha em consonância com a Constituição da República e com as demais leis em vigor no país”.

“Recebemos a vossa inquietação e vamos respeitar os vossos pontos de vista. A Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade está neste momento a avaliar, artigo por artigo, do Código Penal e creio que vai respeitar todos os pontos de vista. Estamos juntos”, considerou a presidente do parlamento.

A manifestação, que teve seu início na Praça da OMM, tinha como destino final o edifício da AR. Mas a marcha acabou por terminar a cerca de 300 metros devido ao forte cordão de segurança montado pela Força de Intervenção Rápida (FIR).

Participaram na marcha, a ActionAid Moçambique, a Associação Moçambicana das Mulheres de Carreira Jurídica, Associação Moçambicana dos Juízes, CECAGE, Centro Terra Viva, Fórum da Sociedade Civil para os Direitos da Criança (ROSC), Fórum da Terceira Idade, Fórum Mulher, Liga Moçambicana dos Direitos Humanos, Mulher, Lei e Desenvolvimento (MULEIDE).


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