8 abril 2012/ODiario.info http://www.odiario.info (Portugal)
João Proença está preocupado pelo que imagina ser o perigo de uma “colagem” de deputados do PS ao PCP e ao BE. Ainda mais preocupado deveria estar com o que sentem os eleitores do PS que, vendo a “austeridade” cair-lhes em cima e o PS a lavar daí as mãos, são capazes de perceber que gastaram mal o voto e podem mesmo ir-se “colar” a outro lado, onde se luta e resiste. Muitos estiveram certamente na Greve Geral que tanto contrariou João Proença.
1. Ao contrário do que muitas vezes parece, nem tudo são catástrofes, crimes perversos, alocuções do primeiro-ministro e outras desgraças, nos tempos informativos da televisão portuguesa: há frequentes momentos que são excepção a essa provável regra geral e que, exactamente pelo seu carácter excepcional, podem abrir caminho a algumas reflexões optimistas, ou perto de o serem, nas cabecinhas massacradas dos telespectadores. Foi, por exemplo, o caso de umas breves declarações do engenheiro João Proença, secretário-geral da UGT, transmitidas no passado domingo. De passagem, registe-se que João Proença havia sido abordado pelos jornalistas quando entrava para uma reunião do Conselho Nacional do Partido Socialista. Havia de ser Arménio Carlos a entrar para uma reunião do Comité Central do PCP e logo vozes escandalizadas se levantariam contra a falta de independência política do líder da CGTP. Mas passemos adiante, que outros aspectos nos esperam.
2. Foi assim que ouvimos João Proença, decerto na sua condição de dirigente nacional do PS, dizer que alguns socialistas pretendem «colar» o seu partido ao PCP e ao BE. Em verdade, pareceu-me que Proença se referia especial e concretamente a deputados PS e aos desacordos que terá havido no seio do grupo parlamentar socialista a propósito das recentemente votadas leis ditas do trabalho que reduzem os trabalhadores portugueses a um vastíssimo grupo de párias sem direitos efectivos, sempre à mercê da vontade (dos interesses, da possível insaciadade, dos eventuais maus humores) dos seus patrões. Talvez a preocupação de João Proença tenha sido afinal excessiva: feitas as contas, os deputados socialistas votaram em obediência à orientação decidida por Pôncio Pilatos, perdão, por António José Seguro, com a única excepção da deputada Isabel Moreira, por sinal neta de Adriano Moreira, que foi líder do CDS quando este ainda não era PP. Mas a inquietação do secretário-geral da UGT pode ter motivações mais alargadas ou, pelo menos, dar alguma esperança aos cidadãos telespectadores que, optimistas talvez até ao absurdo, ainda não desesperaram de um dia verem um PS verdadeiramente socialista.
3. Contudo, a questão é que nem todos os militantes, meros apoiantes ou apenas ocasionais votantes do Partido Socialista, são deputados, e que Proença pode ter pensado para lá das bancadas de São Bento. Não é preciso ter grande imaginação para adivinhar que são muitos milhares, de uma ponta a outra deste Portugal saqueado, os trabalhadores até agora incluíveis na «área PS», digamos assim, que estas novas leis laborais vão lançar no desemprego, na angústia, na pobreza, no desespero, no recurso à caridade alheia, na fome para si próprios e para os seus. Sem que, de resto, essa violência sofrida, infamemente crismada de «sacrifícios» pelos que a impõem, seja minimamente útil à recuperação do País, pois é óbvio que a redução de um povo à miséria não é caminho para o crescimento económico e financeiro, sendo-o, sim, para uma acrescida sobreexploração da mão-de-obra. Neste quadro, talvez João Proença se tenha apercebido de que a tendência para uma «colagem» ao PCP, e porventura também ao BE em alguns casos, surja naturalmente nos cidadãos que, tendo confiado no PS, porque «socialista», se sentem agora traídos sem margem para quaisquer dúvidas. Descubram, enfim, a verdade das coisas.
4. Entende-se, assim, a preocupação de João Proença, dirigente PS e líder UGT. Mas essa provável preocupação e o que estará por detrás dela foram, afinal, uma boa notícia para os que estão não apenas do lado dos trabalhadores mas sim, de um modo mais amplo, do lado da realidade e dos factos contra os embustes e as diversas formas de anestesia. Talvez até Proença suspeite de que mesmo alguns deputados PS, até entre os que acabaram por obedecer, não estão conformados com a situação de colaboracionistas que lhes foi imposta. Amplia-se, pois, a boa notícia. Má para João Proença, é certo. Mas «é a vida!», como se diria citando uma frase inesquecida do exilado António Guterres.
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