25 outubro 2011/Vermelho EDITORIAL http://www.vermelho.org.br
A América Latina assistiu, neste final de semana, a um dos capítulos mais sólidos do processo de fortalecimento democrático do continente. No domingo (23), 54% dos argentinos respaldaram a atual gestão de Cristina Kirchner. A vitória acachapante da atual presidente, que concorria à reeleição, é uma mostra do avanço dos povos latino-americanos rumo a uma administração independente, com crescimento econômico respaldado por maior justiça social e soberania.
Esse movimento progressista na América se estende por mais de uma década, tendo como expoentes no continente os governos de Argentina, Bolívia, Brasil, El Salvador, Equador, Nicarágua, Paraguai, Uruguai, Venezuela, além de Cuba – que há meio século desafia o governo estadunidense, responsável pelo criminoso bloqueio econômico imposto à ilha. Historicamente considerados “quintal” dos Estados Unidos, esses países romperam com o Consenso de Washington vigente durante a década de 1990 e ousaram reivindicar a independência dos povos, tendo como prioridade os avanços na área social e a consolidação do vitorioso processo de fortalecimento de uma América Latina soberana, que caminha para a superação das desigualdades e injustiças do continente.
Mas esse é um pecado que a direita subserviente ao Império não perdoa.
O ranço histórico dos setores conservadores é agravado pelo fato de que os meios de comunicação, convertidos em partidos políticos de manutenção do status quo, não conseguem impedir o avanço histórico das forças de esquerda no continente. Durante o todo o processo eleitoral da Argentina, jornais a serviço das classes dominantes fizeram intensa campanha contra Cristina Kirchner tentando, de todas as formas, demonizar e desqualificar seu governo.
O jornal Tiempo Argentino publicou, em setembro, uma pesquisa revelando que o grupo Clarín, maior conglomerado de mídia do país, publicou, em 15 meses, 347 capas negativas sobre o governo. Apesar disso, a presidente conseguiu, nas urnas, assegurar o processo de mudança iniciado por seu marido, Néstor Kirchner, quando assumiu a presidência em 2003, após uma ofensiva pelo desmantelamento do Estado perpetrada pelos governos neoliberais de Carlos Saúl Menem (1989 e 1999) e Fernando de La Rúa (1999-2001). O desespero dos meios argentinos pôde ser verificado no período que antecedeu as Primárias Abertas Simultâneas Obrigatórias (Paso), realizadas em agosto, quando a leitura dos grandes jornais do país deixava dúvidas sobre a reeleição de Cristina e propagava uma reação inexistente dos candidatos da oposição.
Observa-se, no entanto que, assim como no Brasil, a imprensa golpista argentina não conseguiu manipular a opinião pública do país que, frente aos avanços reais da sociedade, respaldou Cristina com mais um mandato. Uma pesquisa de boca de urna realizada pela Universidade de Buenos Aires (UBA) revelou que, dos dez indicadores considerados relevantes para os cidadãos, seis tiveram melhoras significativas nos últimos quatro anos: economia pessoal e familiar, economia nacional, educação, salários, empregos e aposentadoria. As maiores preocupações dos cidadãos argentinos são com segurança e emprego.
Sequer a evidência de que a economia argentina está crescendo de maneira sustentável é suficiente para acalmar os ânimos da direita rancorosa. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, neste ano, o país dispõe de um superávit comercial de mais de US$ 9 bilhões, o que deixa o governo em condições de pagar a dívida pública e controlar a fuga de capitais, mas os meios argentinos insistem em acusar o governo de manipulação dos dados oficiais da economia.
Descredibilizados, os veículos hegemônicos criaram mais um factóide, que já aparece também na imprensa brasileira, em comentários e reportagens nada isentas. Esta argumenta que a maioria parlamentar obtida pela presidente representa um “perigo” para a democracia. Fala em “controle do Congresso”, em superpoderes, “hiperpresidencialismo”, revela o “temor” de um suposto “radicalismo” no país. Esse discurso retrata o temor do que os argentinos chamam de “aprofundar o modelo” e dos avanços na democratização dos meios de comunicação, tal como ocorreu com a criação da Lei dos Meios, cujo objetivo é impedir a formação de monopólios impondo limites à concentração e fixando cotas à quantidade de licenças por tipo de meios.
Tudo indica que o terceiro mandato do partido Peronista na Argentina vai aprofundar as mudanças iniciadas em 2003. Oxalá que assim seja e que possamos tomar como exemplo os avanços conseguidos pelo país vizinho. De acordo com Patricio Echegaray, secretário-geral do Partido Comunista da Argentina, em artigo publicado em seu blog, a mudança estrutural no capitalismo da Argentina “é a única forma de impedir a ofensiva restauradora das direitas ou uma possível descomposição que pode afetar o chamado projeto nacional”.
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