domingo, 26 de agosto de 2007

Brasil/Comissão Pastoral da Terra edita “Conflitos no Campo Brasil" 2006

A Comissão Pastoral da Terra, pelo vigésimo segundo ano consecutivo, publica seu Conflitos no Campo Brasil que traz um pouco dos conflitos que aconteceram em todo o país no ano de 2006. Com a coleta, a análise e a divulgação destes dados, a CPT reafirma seu compromisso de estar ao lado dos homens e mulheres do campo, e de suas comunidades e organizações. É para que eles tenham mais consciência de sua realidade e para que possam qualificar melhor seus processos de luta que a CPT se dá a este trabalho de a cada ano produzir este relatório.

Dados da CPT revelam que impunidade mantém violência no campo

Os dados dos conflitos e violências de 2006 reafirmam que permanecem intocados os alicerces da concentração da propriedade, sua defesa como valor quase absoluto, a truculência dos que dela se apropriaram e, sobretudo, a impunidade. Os trabalhadores e trabalhadoras rurais continuam sendo reprimidos e sofrendo violências. Em 2006 houve um aumento de 176,92% das tentativas de assassinato em relação a 2005. Em 2006 registraram-se 72, enquanto no ano anterior foram 26. O número de prisões também sofreu um significativo aumento, de 261 trabalhadores presos em 2005 para 917 em 2006. Um crescimento de 251,34%.

Houve também um crescimento de 2,63% no número de assassinatos. Em 2006, 39 pessoas foram assassinadas. Em 2005 foram 38. Registrou-se uma diminuição de -10,54% no número de mortos em conseqüência dos conflitos. Foram 64 em 2005, e 57 em 2006. Também caiu o número de ameaçados de morte - 266 em 2005, 207 em 2006, -22,18% - e de torturados - 33 em 2005, 30 em 2006, - 9,09%.

Conflitos
Em 2006 foram registradas 1.212 ocorrências de conflitos relacionados com a posse, uso, resistência e luta pela terra, que compreende os conflitos por terra, as ocupações e acampamentos. Ao todo estiveram envolvidas 140.650 famílias. É importante se destacar que quase 20% destas ocorrências envolveram comunidades e povos tradicionais, notadamente indígenas e quilombolas, além de outras comunidades. O número representa uma diminuição percentual de -7,82% em relação a 2005, quando foram registrados 1.304 conflitos. As ocorrências de conflitos por terra apresentaram diminuição de -2,06%, 761, em 2006; 777, em 2005. Já as ocupações apresentaram uma diminuição percentual de – 12,13% (384, em 2006, 437 em 2005). Ainda maior foi a diminuição dos acampamentos – 25,56% (67 acampamentos em 2006, 90 em 2005).

Nestes conflitos por terra registrou-se o despejo judicial de 19.449 famílias e a expulsão pelo poder privado de 1.809. Estes números representam uma redução percentual de -24,08% em relação ao número de famílias despejadas em 2005, 25.618 famílias, e de -58,57% em relação às famílias expulsas, 4.366 em 2005. Os despejos judiciais não atingem somente ocupações novas, mas áreas ocupadas de longa data. Chamou a atenção em 2006 o despejo de toda uma comunidade quilombola no município de Vargem Grande, MA, a de São Malaquias. As famílias viviam na área há mais de 100 anos. O corpo de um morador que havia falecido no dia do despejo teve que ser levado para outra comunidade para ser velado, enquanto sua casa era destruída. Entre os casos de expulsão destaca-se o acontecido em Murici, AL, onde 29 famílias foram expulsas pela ação da conhecida família de políticos Calheiros.

Os conflitos no campo – soma dos conflitos por terra, pela água, trabalhistas, em tempos de seca – chegaram a 1.657, em 2006. -11,91% que em 2005, 1881.

A leitura destes números, relacionando-os com a população rural de cada estado ou região, dá uma outra visão. Onde se dá o maior número de ações de mobilização - ocupações e acampamentos - no Centro-Sul do País, aí o número de assentamentos é menor. Por outro lado, os índices de violência sofrida pelos trabalhadores são bem maiores nas regiões onde a ação dos movimentos é menos intensa, como na Amazônia. Com isso, fica patente que a violência no campo não pode ser creditada ao aumento da pressão dos movimentos do campo, mas continua diretamente vinculada à truculência histórica do latifúndio, travestido hoje de agronegócio.

