segunda-feira, 23 de março de 2015

Angola/CUITO CUANAVALE MUDOU A HISTÓRIA

23 março 2015, Jornal de Angola http://jornaldeangola.sapo.ao (Angola)

Adalberto Ceita


A Batalha do Cuito Cuanavale faz hoje mais um aniversário. Há 27 anos, os invasores sul-africanos e as tropas da UNITA foram derrotados no assalto final ao Triângulo do Tumpo.

Com suporte dos super-tanques de guerra “Oliphant” e os canhões G5, os invasores estavam convencidos do aniquilamento das FAPLA, que asseguravam a defesa do Cuito Cuanavale. Foram derrotados, e de um total de 20 super-tanques “Oliphant” que trouxeram para dentro de Angola só 13 conseguiram regressar e com sérias avarias. Alguns apenas andavam 500 metros por hora. Por isso, a retirada dos derrotados foi penosa. Outros três, um dos quais encontrado no teatro das operações militares em Dezembro de 2014, estão nas terras do Cuando Cubango e simbolizam a derrota dos invasores.
 
Estamos em Março de 1988. A 25ª Brigada comandada pelo capitão Valeriano e composta por valorosos combatentes das FAPLA tem a missão de defender o Triângulo do Tumpo, no Cuito Cuanavale, e impedir o avanço do exército sul-africano em
território angolano. Havia desnível acentuado de meios e de tecnologias militares.
 
O inimigo tinha os super-tanques “Oliphant”, famosos pela sua potente capacidade de artilharia. Porém, os combatentes angolanos demonstraram uma valentia sem par, a preço de sangue e fome. Simbolizavam a vontade de toda uma Nação em mudar o curso da História em África e no Mundo. Triunfaram sobre os racistas de Pretória apresentados como invencíveis. Mas invencível, foi a luta do Povo Angolano em armas.

O general Fernando Mateus “Nando Cuito” estava na frente do combate e recorda os momentos que, a meio da tarde de 23 de Março de 1988, levaram à captura de um tanque “Oliphant”, dos 20 que o exército sul-africano fez entrar em Angola: “O inimigo tinha pouco conhecimento das nossas posições, e as condições atmosféricas eram adversas, nem permitiam que os aviões de ambos os exércitos actuassem. Aqui no Triângulo do Tumpo os confrontos foram realizados entre forças terrestres, com tanques e artilharia”.

Apesar das condições atmosféricas adversas, o inimigo avançou. O tempo estava chuvoso e as chanas do Cuito Cuanavale alagadas. No meio dos combates, um “Oliphant” do exército sul-africano, munido de dois “varre minas”, conseguiu ultrapassar a linha de defesa minada pela 25ª Brigada.
 
“A tripulação estava perdida e o tanque apareceu por trás do nosso posto de comando da Brigada. Foi atingido por um canhão de 76 mm e ficou imobilizado. A tripulação fugiu em debandada na direcção ao campo de minas e até hoje nada sabemos do seu destino”, recorda o general Fernando Mateus.

O então chefe do estado-maior das forças recorda o excelente trabalho realizado pelos engenheiros das FAPLA, na criação de obstáculos à infantaria mecanizada e à técnica blindada do inimigo. “Os super-tanques Oliphant ficaram confinados aos campos de minas, consumindo combustível, enquanto procuravam uma saída, e à mercê da artilharia e da aviação angolana”, recorda o general.

Os sul-africanos estavam sob fogo intenso das FAPLA. O barulho dos mísseis parecia uma terrível e contínua trovoada. Outros dois Oliphant detonaram minas e ficaram colados ao terreno e impedidos de dar resposta. Os restantes, alguns com danos significativos, receberam ordem de retirada. Na fuga, o exército invasor colocou minas ao longo do caminho e disparou  obuses contra as posições defendidas pelas então Forças Armadas Populares de de Libertação de Angola (FAPLA).

