terça-feira, 25 de agosto de 2009

Timor-Leste/OS QUE VIERAM ANTES DE MIM




Foto: Presidente Nicolau Lobato, morto em combate contra os invasores indonésios

Escrito por: Lukeno Alkatiri
Com a contribuição de: Low Heng Boon

20 agosto 2009/timorlorosaenacao

Este escrito é dedicado à histórica FALINTIL pela sua luta e sacrifício. Eu dedico-o a todos os homens que fizeram parte dessa luta. Eu dedico-o especialmente aos fundadores da FALINTIL (Nicolau Lobato, Mau Lear, Alarico Fernandes e outros), incluindo o único fundador vivo: meu pai, Mari Alkatiri.

Enquanto viajo pelo passado da terra do crocodilo, eu sigo o caminho que deixaram para trás representando a vossa bela e corajosa luta. Eu caminho com ela ou atrás dela mas nunca à sua frente. Porque, ao contrário de alguns, eu não posso suportar a ideia de virar as minhas costas à estória e história que deixastes para nós. Eu tento compreender a raiz da vossa luta durante os anos em que estiveram isolados do resto do mundo, um mundo que levou o seu tempo para vos resgatar e agora esquece quem vocês foram e no que te tornaram.

Eu sigo as vossas gotas de lágrimas e de sangue que tantas vezes alimentaram esta terra. Elas estão ainda aqui, resistindo e não se permitindo a elas próprias secarem. Eu estou consciente de que cada gota revela a narração de um bonito conto. O vosso conto, portanto, nosso conto. Contos de sacrifício, de desespero, e mais importante, gotas de sangue e de lágrimas que são a prova do trilho traçado pelos vossos sonhos e as vossas crenças.

Nesta jornada eu também sigo o som do vosso grito que ainda ecoa do cimo dessas montanhas. Tantas vezes vocês gritaram, esperando que alguém vos ouvisse e pusesse fim à loucura dos vossos inimigos. Tantas vezes eles vos ignoraram, iludindo-se a eles próprios, pensando que os vossos gritos seriam um dia silenciados. Mal eles sabiam que era o seu próprio silêncio, que iria um dia rebentar.

As balas que ainda permanecem intocáveis nos sítios das vossas batalhas representam a existência de uma causa. Perto delas estão alguns dos corpos que deixaram para trás. Os vossos. No entanto, vocês os deixaram sem vida, e apesar da perda que sofreram por testemunhar o seu último suspiro, asseguraram que o seu auto-sacrifício iria manter os nossos ideais vivos. Eles representam as inúmeras vezes que vocês foram forçados a suprimir a tristeza e o luto pela perda de os deixar, mas sempre lembrando que lhes devem a vossa contínua existência.

Antes de eu começar esta jornada interminável, as pessoas falaram-me de vocês. Contaram-me que vocês estavam a lutar, sofrendo, mas mantendo-se implacavelmente vivos para nós. Por essa razão decidi seguir o vosso caminho, ouvir o vosso grito e deixar que o rasto das vossas lágrimas e sangue me guiem para o lugar onde vocês se tornaram para sempre os nossos heróis.

Eu vou apanhar as balas que perfuraram o vosso corpo e mostrá-las ao mundo. Vou deitar-me ao lado dos corpos que deixaram para trás e vou deixar que eles me contem as histórias das suas batalhas. Eles irão dizer-me os seus nomes, então eu terei a certeza de que nunca serão esquecidos. E depois, eu agradeço-lhes pelo seu sacrifício, eles irão ensinar-me como enfrentar as futuras batalhas da luta que está longe de terminar. E eu vou aprender, destas almas eternas, como chorar, sangrar e gritar, quando chegar a minha hora de seguir e continuar a trilha.

Tradução não oficial de Loro Foho


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OS QUE VIERAM DEPOIS DE NÓS

Por António Veríssimo

25 agosto 2009/timorlorosaenacao

TOLERÂNCIA AOS TRAIDORES, HOMENAGEM AOS JOVENS E JUSTOS

Felizmente que a sabedoria dos libertários-anarco-sindicalistas e comunistas me foi transmitida por “tios”, camaradas de meu pai, que me ofereciam “pinhatas”, “esticas”, bolos de arroz e amendoins já descascados, entre outras guloseimas que havia nas tascas e nos cafés de Cacilhas, quando ia assistir às reuniões clandestinas que os antifascistas-antisalazaristas - incluindo ex-elementos da ORA - faziam na sacristia da igreja de Cacilhas, na Cândido dos Reis, e onde fosse possível. Não fora isso e agora estava por aqui a bufar de raiva, intolerante. Talvez capaz de ripostar do mesmo modo de alguns que usam os blogues para esparramar os seus ódios primários e incompreensíveis contra tudo e contra todos. Principalmente contra os que são apontados pelo grande traidor Xanana Gusmão. Traidor à causa timorense de uma sociedade livre e justa, democrática e o mais possível igualitária.

