segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Angola/Estátua de Mwene Vunongue orgulho do povo Nganguela

23 agosto 2015, Jornal de Angola http://jornaldeangola.sapo.ao (Angola)

Carlos Paulino, Menongue

Um mês após a inauguração, a estátua de Mwene Vunongue, situada no largo com o mesmo nome, à entrada de Menongue, é já o principal cartão de visitas da cidade.

Dezenas de pessoas visitam o local todos os dias, para tirar fotografias ou saberem um pouco mais sobre o rei dos Nganguela.

Inaugurada a 28 de Julho último pela ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva, a estátua em bronze mede 6,3 metros de altura e pesa 3,5 toneladas.

O rei é representado em vestes tradicionais, na altura confeccionadas com peles de onça, colares ao pescoço e uma lança na mão direita.

De nome materno Ndala Tchinhama, passou a chamar-se Mwene Vunongue após a ascensão ao trono. Augusto Cambinda Calilo, rei Mwene Vunongue VII, disse que
a construção da estátua de bronze demonstra o reconhecimento do Executivo pela grande resistência dos Nganguela à ocupação colonial e é motivo de orgulho das populações locais e autoridades tradicionais.

“Passados 129 anos da morte do rei Mwene Vunongue V, o Executivo angolano prestou   tributo ao soberano com a edificação desta estátua, que vai servir ainda como local de atracção para os turistas nacionais e estrangeiros que visitam a nossa região”, disse.
Bisneto de Mwene Vunongue V (Ndala Tchinhama), Augusto Cambinda Calilo está no trono há seis anos, por sucessão de Mwene Kuvango Ntyamba VI.

O actual soberano dos Nganguela disse que o Executivo deve continuar a prestar uma atenção especial à edificação e reabilitação de locais históricos da província do Cuando Cubango, para que as novas gerações tenham contacto com os actos protagonizados pelos seus antepassados.

Brandão Castanheira, estudante da Escola Superior Politécnica de Menongue, adstrita à Universidade Cuito Cuanavale, disse que a edificação da estátua do rei Mwene Vunongue é mais um marco no sentido do resgate dos valores históricos e culturais.

O estudante universitário lamentou o facto de muitos jovens desconhecerem a História do país e os protagonistas da luta de resistência e pela emancipação dos angolanos.

Faustino Domingos, estudante da oitava classe na escola do I e II ciclos do ensino secundário 24, sabe muito pouco da história de Mwene Vunongue, mas, ao ver a estátua, disse que vai procurar informações sobre o rei dos Nganguela  e outros soberanos do país.

Resistência à colonização
Nascido em 1800, o rei Mwene Vunongue V, era filho de Tchinhama e Mutango Kaziko, natural da aldeia junto à confluência dos rios Kalanda e Cuchi, actual município do Menongue. Travou vários combates contra os invasores portugueses, alemães e ingleses durante o século XIX. Nessa altura, a Inglaterra era a potência colonizadora da Zâmbia (Reino de Barotze) e pretendia anexar o território do Cuando Cubango. Em face da pretensão dos ingleses, o rei de Portugal enviou uma missão de exploração a este vasto território, chefiada pelo major Alexandre Alberto da Rocha de Serpa Pinto, que aqui chegou em 1878.

A revolta do soberano e do seu povo contra os portugueses deveu-se ao facto de estes obrigarem a população ao pagamento de elevados impostos, a trabalhos forçados, deportação, humilhação e subjugação das autoridades tradicionais, práticas recorrentes durante a chamada “guerra de pacificação”.A situação criou um ambiente de conflitos e revoltas lideradas pelo rei Mwene Vunongue, que organizou o seu reino para acções de resistência e luta armada, realizando incursões militares contra os invasores.

Mesmo sem material de guerra sofisticado, mobilizou um exército e lutou de forma corajosa com armas rudimentares, como arcos e flechas, zagaias, lanças e pedras, com o que causou importantes baixas ao inimigo.

Além de tácticas militares, o rei usava como meio de persuasão a crença na magia, ao cultivar o mito de que as balas inimigas caíam num balaio, o que servia para elevar o moral dos seus guerreiros.

As acções militares ganharam maior dimensão após as alianças feitas com os reis Tchihuaku, do Cuvango (antiga vila Artur de Paiva), e Mandume Ya Ndemufayo, do Cunene, com quem mantinha encontros secretos na área de confluência dos rios Cubango, Cuchi e Cuelei, para definir estratégias.

Morte do soberano 
No ano de 1886, havia no território do Rei Mwene Vunongue um comerciante português de nome António de Almeida, proprietário de gado bovino, que criou grandes conflitos devido à ocupação ilegal de terrenos férteis pertencentes à população autóctone, que dependia da actividade agrícola e da pesca. Quando os bois do português invadiram e destruíram a lavra de milho de um agricultor local, conhecido por Ngonga, este matou um dos animais. Protegido por tropas coloniais, António de Almeida acusou o soberano de ter autorizado o abate.

Durante a briga que se seguiu, o comerciante teria desferido um golpe que atingiu Mwene Vunongue na região genital, o que resultaria numa doença prolongada, debilitação física e na morte no rei dos Nganguela.

Apesar das revoltas que se seguiram à morte de Mwene Vunongue, o poder de fogo e, sobretudo, a construção do forte de Serpa Pinto, localizado numa zona elevada e armado com quatro canhões e muitas armas de infantaria, acabariam por ditar o desfecho dos acontecimentos. As ruínas do forte encontram-se a oeste de Menongue. O rei Mwene Vunongue deixou quatro filhos, Intumba, Mutango, Kakuhu e Ndala. Desde a sua morte, em 1886, assumiram o trono dos Nganguela MweneTchicomba, Mwene Liveve, Lisala, Agostinho Kalata, Kuvango Ntyamba, e agora Augusto Cambinda Calilo.

Valorização da História
A ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva, disse que a edificação da estátua de Mwene Vunongue resultou de um projecto de iniciativa presidencial, que visa valorizar e divulgar as figuras históricas do país, razão pela qual o acto de inauguração foi testemunhado pela rainha do Moxico, Nhakatolo, e pelos reis dos Lunda, Muatchissingue Watembo, e do Bailundo, Ekuikui V, além dos reis dos nove municípios do Cuando Cubango.

Rosa Cruz e Silva felicitou o Governo Provincial do Cuando Cubango e as autoridades tradicionais, que aceitaram o desafio de participar na equipa de pesquisas encarregada da reconstituição física da imagem do rei Nganguela Mwene Vunongue V.

A ministra garantiu a continuidade aos estudos de figuras históricas nacionais e adiantou que homenagens do género vão ser prestadas a outras figuras históricas, não apenas soberanos, mas também embaixadores, religiosos, escritores e jornalistas.O governador do Cuando Cubango, Higino Carneiro, disse que a inauguração da estátua de Mwene Vunongue resulta de uma decisão há muito tomada, cujo primeiro acto foi a construção do túmulo do soberano no bairro Tucuve, arredores da cidade de Menongue.

Higino Carneiro aproveitou a ocasião para pedir o apoio do Ministério da Cultura na concepção, construção e constituição do acervo do centro cultural e museu etnográfico de Menongue, da biblioteca provincial e do museu do Missombo.


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