Vitória garantida
O general Fernando Mateus lembra que nesse momento a vitória estava praticamente garantida por parte das FAPLA. Por volta das 16 horas do dia 23 de Março de 1988, o tempo ficou favorável, permitindo a entrada em cena da aviação: “Tínhamos mais aviões e até às 19 horas fizeram alguns bombardeamentos em profundidade sobre o inimigo. A vitória estava consumada. Mantivemos a nossa posição e ouvíamos a retirada com os seus meios blindados”.
 
A artilharia das FAPLA estava com muita força nas investidas contra os sul-africanos. Para o êxito das operações, o general Fernando Mateus destaca o reforço e motivação dos combatentes na defesa do Triângulo do Tumpo em meados de Fevereiro ante a aproximação do exército inimigo: “As nossas peças de artilharia tinham um alcance inferior que as do inimigo, que estava munido de G-5, com alcance de 45 quilómetros. Para contrapor ao ataque tornámos os BM-21 uma artilharia móvel. A estratégia consistia em trazer os invasores ao nosso alcance”. Uma estratégia que resultou em pleno  com os sul-africanos a serem apanhados  de surpresa.

Minas reforçadas
De 2005 a Janeiro de 2015, a estatística da empresa The Halo Trust Angola indica que foram identificados 37 campos minados no Triângulo do Tumpo. Deste número 16 já estão livres de minas, quatro activos e outros 17 por desminar.

“Clarificamos 3.466.301 metros de superfície, 19.456 com minas anti-pessoal, 7.646 anti-tanque e 2.452 engenhos detonados”, revela o chefe de operações da empresa encarregada pela desminagem naquela área.

Ezequiel Huambo fala da existência de minas anti-tanque reforçadas com caixas de TNT. Os acidentes com minas envolvendo as populações reduziu drasticamente em função das campanhas de sensibilização.

Supervisora de desminagem, Maria da Piedade lembra que a urgência na localização de um “Oliphant” partiu das Forças Armadas Angolanas  e conduziu a um trabalho árduo iniciado em finais de Novembro 2014, e culminou a 8 de Dezembro.

“Tem sido um trabalho difícil, porque se trata de uma área muito minada e que foi palco de intensa guerra. Por exemplo, a excessiva quantidade de minas a dez metros da localização do tanque obrigou-nos a adoptar a desminagem de escavação com recurso a enxadas”, disse.

Maria da Piedade realça o papel da população na localização do “Oliphant” e de outros artefactos usados na guerra pelas tropas invasoras. “Esse é o segundo tanque que a nossa empresa detecta dos três em posse das FAA”, realçou.

Cemitério minado
Palco da maior batalha militar no continente africano a sul do Sahara, o Triângulo do Tumpo testemunhou a morte de milhares de combatentes, parte dos quais enterrados no calor da guerra e cujo restos mortais ainda lá permanecem. Ezequiel Huambo confirma a descoberta de pelo menos dois cadáveres de militares da UNITA.

“Descobrimos os corpos depois do isolamento de uma área minada em toda a sua envolvente. Ao fazer a escavação o nosso sapador encontrou as botas, de seguida o fardamento verde e o esqueleto. Logo depois outro corpo. Apercebemo-nos que se tratava de um cemitério, e imediatamente interrompemos o trabalho e isolamos a área”, disse.

Além do apoio da população na descoberta de áreas minadas, Ezequiel Huambo esclarece que o sucesso neste processo desminagem tem sido possível com o contributo de antigos militares.

Sobreviventes da batalha
O Fórum dos Combatentes da Batalha do Cuíto Cuanavale defendeu na cidade do Lubango, província da Huíla, unidade entre os militares sobreviventes que derrotaram as forças do antigo regime do apartheid, a 23 de Março de 1988, no Cuando Cubango.
 
O delegado do Fórum dos Combatentes da Batalha do Cuito Cuanavale na Huíla, coronel Manuel Lopes, sublinhou durante as jornadas alusivas ao 27º aniversário da Batalha do Cuito Cuanavale, que hoje se assinala, que a unidade permite encontrar soluções para os problemas com que se deparam os membros da organização. Reconheceu o papel dos antigos combatentes, que com grande esforço e espírito de sacrifício a  Namíbia, Zimbabwe e África do Sul são hoje livres.
 

  

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