segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Moçambique/POBREZA URBANA: LEVANDO O CIDADÃO A FAZER MELHOR O QUE JÁ FAZ, COM PERSPECTIVA DE CRESCIMENTO

7 janeiro 2010/Armando Guebuza Blog http://armandoguebuza.blogspot.com

Foi uma vez mais muito agradável interagir com os nossos compatriotas internautas. As diferentes intervenções demonstraram que afinal tanto a toponímia como a padronização das línguas moçambicanas são mesmo temas da actualidade.
Também nos apercebemos que muitos dos que estão a participar neste debate são jovens, alguns dos quais com informação muito importante sobre a história dos nomes de certas localidades e a forma como esses nomes se deveriam escrever. Felizmente, temos agora o Instituto de Nomes Geográficos de Moçambique que, acreditamos, vai ter também nestes internautas valiosos informantes.

Não estamos a fechar este interessante debate mas gostaríamos de trazer um outro assunto para reflexão: a pobreza urbana.

Um dos nossos próximos desafios será o reforço das nossas acções de luta contra a pobreza no meio urbano. Vários factores estão por detrás dos níveis de pobreza que se registam nas nossas cidades e vilas, um mal que é agravado pelas condições de higiene e saneamento bem como pela forma precária de organização e funcionamento dos diferentes serviços e pelos baixos níveis de exploração das oportunidades de crescimento e afirmação desses empreendimentos.

O emprego apresenta-se como um dos fundamentos para a luta contra a pobreza no meio urbano. Porém, os postos de trabalho gerados pelos sectores público e privado revelam-se insuficientes para abranger os muitos compatriotas desempregados ou no sub-emprego. Olhando para a realidade das nossas cidades e vilas vemos que existem muitas oportunidades para geração de emprego que deveríamos explorar. Vamos de seguida dar alguns exemplos.

Com o aumento da frota de viaturas, a actividade de reparação mecânica e serviços afins está a conhecer um rápido crescimento. Todavia, a esmagadora maioria das oficinas são precárias ou improvisadas. Não parece estar embutida nalguns destes operadores a visão de crescimento e de especialização. Conhecemos algumas destas oficinas há anos e ainda hoje funcionam da mesma maneira. Temos que despertar nestes compatriotas a necessidade de se fixarem de forma mais organizada, de se registarem, de formarem associações e de criarem a sua base de capital para assegurar futuros investimentos. O mesmo se aplica aos moçambicanos que limpam ou guardam viaturas em mercados, repartições ou locais de culto. Há coisas que eles podem fazer melhor para merecerem confiança e atraírem mais clientes.

Os latoeiros, barbeiros, engraxadores, pedreiros, electricistas, canalizadores, alfaiates, modistas, reparadores de electro-domésticos e operadores de outros serviços similares podem ter a sua própria organização, o seu próprio espaço de trabalho, as suas formas de contacto e, até avançarem para um directório público. Organizados estarão em condições de obter certificação oficial, definir regras de funcionamento e de ética bem como diferenciar entre o mestre, o ajudante e o aprendiz.

No domínio dos transportes temos visto compatriotas a trazerem novas invenções para o mercado. Temos aquele inventor do Búzi que já registou uma motorizada e um carro da sua criação, o do Chokwe que patenteou o seu carro e o do Nanhupo-Rio que diz que está sempre a inventar mais uma coisa de utilidade pública. Uma das nossas perguntas é: quem é que vai produzir a nova geração de txova, com pedais ou motor, para trazer maior eficiência e comodidade no transporte de bens de e para os mercados?

Nas cidades e vilas regista-se o aumento de indústrias, como a de fabrico de sumos, partir da fruta fresca, de confecção de bolos bem como a de produção de blocos. No mesmo contexto, multiplicam-se oficinas de carpintaria, de serralharia e de estofaria. Estas indústrias, que são iminentemente caseiras, operam, muitas vezes, sem controlo de qualidade, sem condições aceitáveis de higiene e segurança no trabalho e não se guiam pela escala de operação. São, portanto, de carácter precário, faltando-lhes orientação profissional, organização e gestão para se tornarem empresas com condições para crescimento e até especialização. A necessidade de profissionalização destes serviços, sua organização e categorização de quem lá trabalha revela-se importante.

