quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Mais de 3 milhões fazem greve geral histórica em Portugal

25 novembro 2010/Vermelho http://www.vermelho.org.br

A luta dos trabalhadores em Portugal, com projeção para todo o continente europeu, teve na última quarta-feira (24) um momento elevado. Mais de três milhões de trabalhadores realizaram a maior greve geral do país, num clamoroso protesto contra as medidas antipopulares, inspiradas pelo mais tacanho conservadorismo, a mais reacionária visão econômica e pelo neoliberalismo, aplicadas por um governo, na prática, de direita liderado por um partido que se diz “socialista”.

O líder da CGTP, Carvalho da Silva, disse que foi a “greve geral com mais impacto até hoje”. Ele insistiu na reivindicação de aumento do salário mínimo para 500 euros em 2011 e de reposição dos apoios sociais cortados nos últimos meses.

Contrariamente ao sentimento claramente manifestado pelos trabalhadores portugueses, a ministra do Trabalho, Helena André, disse que a margem de manobra para alterar as políticas que estiveram na origem da greve "é nula".

Entretanto, os secretários gerais das duas centrais sindicais que organizaram a greve geral, Carvalho Silva, da CGTP, e João Proença, da UGT, manifestaram a confiança de que a greve – que teve particular expressão nos transportes, educação, saúde, autarquias e empresas do setor público – vai contribuir para mudar as políticas. "Vai ter efeitos no imediato e no futuro", disse o líder da CGTP, que destacou a "transversalidade" do protesto e a adesão de muitos "setores e camadas de trabalhadores com qualificações diversas”.

"Não podem ser só os trabalhadores a pagar a fatura. Assim, não. Não é por este caminho", reforçou o secretário-geral da UGT.


Para além da luta pela reposição da proteção social dos trabalhadores, a questão central para os sindicatos é o "combate ao desemprego".

O secretário geral do Partido Comunista Português, Jerônimo de Sousa, considerou o nível alto de adesão à greve uma derrota do “conformismo e da resignação”.

Ele emitiu uma declaração, reproduzida a seguir na íntegra:


Grande jornada de luta: mais de três milhões de trabalhadores envolvidos na greve geral

Hoje por todo o país os trabalhadores fizeram ouvir a sua voz. A Greve Geral de 24 de novembro convocada pela CGTP-IN, uma das mais importantes jornadas de luta realizada em Portugal depois do 25 de abril, constituiu uma poderosa resposta à brutal ofensiva do governo PS e do PSD, e de todos aqueles, como é o caso do Presidente da República, que têm patrocinado o rumo de desastre nacional imposto ao país.

Uma grande greve geral que ficará inscrita na história da luta dos trabalhadores e do povo português que teve o envolvimento de mais de três milhões de trabalhadores. Uma vitória sobre a resignação e o conformismo. Uma jornada que, pela sua dimensão, reafirmou o valor maior da luta.

1. O PCP destaca a dimensão nacional e o carácter transversal da greve geral. Por todo o país, no continente e regiões autônomas, registou-se uma adesão extraordinária na generalidade dos setores de atividade.

O PCP sublinha a importância e significado das fortes adesões no setor dos transportes como o Metro Lisboa, Porto e Sul do Tejo, Soflusa, Transtejo, CP, Refer, EMEF e em dezenas de empresas rodoviárias como é o exemplo dos STCP, Carris, Rodoviária Entre-Douro e Minho, Grupo Barraqueiro e a Transdev. O encerramento de todos os portos marítimos e grande parte dos portos de pesca e o cancelamento da totalidade dos voos (mais de 500). A greve geral assumiu ainda forte impacto no setor produtivo de que são exemplo: no setor automóvel a Auto-Europa e todo o seu complexo industrial, a Renault-Cacia, a Mitsubishi, Tudor e Camac; no setor da metalurgia e metalomecânica como os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, o Arsenal do Alfeite, a Lisnave, a Sacti, Jado Ibéria, Camo; no setor de cimento, cerâmica e vidro, a CNE, a Atlantis/Vista Alegre, SaintGobain/Covina, a Cinca e Lusoceran; no setor corticeiro o Grupo Amorim; no setor têxtil, vestuário e calçado o Grupo Paulo Oliveira, Têxtil Almeida e Filhos, Califa, Triunph e KIAIA; no setor alimentar e bebidas a CentralCer, Kraft Foods; e em centenas de outras empresas de outros setores produtivos.