Não se julgue que uso a palavra traidor de ânimo leve. Não é palavra que se use desse modo. Pesei-a devidamente e uso-a com a certeza de a empregar correctamente. Nesta hora já nem lamento a decepção que Xanana representa para mim e para todos que acreditaram nele. Penso que temos de saber aceitar que nem todos os seres têm capacidade de um dia recuperar a honestidade perdida quando começam por trair inúmeros guerrilheiros das Falintil que na montanha davam a vida pela libertação do país. Uma traição de que só o próprio poderá falar um dia que queira, ou Abílio Araújo, ou poucos mais. Poucos dos que conhecem e negociaram a entrega de Xanana ao exército indonésio com a promessa de uma eventual autonomia anos mais tarde, como já é histórico. Se isto não é traição, onde e como poderemos mais usar a palavra com toda a propriedade?

Li as palavras de Lukeno Alkatiri, pelo que sei um jovem de 20 ou talvez poucos mais anos. Acima de tudo um jovem de que a família, os amigos e os pais se devem orgulhar. Orgulho pelos que vieram depois de nós e têm o mérito de querer continuar a nossa luta por um mundo melhor, justo.

No seu “escrito” vislumbro e sinto de modo arrepiante a homenagem aos heróis timorenses, aos conhecidos pelos nomes e aos imensos anónimos. Percebo igualmente a humanidade que o “escrito” comporta e a poesia tocada pela paz que deseja para Timor-Leste. Um texto que é o testemunho do interior de uma pessoa em formação com objectivos inequívocos da herança dos seus antepassados, dos heróis libertadores que ficaram pelo caminho mas que ainda hoje o apontam aos seus discípulos e aos vindouros. Que tem de se cumprir, leve o tempo que levar.

No caso, o “escrito”, como lhe chama, é de Lukeno Alkatiri, mas não só. Diz lá que Low Heng Boon deu o seu contributo. Demonstrando que sabe partilhar e receber sugestões de um amigo. Isso revela alguém honesto e salutarmente modesto para não fazer exclusivamente seu o “escrito” em questão. O mesmo não se passou – certamente que ainda não se passa – com muitas prosas de Xanana Gusmão, sabemos isso.

Não se julgue que é objectivo insano ridicularizar ou desvalorizar Xanana Gusmão porque age e pensa de modo diferente, nada disso. Considere-se antes que não se deve temer a verdade, mas sim fazê-la constar, compreendendo e aceitando que muitos enveredem por direcções diferentes das consideradas correctas e mais justas.

Neste caso, a verdade é que o percurso de Xanana Gusmão tem-se revelado sinuoso ao longo da luta do povo timorense, demonstrando ser o principal instigador de ódios. Ódios que até acabam por se perceber nos comentários do TLN e noutros locais da blogosfera. Ele aponta e as “feras amestradas” seguem-no, melhor, agem por ele e em defesa do indefensável, em defesa da traição permanente que lemos, ouvimos e sabemos de onde vem. Traição que é sentida pelos timorenses e pelo mundo que apoiou e apoia a luta do povo maubere. Agora pela libertação de um regime que semeia atropelos à justiça, às leis vigentes no país, que se propala defensora do povo mas que mantém esse povo na carência enquanto distribui por si e pelos seus fieis colaboradores os bens que a todos pertencem.

No caso do TLN, por mera curiosidade, elaborámos uma consulta à proveniência dos que em comentários destilam esses ódios incontidos ou contra-informação por tudo e por nada. A triste conclusão é a de que vêm especificamente de cinco locais e não mais, sendo que, apesar da “dispersão de identidades”, alguns referem-se à mesma entidade – os próprios entenderão.

Mais palavras e considerações para quê? Não basta isto para percebermos quão desprezíveis estão a ser determinadas pessoas, incluindo certos apoiantes que ladeiam Xanana Gusmão? Porquê esta preocupação? Porquê tanta mesquinhez?

Se acaso o artigo por nós publicado e traduzido por Loro Foho, intitulado OS QUE VIERAM ANTES DE MIM, fosse assinado com um pseudónimo suscitaria tanto ódio? Tanta manifestação de vileza, obviamente gratuita e doentia?

Ripostemos com denúncia mas também com tolerância sábia aos traidores, homenageando os jovens e justos que vieram depois de nós. Ainda os que hão-de vir.

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