Nas vilas e cidades existe muito potencial para o nascimento e afirmação de novas indústrias caseiras organizadas nos moldes como os descritos acima. Estes são os casos das indústrias de cestaria decorativa, artefactos turísticos, bordados, batik e tapeçarias. Nesta, como noutras áreas, a inovação, a criatividade e o empreendedorismo podem ser incentivados para a criação de mais postos de emprego, factor importante na luta contra a pobreza urbana. Nesta dinamização da actividade social e económica podem nascer centros de difusão de tecnologias, de venda de acessórios e de centros de formação com a devida certificação. Revistas e jornais podem encontrar fontes de notícias para divulgação de casos de sucesso.

Na actividade comercial, o sector informal gera muitos postos de emprego mas melhor organizado poderia gerar muitos mais ainda. A melhoria das condições de higiene e conservação dos produtos bem como de apresentação, com farda, do vendedor podem atrair muitos mais clientes aumentando a sua renda. Ficamos muito impressionados com a informação que a ASSOTSI nos prestou em Outubro último segundo a qual para além de venderem produtos de terceiros estavam a considerar dedicar-se à produção agrária, a partir de 2010. Quer dizer, eles querem passar a fornecedores de alguns dos produtos para o consumidor o que pode contribuir para baixar o preço desses produtos e aumentar mais ainda a sua renda.

Ainda no sector informal, consideramos que as barracas poderiam ser associadas a actividades lúdicas como jogos de bilhar e à boa culinária moçambicana, com ementas variadas. A ideia seria que as barracas passassem a ser locais que atraem muitas mais famílias que buscam o repouso, a diversão e a boa comida. Por outro lado, uma melhor organização dos bares, restaurantes, quiosques e similares contribuiria para elevar os níveis de empregabilidade e das condições de trabalho para os trabalhadores.

O turismo está em franco crescimento criando, para os nossos compatriotas, outras oportunidades para combaterem a pobreza. O transporte dedicado, os guias turísticos, as exposições, mercados e feiras de obras de arte e cultura são exemplos do que pode ser feito nas nossas cidades e vilas.

Nas praias, para além da melhoria das condições de higiene dos locais para “comes e bebes”, existe a oportunidade de serviços diversos como são os casos de venda de folhetos com informações diversas, de aluguer de sombrinhas de praia, cadeiras e de aceder a serviços de instrutores e equipamento de natação. A provisão de serviços de agentes salva-vidas, mergulhadores, operadores de barcos de recreio, entre outros, entra nesta equação. O turismo sairia mais enriquecido e as alternativas de emprego iriam, por consequência, aumentar.

Finalmente temos as áreas de concentração dos municípios que podem ser exploradas para gerar mais postos de trabalho. Vemos oportunidades, por exemplo, na recolha e tratamento de resíduos sólidos, na gestão de mercados, de jardins e de casas de banho públicas bem assim na limpeza de ruas e sarjetas, só para dar alguns exemplos.

A formação de associações tem algumas vantagens. De entre elas destaque vai para a possibilidade que criam para os seus membros reflectirem sobre os desafios e as oportunidades que lhes são comuns. A outra vantagem prende-se com o facto de, através deste organismo, os seus membros terem uma forma de interagir com o governo e com o sector financeiro. A terceira é que através da associação se separa o trigo do joio e se pode criar maior confiança com o cliente. A quarta é que quando um cliente faz uma encomenda vários membros podem juntar-se para satisfazê-la em muito menos tempo.

O maior conhecimento das oportunidades que a Lei de Trabalho oferece e das que são criadas pela simplificação de procedimentos para constituição de empresas e para a canalização de contribuições fiscais revelam-se de grande utilidade na luta contra a pobreza urbana. De igual modo, a actividade de formação, nas suas diversas variantes e períodos de duração, especialmente a virada para o saber fazer, aparece como outro elemento essencial.

Nós podemos vencer a pobreza urbana, mas para isso, cada um de nós precisa de aceitar e acreditar que é mesmo possível. Que pode mudar as suas condições de vida, contando, em primeiro lugar, com o seu génio e mãos dextras e encarar os apoios de terceiros, que nós vamos prestar, como complementares ao que está a fazer. A auto-estima é fundamental nisto.

Procuramos trazer aqui algumas ideias ilustrativas daquilo que podemos fazer para intensificar as nossas acções de luta contra a pobreza no meio urbano. Como sempre conto com os vossos conselhos e observações sobre o que mais podemos fazer para gerar postos de trabalho sustentáveis nas nossas cidades e vilas.

Armando Emílio Guebuza
(Presidente da República de Moçambique)

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