O PCP sublinha ainda a grande resposta dada pelos trabalhadores da administração pública central e local com paragens que atingiram níveis históricos com paralisação total ou parcial em praticamente todo o país da recolha de resíduos sólidos, encerramento de centenas de escolas, politécnicos e faculdades, departamentos públicos, finanças, tribunais e outros serviços públicos como foi do caso do setor da saúde com uma forte adesão dos trabalhadores do setor.

O PCP valoriza ainda a dimensão e os impactos que a adesão de milhares de trabalhadores teve em diversos setores e empresas, como os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, o caso dos mais de 400 balcões da CGD encerrados, assim como de outros bancos e de praticamente todos os postos dos CTT, e das importantes e significativas adesões registadas nos trabalhadores dos hiper e supermercados, auto-estradas e centros de contato.

Uma dimensão tanto mais valorizável quanto construída sob a pressão e chantagem sobre os trabalhadores. Pressão ideológica sobre a alegada inutilidade da luta; chantagem decorrente da imposição ilegítima de serviços mínimos que visam condicionar o direito à greve; pressão econômica, dirigida sobretudo a trabalhadores com vínculo precário, com a ameaça de demissão e de perdas nas remunerações (prêmios); e o condicionamento ilegal com o recurso em vários casos à força por parte da PSP e da GNR para dar cobertura à violação do direito à greve.

Um êxito tanto mais assinalável quanto centenas de milhares de trabalhadores se vêem confrontados com situações de endividamento e com o agravamento do custo de vida. Trabalhadores para quem, a realização de um dia de greve implica prescindirem de um dia do seu salário.

Esta greve geral veio do coração de cada empresa ou local de trabalho, da inabalável e consciente opção de cada trabalhador. Veio do sentimento de protesto, indignação e luta de milhões de trabalhadores que quiseram dizer “Basta”. Basta de injustiças! Basta de sacrifícios para os mesmos de sempre. Uma greve geral que constitui um momento singular de afirmação de dignidade dos trabalhadores portugueses.

2. Esta greve geral foi uma justa e necessária jornada de luta contra o roubo nos salários e pensões. Contra os cortes nas prestações sociais, no abono de família ou no subsídio de desemprego. Contra o aumento dos preços dos bens e serviços essenciais como os transportes ou os medicamentos. Contra a destruição dos serviços públicos e a privatização de empresas estratégicas.

Esta greve geral foi uma justa e necessária resposta ao agravamento do desemprego, ao alastramento da precariedade, ao empobrecimento de vastas camadas da população. Uma justa e necessária resposta ao processo de liquidação do aparelho produtivo, ao crescente endividamento do país e à perda de soberania nacional.

Esta greve geral foi uma justa e necessária resposta contra a escandalosa acumulação de lucros por parte dos grupos econômicos e financeiros que, em nome da crise e do déficit das contas públicas, querem impor o agravamento da exploração dos trabalhadores e o esbulho dos recursos nacionais.

3. O PCP saúda todos os trabalhadores portugueses pela sua participação nesta greve geral.
Saudamos em particular os milhares de jovens trabalhadores que, pela primeira vez, participaram numa jornada de luta desta envergadura, elemento de incontornável valor político que se projeta como uma importante garantia para o futuro.

O PCP saúda a CGTP-IN, o movimento sindical unitário e todas as estruturas representativas dos trabalhadores pela sua ação e capacidade de organização demonstradas. A CGTP-IN confirma-se e afirma-se como a grande central sindical dos trabalhadores portugueses, referência incontornável para a defesa dos interesses dos trabalhadores e para o futuro do país.

