segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Angola/OS LIMITES DA TOLERÂNCIA

24 fevereiro 2014, Jornal de Angola EDITORIAL http://jornaldeangola.sapo.ao (Angola)

Os Aliados derrotaram o nazismo e o fascismo na II Guerra Mundial mas não se limitaram a obrigar os derrotados a assinar a capitulação.

Os horrores cometidos pelo regime de Hitler e Mussolini foram tantos, a Humanidade foi de tal forma dilacerada, que os políticos da época tomaram medidas legais para que nunca mais nenhum líder político ousasse exterminar seres humanos em nome da supremacia de uma raça e a pureza de uma ideologia. As Leis Fundamentais passaram a incluir um artigo onde é taxativamente proibido propagandear e defender a ideologia nazi e fascista.

O Tribunal de Nuremberga julgou os dirigentes do III Reich e os que tiveram mais responsabilidades no governo da Alemanha nazi foram condenados a prisão perpétua. Ainda hoje, guardas dos campos de extermínio e funcionários do regime são presos e condenados. Não pode haver contemplações para com aqueles que ocuparam países soberanos, exterminaram milhões de seres humanos, provocaram o êxodo de outros tantos, para dominarem o mundo extinguindo a democracia e irradiando a liberdade.

Angola viveu esses anos particularmente dolorosos sob o regime fascista de Lisboa, que fez do nosso país um imenso campo de concentração e não hesitou em recorrer ao extermínio daqueles que se opuseram à ocupação estrangeira. Mas o regime salazarista também flagelou os portugueses, enviou-os para o Tarrafal ou assassinou os democratas. Por isso, a Constituição da República Portuguesa saída do 25 de Abril proíbe a propagação da ideologia fascista. A democracia tem que se defender dos seus inimigos jurados, que tudo fazem para destruí-la.

Jonas Savimbi destruiu Angola. Exterminou milhares de angolanos. Provocou o êxodo de milhões, escorraçados pelos seus esquadrões de extermínio. Destruiu escolas, hospitais, igrejas, edifícios públicos, pontes, portos, aeroportos, barragens, caminhos-de-ferro. Nem os fundos do “Plano Marshal” conseguiriam cobrir tantos estragos. Hitler fez tudo isso é nome de uma Alemanha imperial. Savimbi queria apenas a cadeira do poder. Hitler defendia o nacional-socialismo. Savimbi só queria dividir Angola. O seu programa máximo era criar uma “república negra” a Sul do Kwanza.

Hitler partiu para o extermínio e destruição de países e povos

, com o apoio do fascismo italiano, personificado em Mussolini. Teve sob o seu mando legiões de fascistas portugueses e espanhóis, sobretudo na frente russa. Savimbi também teve a ajuda dos nazis do apartheid. Mas além de Pretória, também conseguiu aliados em Lisboa e noutras “democracias ocidentais”.

Mas o nazi que destruiu Angola e exterminou milhares de angolanos teve companhia fiel na direcção do seu partido. Altos dirigentes da UNITA acompanharam o chefe sem hesitar. Até ao dia 22 de Fevereiro de 2002, esses políticos podiam alegar desconhecimento dos crimes por ele cometidos. Mas a partir dessa data, é imperdoável que ainda não conheçam a dimensão da tragédia que se abateu sobre Angola, depois das eleições de 1992 e que foi desencadeada por Savimbi.

Hoje nenhum dirigente da UNITA que acompanhou Savimbi pode alegar que não sabia que as eleições de 1992 foram livres e justas. Elas foram escrutinadas pela ONU, pela Troika de Observadores (Portugal, EUA e Rússia) e pela Comissão Eleitoral, onde estavam representados todos os partidos inclusive a UNITA. Todos chancelaram os resultados eleitorais. Menos Savimbi. Só por loucura esses dirigentes podem acreditar que estão todos errados, menos o chefe. Ainda que ele tivesse razão, nada o autorizava a tirar dos esconderijos as armas, os matadores e regressar à guerra. Se existiam erros, eles tinham de ser corrigidos no diálogo e na concertação, nunca na guerra.

Os dirigentes da UNITA de hoje e que ontem acompanharam de perto Savimbi não podem dizer que desconhecem as vítimas do Cuito, do Huambo, do rio Cubal, do Uíge, de Malanje, do Cuanza Sul, de todo o país. Porque os seus matadores exterminaram angolanos em todos os locais onde impuseram a lei da força onde existia a autoridade do Estado.

A maioria dos deputados constituintes, seguindo uma linha de clemência e para cimentar a reconciliação nacional, não incluiu na Constituição da República a proibição de propagandear a ideologia nazi seguida por Savimbi e a existência de organizações que defendam esse regime. A direcção da UNITA, comandada por ajudantes e seguidores do exterminador, serve-se da generosidade dos que derrotaram o projecto totalitário savimbista para enaltecerem a figura de um criminoso de guerra, um cruel violador dos direitos humanos e um aliado do apartheid, que foi o maior crime que alguma vez se cometeu contra a Humanidade.

Nas democracias avançadas, os seguidores de Hitler vão presos. Na nossa democracia são tolerados. Mas em nome das vítimas de Savimbi, o Estado é chamado a acabar com a propaganda da sua ideologia e a glorificação dos seus feitos criminosos. Os dirigentes e deputados da UNITA não podem estar ao mesmo tempo com o nazismo e a democracia.


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