Conflitos trabalhistas
A violência que acompanha o trabalho escravo e outros conflitos trabalhistas foi significativa em 2006. Três trabalhadores na situação de escravidão foram assassinados, enquanto que em 2005 não se registrou nenhum caso. 300% a mais. O número de trabalhadores libertados em 2006 foi -20,67% (foram libertados pela fiscalização do Ministério do Trabalho 3.633 trabalhadores, em 2005 foram 4.585) enquanto que o número de denúncias de trabalho escravo foi de -5,07% menor. 262 denúncias recebidas em 2006, 276 em 2005. Também caiu o número de trabalhadores nestas denúncias: 6.930 em 2006, contra 7.707 em 2005. Uma redução de –10,08%.

Também aparecem com destaque situações de violência em outros conflitos trabalhistas. O número de trabalhadores superexplorados foi 96,12% maior (7.078 pessoas, em 2006; 3.609, no ano anterior), mesmo que os casos registrados de superexploração tenha sido de 2,83% (109) a mais do que em 2005 (106). Nos casos de superexploração do trabalho registrou-se um assassinato. O de um menino de 11 anos, filho de um vaqueiro que fora ameaçado pelo fazendeiro, ao tentar acertar as contas depois de mais de três anos de trabalho. Quanto ao desrespeito trabalhista, as ocorrências registradas foram -62,50% menores (27 em 2006; 72, em 2005). Em contrapartida o número de pessoas que sofreu o desrespeito foi 167,05% maior (932 pessoas, em 2006; 349, em 2005). Outro dado preocupante é o de mortos em acidentes de trabalho: 100% a mais, em 2006 (14), em relação a 2005 (7). O número de feridos nestes acidentes foi de 22 em 2006, contra 27 em 2005, - 18,52% .

Impunidade
A CPT há muitos anos vem repetindo que a violência no campo se mantém por causa da impunidade. De 1985 a 2006, registraram-se 1.104 ocorrências de conflitos com assassinato. Nestes conflitos morreram 1.464 trabalhadores. Destas ocorrências somente 85 foram levadas a julgamento. Foram condenados 71 executores e somente 19 mandantes. É preciso que a sociedade brasileira exija do poder Judiciário uma atuação mais rigorosa. Um exemplo de impunidade é o massacre de Eldorado dos Carajás, onde 16 sem-terra foram mortos, no dia 17 de abril de 1996. Mesmo condenados, o coronel Mário Colares Pantoja (228 anos de prisão) e o capitão José Maria Pereira (158 anos) conseguiram hábeas corpus e hoje aguardam julgamento de recurso em liberdade. Para lembrar a ação dos trabalhadores, em 2002 foi aprovada a lei que instituiu o 17 de abril como o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária.

As mártires do campo
Várias pessoas se destacam na histórica luta pela terra. Em um ambiente marcado por repressões hostis àqueles que levantam a voz contra a exploração e em nome de um bem comum, vidas são ceifadas. Vítimas do autoritarismo e da impunidade que ainda domina o país. Dentre todas as histórias desses que se tornaram figuras de grande simbologia, os mártires da terra, destacam-se aquelas que tiveram um importante papel dentro das lutas agrárias. São mulheres que lutaram não só pela terra, mas contra o preconceito e as dores da perda de maridos e filhos, que não abalaram a sua credulidade na luta e no significado da tão esperada reforma agrária no Brasil. Algumas serão, aqui, lembradas pelos seus feitos e sua importância na história, outras, talvez não sejam citadas, mas não são esquecidas e nem menos importantes para quem está na luta.

- Anatália de Souza Alves Melo

- Margarida Maria Alves

- Antônia Flor

- Irmã Adelaide Molinari

- Roseli Nunes

- Maria da Penha Nascimento

- Maria de Nazaré Mineiro

- Irmã Dorothy Stang


Releases sobre conflitos no campo:

- Dados da CPT revelam que impunidade mantém violência no campo

- Conflitos pela água

- A farsa do império do papel


Confira alguns dados:

- Quadro Comparativo dos Conflitos no Campo (1997-2006)

- Violência contra a ocupação e a posse

- Violência contra a pessoa

- Síntese dos Conflitos por Terra

- Síntese dos Conflitos Trabalhistas


* Quem tiver interesse em “Conflitos no Campo Brasil" 2006 deve mandar email para joana@cptnacional.org.br

(Texto adaptado por Mercosul & CPLP de material informativo da Comissão Pastoral da Terra http://www.cptnac.com.br)

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