4. Esta greve geral não foi um ponto de chegada, mas uma etapa numa exigente e prolongada luta que a situação nacional exige. Depois da realização desta greve geral, nada ficará como antes. O governo e os partidos que apoiam a sua política e o presidente da República que a patrocina tiveram nesta jornada de luta uma clara condenação, um sério aviso e uma firme exigência de ruptura com a política que promovem.

A greve geral constitui uma poderosa manifestação dos trabalhadores e do Povo português da sua disponibilidade para impedirem o prosseguimento da atual política, para serem parte determinante da ruptura e mudança de que o país precisa.

O PCP esteve ao lado desta greve geral porque está com a luta dos trabalhadores, porque está comprometido com a exigência de aumento dos salários, de desenvolvimento do aparelho produtivo, de aposta no investimento e nos serviços públicos. O PCP esteve e está com a luta dos trabalhadores porque a sua luta é a luta por um país de progresso, de justiça social, por um Portugal soberano e independente.

Renovando o seu compromisso de sempre com esta luta, o PCP reafirma aos trabalhadores e ao povo português que podem contar com o PCP. (Da redação, com agências)


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Portugal/CRISE: NÃO HÁ APENAS UMA SAÍDA

23 novembro 2010/ODiário.info http://www.odiario.info

José Paulo Gascão

José Paulo Gascão denuncia neste texto uma das campanhas de desinformação em curso, a de que a única saída da crise é dentro do sistema capitalista. E depois de contactar que o capitalismo não é reformável, afirma: “Desenganem-se os que pensam que nos parlamentos se pode ir criando condições para reverter a situação. Particularmente com a ditadura mediática dos media apelidados de referência, os parlamentos são um instrumento do capital monopolista.”

«Hoje, Sócrates é já um cadáver político e muitos dos que estão calados apenas esperam que o desenvolvimento dos acontecimentos lhes diga o momento oportuno de reconhecer o óbito. O cadáver político está aí, a família que o enterre.»

A frase em epígrafe, escrita em Fevereiro do ano passado, vinha ao arrepio das notícias e comentários dos media de referência. Então, os meios de comunicação ainda promoviam José Sócrates que, dando sequência ao trabalho iniciado por Mário Soares, completara já o processo de fusão ideológica do PS com a direita e consolidara a sua rendição incondicional ao capitalismo e ao neoliberalismo.

A profunda crise sistémica do capitalismo há muita prevista, uma crise económica, financeira, social, cultural e moral que varre o mundo, foi em Portugal agravada pelas consequências da adesão à União Europeia: destruição da agricultura e desmantelamento das pescas e da indústria transformadora…

A eleição em Março passado de Passos Coelho, tal como Sócrates um impreparado político, pouco culto, sem passado nem futuro políticos, não permitiu aos media começar de imediato a reflectir a retirada do apoio do grande capital a Sócrates. Era preciso que as medidas impostas pelos monopólios recaíssem sobre Sócrates, o chefe do turno cessante.

Ao reunir primeiro com Passos Coelho na sede do PSD, em 13 de Outubro último, seis meses e três PECs passados, e só no dia seguinte com Teixeira dos Santos (nestes casos nunca há dificuldades de agenda…), o grande capital quis dizer, inequivocamente, quem concitava agora seu apoio. A substituição de Sócrates pelo seu ministro das Finanças na reunião do dia seguinte foi o recurso diplomático para disfarçar o vexame.

Depois sim, a imprensa já podia dar continuidade à manobra. E deu: a maioria dos sábios económicos do costume que enxameavam a comunicação social foram substituídos, Sócrates deixou de ter os favores da imprensa que dele passou a fazer o retrato óbvio: o de um político impreparado, sem ideias nem convicções, que foi publicitariamente promovido como se de uma pasta dos dentes se tratasse. E muitos dos que ao longo dos últimos o incensaram passaram, sem pudor, a ser os seus mais cáusticos críticos.

