Brasil Livre de Transgênicos *
12 junio 2009/Adital-Agência de Informação Frei Tito para a América Latina
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Foi realizada na Tunísia, África, na última semana, a Terceira Sessão do Órgão Gestor do Tratado Internacional sobre Recursos Genéticos Vegetais para Agricultura e Alimentação da FAO/ONU (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação).
Num lance impressionante e histórico, a delegação do governo brasileiro foi capaz de reverter o clima de impasse que reinava na reunião com relação à implementação do Art. 9 da do Tratado, que trata dos Direitos dos Agricultores.
Durante quatro dias de difíceis negociações, as delegações da Europa, da América Latina e da África enfrentaram os esforços do Canadá no sentido de impedir qualquer acordo sobre o tema.
Segundo informe produzido pelo Grupo ETC, uma das ONGs presentes à reunião, "Angola, Brasil, Equador, Holanda, Noruega e Suíça merecem reconhecimento especial por colocarem em primeiro lugar o papel crucial dos camponeses na conservação e melhoramento dos recursos genéticos das plantas."
As organizações da sociedade civil presentes no encontro tiveram um papel fundamental para garantir o avanço das negociações. E a resolução finalmente aprovada pela plenária rompeu com as práticas convencionais da ONU ao convocar as organizações de agricultores a se envolverem em cada aspecto do Tratado.
Conforme expressou Wilhemina Pelegrina, diretora da SEARICE, uma organização filipina que se dedica à defesa dos direitos dos agricultores, a resolução que foi lida pelo Brasil à meia noite de quinta-feira diante de uma plenária exausta, "apesar de ser breve em compromissos firmes e dependente de financiamento, representa um grande passo a frente em décadas de luta pelo reconhecimento e pela instrumentalização dos direitos dos agricultores na FAO".
Através da nova Resolução, o órgão gestor do Tratado, entre outros importantes pontos:
(xi) Convida cada País Parte [do Tratado] a considerar uma revisão e, se necessário, ajustar suas medidas nacionais que possam afetar a efetivação dos direitos dos agricultores de acordo com o disposto no Artigo 9 do Tratado, para proteger e promover os direitos dos agricultores;
(xiii) Solicita à Secretaria que organize oficinas regionais sobre direitos dos agricultores, na medida em que permitir o orçamento, com o objetivo de discutir experiências nacionais sobre a implementação dos direitos dos agricultores, envolvendo, de forma apropriada, organizações de agricultores e outros atores;
(xiv) Solicita que a Secretaria recolha visões e experiências submetidas pelos Países Parte e outras organizações relevantes e relatórios das oficinas regionais como base para um item da agenda para consideração do Órgão Gestor em sua quarta sessão [daqui a 18 meses], e para disseminar informações relevantes via página eletrônica do Tratado, quando apropriado; e
(xv) Aprecia o envolvimento das organizações dos agricultores na continuidade dos trabalhos, de forma apropriada, de acordo com o regimento interno definido pelo Órgão Gestor.
Mas, apesar dos inegáveis avanços, as organizações de agricultores têm ciência de que grandes lacunas restam por ser resolvidas. Como bem resumiu o informe do Grupo ETC, "ainda nos preocupa que o Tratado da FAO sobre Recursos Fitogenéticos ponha ênfase na soberania nacional, acima da conservação dos recursos genéticos e dos direitos dos agricultores. As leis nacionais de sementes podem, por exemplo, impedir ou dificultar que agricultores conservem, intercambiem e vendam suas sementes."
No caso brasileiro há duas questões objetivas que poderão ser beneficiadas pela nova Resolução.
Primeiro, é preciso lembrar que neste exato momento a Casa Civil negocia com os ministérios a substituição da atual Lei de Cultivares (9.456/97) por uma nova. Conforme relatamos no Boletim 441, as mudança propostas vão no sentido de restringir o direito ao uso próprio de sementes pelos agricultores, instituir a cobrança de royalties sobre a colheita e impor, além disso, severas penalidades aos infratores. Segundo a proposta, o período de validade das patentes também seria estendido e elas passariam a englobar todos os gêneros e espécies vegetais.
Tudo isso bate exatamente de frente com o que determina a Resolução apresentada pelo Brasil na FAO e aprovada na última semana na Tunísia.
Não seria de bom tom o governo brasileiro defender nobremente os direitos dos agricultores no âmbito do Tratado Internacional da FAO, incentivando uma lista de outros países a fazerem o mesmo, e, chegando em casa, implementar justamente o contrário, encaminhando ao Congresso um Projeto de Lei destinado a estraçalhar os direitos dos agricultores. Aliás, os direitos que ainda restam, considerando todas as restrições já impostas pela atual Lei de Cultivares e pela Lei de Sementes e Mudas (10.711/03) e seu decreto regulamentador (5.153/04).
Outro ponto diretamente relacionado ao tema é o Projeto de Lei de Acesso aos Recursos Genéticos, há anos em negociação entre sociedade civil e governo (o assunto é regulado por medida provisória desde 2001). Também neste caso, o Ministério da Agricultura tem liderado as discussões no governo e podem resultar do processo medidas que reduzam ao mínimo os direitos dos agricultores e beneficiem as grandes empresas.
Vamos esperar que a posição do Brasil brilhantemente defendida na FAO não seja para inglês ver.
Com informações de:
- Nota à imprensa do Grupo ETC, 05/06/2009.
http://www.etcgroup.org/es/materiales/publicaciones.html?pub_
id=755
- A proposta apresentada pelo Brasil pode ser consultada, em inglês, no seguinte endereço:
http://www.aspta.org.br/politicas-publicas/biodiversidade/Farmers
%20Rights%20FAO.pdf/view
Está no ar o novo boletim de áudio produzido pela Agência Pulsar e AS-PTA, neste número tratando dos projetos de lei no Congresso Nacional que pretendem acabar com a rotulagem dos alimentos transgênicos.
http://www.brasil.agenciapulsar.org/nota.php?id=4651
* Da Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos
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