A POLÍTICA EUROPEIA PARA A RECUPERAÇÃO DO CAPITAL

O rebentar da crise e o seu desenvolvimento não destruiu apenas os mitos do desenvolvimento contínuo do capitalismo e o do seu benefício comum para o trabalho e o capital. Pôs também a nu que ela é uma consequência inevitável do próprio sistema capitalista, evidenciou as tensões entre os imperialismos norte-americano e europeu e evidenciou ainda a conflitualidade de interesses no seio da União Europeia.

No entanto, ainda não é claro para a uma parcela significativa da classe trabalhadora e do povo que a União Europeia, um instrumento do capital monopolista europeu, aproveita a crise do capitalismo para exigir aos governos uma redução drástica dos salários e dos direitos sociais conquistados ao longo de décadas. Como não está claro que o objectivo é a recuperação do capital fictício perdido com o rebentar da crise pela banca e por outros grupos monopolistas, à custa de um corte dos salários e pensões e uma diminuição crescente dos direitos sociais.

Para os grupos monopolistas e a União Europeia as medidas tomadas são ainda pouco. Se antes da aprovação do Orçamento de Estado (OE) na generalidade este era um «documento fundamental para acalmar os mercados», logo no dia seguinte á sua aprovação a Comissão Europeia, congratulou-se com a sua aprovação, mas não deixou de acrescentar que «era necessário uma redução do deficit mais rápida» e os juros da dívida pública começaram uma vez mais a subir.

Eram previsíveis estes comportamentos. Já no 1º dia de debate sobre o OE, na SIC notícias, Morais Sarmento (PSD) e Francisco Assis (PS) lamentavam o tom em que decorrera o debate, o que dificultava futuros acordos para novas medidas gravosas para a classe trabalhadora, tendo este último deixado escapar: «… até porque lá para Maio vamos ter que negociar outro PEC».

Antes mesmo do início da discussão do OE na Assembleia da República, à saída da reunião da Comissão Política onde Sócrates explicou o acordo PS/PSD Almeida Santos, presidente do PS, comentou: «Os sacrifícios que estão a ser exigidos ao povo não são sacrifícios incomportáveis. Oxalá que o país nunca tenha de enfrentar sacrifícios maiores. As crises não são só do governo, são do povo, e o povo tem que sofrer as crises como o governo as sofre»!

Michael Hudson, um insuspeito Professor da Universidade de Missouri, em 30 de Setembro resumia em New Economic Perspectives objectivo da UE nesta citação: «O objectivo é baixar os salários cerca de 30% ou mais, até níveis de depressão, pretendendo que isso “deixará mais excedentes” disponíveis para pagar o serviço da dívida. (…) Trata-se de um projecto de reversão da era das reformas democrático-sociais que a Europa conheceu no século passado».

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Na sua queda, Sócrates arrasta o PS para uma derrota profunda e muitos do que estiveram anos calados acham que é este «… o momento oportuno de reconhecer o óbito» político do chefe até agora incontestado.

O governo dá crescentes provas de desagregação e até de desorientação: ministros e secretários de Estado desdobram-se em contradições, confrontos e disparates.
À classe trabalhadora e às restantes classes e camadas exploradas resta um caminho: lutar e aprender com a vida que o capitalismo não é reformável e nesta sua fase senil pode mesmo conduzir a Humanidade a uma nova barbárie.

Desenganem-se os que pensam que nos parlamentos se pode ir criando condições para reverter a situação. Particularmente com a ditadura mediática dos media apelidados de referência, os parlamentos são um instrumento do capital monopolista.

Como sem rebuço reconheceu o bilionário norte-americano Warren Buffet, numa frase que deve causar arrepios nos media portugueses, «Existe uma guerra de classes, é verdade, mas é a minha classe, a classe dos ricos, que está a fazer a guerra, e nós estamos a ganhá-la».

O caminho será provavelmente longo até que a classe trabalhadora inverta a situação e passe á ofensiva. No entanto, essa importantíssima alteração da correlação de forças só será possível quando, e enquanto, a luta e classes for conduzida nas suas três formas, teórica, política e económica, de forma coordenada e interligadas entre si.

Só assim poderá transformar-se a justa revolta de hoje contra a injustiça na luta pela transformação do país e do mundo.

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